KIT

CAPÍTULO 7

Robert desceu do helicóptero no heliporto da Reserva. Já havia um jipe o esperando e o próprio Justice o esperava no volante.
Ele não conhecia pessoalmente o líder dos Novas Espécies. Era um homem grande e forte, com o cabelo comprido, amarrado na nuca. Os olhos eram azuis bem escuros com manchas azuis claras. Ele era parecido com Kit. Tinha os olhos como os dela.
"Senhor Crane. Eu fiz questão de te receber para agradecer. Eu lhe dou minha palavra de que iremos apenas tentar uma pista sobre o paradeiro do doutor, usando seu celular."
Robert não era alguém que entendesse de tecnologia. Mas ele sabia que celulares poderiam ser rastreados.
"O que não entendo é porque vocês têm de rastreá-lo. Ele sempre manda seus cumprimentos a vocês quando fala comigo."
Justice manteve os olhos na estrada, como se se decidindo o que dizer. O que havia entre os Novas Espécies e Gabriel Marshall?
Chegando no mesmo prédio onde tinha sido costurado, eles passaram pela recepção e foram na direção contrária ao hospital. Devia ser a área administrativa e da segurança.
"Nós temos pouco tempo, Senhor Crane. Precisamos encontrá-lo, pois só ele seria capaz de salvar uma das nossas mulheres. Quando ele lhe diz para nos cumprimentar, ele está sendo irônico. Ele saiu daqui fugido. Ele fez muito mal a uma fêmea nossa."
As palavras de Justice o confundiram. Gabriel fazendo mal a alguém? Impossível. Ainda mais a uma mulher, seja Nova Espécie ou não.
Mas eles estavam sérios e o assunto parecia urgente. Ele ajudaria, é claro. Se conseguissem encontrar Gabriel, ele teria uma conversa com ele. No mais tudo o que queria era ver Kit.
E ela não estava na sala. Deixaria o celular e iria atrás dela. Até porque se eles quisessem rackear o celular dele, ele não seria capaz de saber.
"Onde está Kit?"
"Ela não pôde estar presente agora, mas disse que assim que possível viria. Ela disse que o senhor quer algo dela. O que seria?" Os olhos do homem estavam estreitados. Ele estava desconfiado, mas Kit não contou a exigência que Robert tinha feito. Então também não diria.
"Eu fiquei muito admirado por ela estar grávida, Justice. Tem a ver com isso, mas não é nada que você tenha que se preocupar."
Justice continuava a olhá-lo sem piscar com uma expressão totalmente perversa. Ele não tinha medo de outros homens, mas esse cara fez com que Robert sentisse um frio nas costelas.
"Você entende a necessidade de segredo, Senhor Crane? Nossas fêmeas passaram anos com a frustração de não poderem ser mães. E ainda não podem, pois não sabemos como o doutor conseguiu. Não acho que o senhor queira expor uma fêmea e seu bebê a todo o furor que viria sobre eles. E os grupos de ódio? Imaginar que existirá outra geração de Novas Espécies, talvez seja o estopim para uma guerra."
"Eu dei minha palavra a Kit. Não voltarei atrás, Justice."
O homem o olhou solenemente. Parecia ter decidido dizer algo mais.
"Senhor Crane, eu não confio em muitos humanos. O fato de ser amigo do doutor Gabriel, também me faz pensar duas vezes antes de te dizer, mas..."
"Eu compreendo o valor da informação, Justice. Eu sei que a vida de vocês não é fácil. Eu também sei do enorme fardo que você carrega e eu o admiro muito por isso. Diga o que eu puder fazer para ajudar, e estará feito."
"Por que? Ele não se entregava fácil.
"Porque eu me elegi para melhorar a vida de todos que eu puder. E vocês são tão americanos quanto eu. Assim estou a seu serviço."
Ele abriu a porta e era uma sala de controle. Dessas com uma tela enorme cobrindo uma parede inteira. E operando um computador estavam dois Novas Espécies jovens, deviam ter uns dezessete anos.
"Eu não sabia que haviam libertado crianças de Mercille. Qual a idade deles?
"Se a gente ganhasse um dólar pra cada vez que ouvimos isso..."
Um deles suspirou baixinho.
Ele ergueu as sobrancelhas e olhou Justice.
"Meninos, este é o congressista Robert Crane. Mostrem que sua mãe lhes deu educação."
Os jovens se viraram e estenderam as mãos. Robert ficou de boca aberta, os olhando. Eles eram gêmeos idênticos. Fortes e altos, mas tinham um olhar  meio travesso típico de adolescentes. Seus cabelos eram compridos, na altura dos ombros, ruivos com mechas mais claras. Eles tinham as feições mais fortes, marcantes, com maçãs do rosto altas e olhos puxados de gato. E os olhos deles eram definitivamente amarelos. Brilhantes, com a pupila bem alongada, mais que a de Kit e Justice.
Ele fechou a boca e apertou a mão de um deles.
"Sou Joseph, é um prazer conhecê-lo, senhor." Ele disse com  pequeno sorriso.
O outro só apertou a mão dele e murmurou "James". Esse devia ser o gêmeo mau, Robert pensou, enquanto entregava o celular para ele. Os dois ligaram um cabo no celular dele e começaram a teclar comandos,  um no computador central, outro em um laptop.
"Você disse que Kit é a primeira Nova Espécie a engravidar, mas não há nenhum registro de crianças sendo resgatadas nos laboratórios da Mercille."
"Kit é sim a primeira fêmea Nova Espécie a engravidar. A mãe deles é humana."
Outra vez Robert abriu e se esqueceu de fechar a boca. Como ninguém nunca especulou isso? Haviam vários Novas Espécies casados com mulheres humanas. O número de  Novas Espécies poderia ter dobrado. Sem falar do fato de estavam livres a pouco mais de quatorze ou quinze anos. E Esses dois poderiam passar por jovens adultos.
Ainda havia algo que Justice não estava contando.
"Nós acabamos de fazer dez anos. Novas Espécies não se desenvolvem como vocês, humanos. Disse James num tom frio. Gêmeo mau com certeza.
Então Robert entendeu a necessidade de silêncio deles. Se isso viesse a tona o governo cairia sobre eles sedento por suas crianças. Um exército poderia ser formado em menos de dez anos, com soldados fortes, imunes a várias doenças, e se os rumores estiverem certos, que aguentavam pelos menos dois tiros sem tombar, ou fazer caso disso.
Ele acenou com a cabeça. Não queria pensar nisso. Queria ver Kit.
"Justice, eu preciso falar com Kit"
Justice chamou alguém no celular e logo um Slade de bermudas e camisetas apareceu.
"Florest, por favor leve o senhor Crane até a cabana de Vingeance."
"Claro, tio. Vamos?" Ele era idêntico a Slade. Os mesmos olhos azuis, o mesmo cabelo listrado o mesmo tamanho. Ele foi saindo da sala e Robert não teve outra alternativa se não o seguir. Ele entrou no mesmo jipe que Justice usou para buscá-lo. Ele ligou o jipe e se embrenhou em uma estradinha que entrava na floresta.
"Meu pai disse que acertou seu olho, é verdade?"
"Sim, mas eu fui pego de surpresa."
"Ok. Se quiser desafiá-lo, temos uma sala de treinamento. É só me avisar."
"Eu faço box, sou um ótimo pugilista, se eu lutar com seu pai, ele pode se machucar. Como você se sentiria sobre isso?"
Ele riu e olhou Robert com um olhar de deboche.
"Vocês, humanos, não têm nossa força, nem resistência. Teríamos de tirar meu pai de cima de você."
"Diga a ele que escolha o dia. E estarei lá." Robert estava começando a entender por que Slade socara o rosto dele. Novas Espécies tinham uma veia muito violenta.
Eles chegaram a uma cabana rústica, com vasos de flores na varanda e cortinas nas janelas. Florest bateu e uma criança abriu a porta.
Era outra criança Nova Espécie. Robert fez força para não ficar boquiaberto de novo.
Era uma criança muito bonita. Forte, de uns três anos, mas de acordo com o gêmeo mau, poderia ter menos. Tinha os cabelos compridos, como todos eles, com fios grossos e muito escuros, na altura do queixo. Os olhos eram castanhos. Ele sorriu.
"Olá, Florest. Minha madrinha e meu padrinho estão no quarto." E completou bem baixo, quase que Robert não ouviu. "Acho que estão fazendo sexo."
"E você sabe o que é isso? Se sua mãe souber que você está falando disso, vai ser um baita castigo." Florest ameaçou o pequeno com um sorriso no rosto.
"Florest." Era o Nova Espécie que se chamava Vingeance. Ele olhou com frieza para Robert e ficou calado.
Continuou olhando e pareceu que os olhos dele ficavam mais claros e mais intensos. Robert estendeu a mão para cumprimentá-lo, numa tentativa de quebrar a tensão, mas ele rosnou alto, e socou o rosto de Robert com tanta força que Robert cambaleou e antes de apagar escutou kit dizendo algo que não entendeu.