Nathanael
Aquela garota sabe realmente como irritar alguém, com aquele sorriso patético que não sai de seu rosto, e mesmo com todas as maneiras que eu a trato, ela ainda vem com suas saudações desnecessárias. Seu jeito é igualzinho ao dele.
Já dentro de casa — após ter a "sorte" de encontrar aquela garota enquanto fazia carinho em um cachorro que quase me atropelou ao chegar correndo no meu quintal —, vejo que minha mãe está na cozinha, e me dirijo até ela.
— A senhora andou conversando com aquela garota ? — pergunto sentando em um dos bancos da bancada.
— Está se referindo a Chiara? — Ela para de cortar as cenouras e me encara.
— Estou.
— Sim, conversei.
— Eu já disse que não preciso disso.
— Eu só quero que você se sinta bem aqui, filho.
— Eu me sentirei bem se minhas decisões forem respeitadas.
— Você não pode se fechar para sempre depois de tudo qu...
— Eu não quero voltar a esse assunto — digo me levantando.
— Olha filho. — Ela suspira leve vindo até mim. — Não é só você que está passando por isso, seu pai, Lily e eu também. Mas nós estamos ao menos tentando seguir em frente. Não é algo fácil nem rápido, mas acho que você não deveria se prender a fatos já esclarecidos.
— Vou subir para meu quarto. — É a única coisa que digo antes de sair da cozinha.
Às vezes fico pensando como estaria as nossas vidas se tudo estivesse normal, provavelmente ainda estaríamos morando em San Diego, vivendo nossa vida tranquila e monótona, sem preocupações, e sem ressentimentos. Em um passo de mágica tudo a nossa volta pode mudar, acontecimentos inesperados, novos pensamentos surgem, pessoas chegam e outras vão embora, o que tanto defendíamos parece depois não fazer sentido algum. E eu descobri tudo isso de uma única vez.
Eu vivia sempre pensando que haveria um amanhã, um depois, e foi justamente quando um específico amanhã começou, que me vi desabar, um amanhã que eu não esperava chegar tão cedo, foi quando esse amanhã chegou que meu tempo parou, para mim não tinha hoje, amanhã nem depois disso.
Não foi o amanhã em que eu poderia dar risadas ao lado dos meus amigos, ou reclamar de alguma coisa com a minha mãe. Não foi o amanhã que eu iria para escola, fazer uma cesta de três pontos e receber a tão já acostumada glória, ou dizer para o Sr. Cooper que sua aula já estava fazendo meus olhos fecharem.
Não foi o amanhã em que eu chegaria em casa, e depois de meia hora sairia pro parque para andar de skate, sentindo apenas o vento em meu rosto e a música tocando em meus fones, me carregando para um mundo distante.
Mas sim, esse amanhã foi o dia em que não pude pedir desculpas ou agradecer, foi o dia que não pude rir, foi o dia em que não pude me desculpar com ele, porque meu orgulho foi maior que tudo para poder ter feito antes. Orgulho esse que me corrói a cada instante, em meus pensamentos que sempre se voltam para esse assunto.
Já deitado em minha cama, fecho meus olhos tentando dispersar meus pensamentos para qualquer coisa ou lugar. Mas não consigo, minha mente aos poucos foi tomada pelas velhas lembranças.
— Você não está bravo por que perdeu. Está? — O mais velho pergunta.
— Você trapaceou — digo emburrado.
— Você que não aceita perder. — Ele dá uma risada enquanto chega mais perto de mim e passa seu braço esquerdo pelo meu pescoço. — Já está tarde, amanhã eu te ensino a como fazer uma cesta de verdade. — Estávamos jogando basquete perto da garagem.
— Eu vou ser melhor que você — digo tirando seu braço de meu pescoço, recolho a bola de basquete e depois o encaro.
— Você só tem dez anos Nathan, e já está quase no meu nível, sinta-se grato por isso.
— Fala como se fosse um profissional — digo baixo para mim mesmo. Escuto sua risada agora mais alta.
— Comparado a você, eu sou um profissional. — Ele pega a bola de minhas mãos e sai correndo para dentro de casa.
— Ben! — o grito correndo atrás dele.
Não notei quando dormi, levanto da cama e vou para a pequena varanda na janela, já está de noite, respiro fundo e olho para o céu, ele está pouco estrelado hoje, e a lua brilha como nunca, fazendo com que a única parte bela desse dia, fosse de total mérito dela. Decido sair, preciso respirar e espairecer meus pensamentos.
Não sei qual foi a pior parte de ter saído no meio da noite, o fato de ter saído correndo, ou a parte de não ter a mínima ideia de onde me encontro agora, e para completar, deixei meu celular em cima de minha cama. Bufo decepcionado parando em frente ao que parecia ser um mercadinho, é o único estabelecimento aberto que vi até agora. Será que devo entrar para pedir ajuda? Não tenho tempo de decidir o que faria, logo sinto a porta ser aberta e um corpo dar de encontro ao meu.
— Desculpa! — pede a pessoa. Não pode ser, aquela voz é... — Você? — É Chiara, que carrega duas sacolas em uma de suas mãos.
Eu apenas suspiro pesado cruzando os braços. É de muito azar ter que encontrar essa garota duas vezes no dia.
— Bom, não tenho tempo para conversar com você. Tchau! — disse ela saindo as pressas.
Fico a encarando se distanciar, não sei se estou bravo ou grato por ela aparecer, já que moramos de frente para o outro, decido segui-la para assim finalmente chegar em casa.
— Estava perdido? — pergunta ela depois que percebe minha presença. Eu sei que ela segura uma risada. Fico calado, andando à três metros de distância dela. — Vou considerar seu silêncio como um sim. — Ela vira um pouco seu rosto para trás, acompanhado de um leve sorriso.
Reconsidero a ideia de voltar para casa sem a ajuda dessa garota, mas eu não estou com muitas opções de escolhas. Seguimos o caminho em silêncio. Quando chegamos perto de nossas casas, me direciono para a minha.
— Boa noite Nathanael. — Escuto a garota dizer um pouco mais alto, mas sem olhar para mim. Confesso que fiquei surpreso com tal ato.
Eu paro por um instante mas não a respondo, balanço a cabeça em forma de negação e volto a andar mais rápido para minha casa. Ao abrir a porta da entrada, vejo dois pares de olhos encarando a porta assustados, e agora me dou conta de que começará o interrogatório e mais e mais discursos sobre o perigo das ruas, e principalmente de nunca sair correndo de sua casa à noite e ainda por cima em uma cidade nova, sendo que seus pais podem ficar preocupados, criando mil e uma situações em suas cabeças de coisas perigosas que podem ter ocorrido.
![](https://img.wattpad.com/cover/256984605-288-k539344.jpg)
VOCÊ ESTÁ LENDO
Pelos Caminhos Do Seu Coração
Teen FictionChiara Wright é uma adolescente que nunca precisou se preocupar com as pessoas porque ela tenta ao máximo evitar qualquer tipo de desentendimento, sempre agindo educadamente, vivendo sua vida tranquilamente em São Francisco. Mas isso muda após...