Cap. 48 - Aproveite a Vida

13.5K 1K 85
                                    

Pov Lauren Jauregui

Eu não conseguia dormir.

O meu sentimento visceral de inquietude e tensão não ia embora. Nos sete anos desde que Chris tinha morrido, nunca duvidei da decisão de não fazer o exame. Eu sabia o que ter consciência da doença e esperá-la vir à tona tinha feito com a vida do meu irmão. E, caso eu amolecesse e acabasse me esquecendo da agonia pela qual ele tinha passado, eu poderia sentar na cama, abrir o criado-mudo e reviver aquela lembrança dolorosa.

Tirando do envelope a carta que eu sempre carregava comigo, acendi a luminária. Já tinha passado da hora de reler.

Lauren,

Hoje de manhã foram necessárias três tentativas para conseguir levar a colher de cereal à minha boca. A minha mão tremia tanto que, a cada vez que chegava perto da boca, não tinha mais nada na colher. Mas, na
terceira tentativa, consegui colocar um pouco de cereal na boca – mas aí quase morri engasgado porque os músculos da minha garganta já não conseguem mais engolir.

Eu sinto muito. Sinto tanto!

Não tenho mais nada além da minha dignidade. Preciso levá-la comigo e não deixá-la para trás, na cama que deixo molhada ou na necessidade de ser alimentado por alguém, como um bebezinho.

Isso vai magoá-la, mas sei que você vai entender por que tive que fazer isso.

A minha última oração nesta Terra é para que você seja poupada. Caso você não seja, não tenho muitos conselhos a dar, exceto dizer as coisas que eu teria feito de forma diferente.

Eu gostaria que a Emily nunca tivesse sabido do meu diagnóstico. Eu me culpo pelo aborto, porque ela ficou transtornada por tempo demais. Depois, eu a afastei dizendo que não a amava. Mas eu amava, sim. Eu só não conseguiria fazê-la passar pelo que estava por vir, anos de sofrimento. Às vezes, quando você ama uma pessoa, é preciso abrir mão dela para que ela fique bem.

Aproveite a vida, maninha. Não perca tempo se preocupando com o diagnóstico, como eu perdi. O tempo voa, quer você o aproveite, quer não. A escolha é sua.

Me perdoe e siga em frente.

Com amor,
Chris

Li a carta meia dúzia de vezes. Em geral, quando fazia isso, eu focava na dor – precisei justificar o que o meu irmão tinha feito muitas vezes dentro da minha cabeça a fim de aceitar que era para o melhor. Mas, dessa vez, fiquei obcecada com uma parte: "Aproveite a vida, maninha. Não perca tempo preocupando-se com o diagnóstico, como eu perdi. O tempo voa, quer você o aproveite, quer não. A escolha é sua."

Sempre pensei que o "preocupando-se com o diagnóstico" fosse o argumento para eu não fazer o exame. De que adiantaria saber, quando não haveria nada que eu pudesse fazer para prevenir a doença? Por que viver com uma sentença de morte, se eu podia simplesmente ignorar isso?

Só que...

Pela primeira vez na vida, refleti se eu estava mesmo vivendo. É claro que eu tinha relações – sexuais – e um emprego que eu amava, e alguns amigos próximos. Sempre foi o suficiente para mim.

Mas será que eu estava seguindo em frente e vivendo a minha vida, ou só existindo e esperando a porra do sintoma aparecer?

Eu não quis saber até então para que eu pudesse viver cada dia como se fosse o último. Mas, se eu pudesse escolher como gostaria de passar o meu último dia na Terra, escolheria passá-lo com Camila. Então será que eu estava mesmo vivendo cada dia como se fosse o último?

Reli o fim da carta novamente: "Aproveite a vida, maninha. Não perca tempo se preocupando com o diagnóstico, como eu perdi. O tempo voa, quer você o aproveite, quer não. A escolha é sua."

Eu tinha decidido não me preocupar com o diagnóstico não fazendo o exame. Achei que não saber era o que me impedia de fixar raízes por todos esses anos. Mas, de repente, dei-me conta de que as raízes foram fixadas e que uma planta forte havia crescido e cercado o meu coração.

Não era a incerteza a respeito da minha saúde que me impedia de sair voando, era o fato de eu ainda não ter encontrado uma pessoa que me fizesse querer enfrentar a tempestade, fincando ainda mais aquelas raízes.

Essa pessoa era a Camila.

Eu amei a Summer. Ela foi o meu primeiro amor. Mas não tinha sido "a" mulher para mim. Talvez porque fôssemos muito jovens.

Talvez eu sempre tivesse pensado nela como o meu primeiro amor, e lá no fundo soubesse que ela não seria o último.

Camila – era ela.

Eu já tinha me apaixonado muito antes de conseguir admiti-lo.

O que mudaria para mim agora, se o resultado do exame fosse positivo? Voltaria para a vida de sexo consensual e sem compromisso entre adultos?

Qual é a diferença entre isso e não querer descobrir sobre a doença?

"Não perca tempo se preocupando com o diagnóstico..."

Ela nem precisaria saber que fiz o exame, caso desse positivo. Mas e se eu fizesse o exame e descobrisse que era negativo?

"A escolha é sua..."

O risco de descobrir era maior do que o risco de perdê-la?

Era quase uma da manhã, mas, depois de finalmente tomar coragem para responder àquela pergunta, eu precisava conversar com alguém. Pegando o meu celular, passei pelos contatos até achar o que eu queria.
Ele atendeu com voz de sono, depois do quarto toque.

– Lauren? Está tudo bem?

Suspirei fundo.

– Sim, tio Joe. Está tudo bem. Desculpe ligar tão tarde. Mas preciso fazer um exame de sangue. Posso passar no seu consultório amanhã de manhã?

– Você está doente?

– Não. – Fiz uma pausa. – Mas agora preciso saber.

Não foi preciso explicar. O tio Joe levou um momento para processar minhas palavras.

– Me dê alguns minutos para eu me vestir. Encontro você no consultório em meia hora.

– É uma da manhã.

– Eu sei. Mas não foi fácil para você me ligar. Quero saber o que está acontecendo. Vou levar café.

Se você ainda quiser fazer o exame depois de conversarmos, conheço um laboratório que abre às seis. Eu mesmo colho o sangue e levo lá. E peço urgência a eles.

**********

Do jeito que as coisas são sempre difíceis para Camren, tenho até medo desse resultado. 🤔

CAMREN: Amigas Com Benefícios (G!P)Onde histórias criam vida. Descubra agora