21:00.
A morte é algo inesperado, sem aviso prévio nem nada. Ela simplesmente vem, tirando sua capacidade de respirar e viver por mais algum tempo que seja, ela pode ser lenta como um câncer ou rápida como uma bala.
Ela quem decide até quando você vai poder desfrutar dos prazeres da vida, até quando vai poder sorrir e ver aqueles que ama, até quando vai sentir o coração bater e o ar faltar nos pulmões de tanto rir ou ela também pode te deixar em uma depressão desde que nasce, te castigando antes mesmo de você saber o seu próprio nome.
Alguns aparelhos te mantém vivo em uma cama, você não pensa nem fala, seu cérebro está morto mas ainda insistem que há uma chance então ativam aparelhos para manter o seu corpo em funcionamento, deixando que sua alma sofra presa a um corpo morto.
"Desligaram os aparelhos, o velório será as quatro e o enterro às seis", meu pai disse do outro lado da linha enquanto tentava esconder o choro em sua voz.
"Tudo bem, foi melhor assim", foi o que eu respondi.
Eu não estava raciocinando enquanto tudo era transmitido por uma vídeo chamada, o corpo magro e pálido ereto dentro do caixão, as maçãs do rosto altas e os olhos fundos. Morta, ela estava morta.
As mãos de Wooyoung seguravam a minha enquanto eu chorava sem parar, desde que meu pai me ligou eu só consegui chorar nos braços de Wooyoung. Enquanto desciam o caixão meu coração parou por alguns segundos, ela estava definitivamente morta, enterrada a sete palmos abaixo do chão, morta.
Eu não pude ao menos ver ela uma última vez desde os meus dezessete anos e isso faz tudo doer ainda mais, eu não me importo se fizemos várias chamadas de vídeo, que se foda eu precisava tocar ela. Seria doloroso mas eu poderia vê-la outra vez antes que estivesse morta.
Eu não tive uma mãe, eu passei praticamente a minha vida toda morando sozinho e dependendo de mim mesmo, eu não tinha o carinho de ninguém enquanto chorava na cama a noite toda por sentir falta dela, eu poderia ter morrido se quisesse.
Meu pai disse que não vai voltar para Seoul, meus olhos lembram ela e ele não quer sofrer ainda mais e está tudo bem, é um direito dele não querer lembrar dela. Eu sequer lembro o cheiro do cabelo dela, do som da sua risada ou do calor de suas mãos. Eu era novo demais para ir visitá-la no hospital e quando tive idade suficiente ela foi transferida por um avião.
Eu nunca pude me despedir da minha mãe e isso me mata, eu passei por tudo sozinho, não podia contar para ela o que estava me machucando até porque ela já tinha seus problemas. Eu era só um filho rebelde que estava estragando a própria vida enquanto assistia a minha mãe morrer sem fazer nada.
Mas afinal o que eu poderia fazer? Rezar para Deus curar o câncer e fazê-la viver como uma pessoa normal? Não, eu não acho que isso resolveria. Tudo dentro de mim está se despedaçando lentamente, a cada vez que eu respiro um pedaço do meu coração se quebra fazendo um eco ensurdecedor em minha alma.
Eu queria estar morto.
-San. -Wooyoung me chama com a voz baixa e hesitante, está parado na porta.
-Hm?- tento parar de chorar quando ele se aproxima.
-Eu posso me deitar com você?- sem forçar para proferir qualquer palavra eu apenas balanço a cabeça, sentindo o colchão se afundar atrás de mim.
Ele chega mais perto passando seu braço pela minha cintura e entrelaçando sua perna na minha, em um gesto carinhoso ele beija meu cabelo e quando acho que ele vai sussurrar um "vai ficar tudo bem" ele apenas aperta minha mão.
-Finge que eu não estou aqui, não precisa segurar nada, eu estou aqui com você para tudo. -ele diz baixo antes de deixar outro beijo delicado em meu cabelo e isso me faz chorar ainda mais.
Minha garganta está doendo, eu estou tremendo e soluçando freneticamente, eu estou me sufocando. Chegando mais perto Wooyoung me abraça um pouco mais forte e a imagem do caixão descendo me vem a mente de novo.
As vozes cantando uma música estranha que me fazia chorar como uma criança, o caixão descendo lentamente, minha mãe morta dentro dele, meu pai chorando e tremendo, o som do choro, a chuva, tudo. Eu me sinto culpado por não ter tentado ao menos ir até a Inglaterra para ver ela mas eu era só um adolescente sem expectativa de futuro, o que eu poderia fazer?
Me viro na cama e os olhos de Wooyoung encontram os meus, estão preocupados e um pouco tristes ao ver o meu estado. Ele sabe que eu não estou bem, eu já estive bem algum dia?
Sua mão quente toca meu rosto, limpando as lágrimas que se acumulam e caem sem pausas, ele dá um sorrisinho reconfortante e então beija minha testa e depois a ponta do meu nariz e deixa um selinho rápido em meus lábios. Seu cheiro me acalma, fazendo as lágrimas cessarem um pouco.
Se ele não estivesse aqui, eu provavelmente estaria morto agora.
Wooyoung POV
Saber que ele não está bem é perturbador, seus olhos inchados e vermelhos denunciam o quanto está doendo e eu sei que ele queria estar no lugar dela, dói saber disso.
Eu não vou dizer coisas como "vai ficar tudo bem" ou "é a lei natural da vida", eu não tenho esse direito e nem ninguém tem. É tão estúpido tentar forçar alguém a ficar bem quando nada está bem, a vida não é um conto de fadas e sim, tem dias em que você vai querer morrer.
Sentir seus dedos apertando minha blusa enquanto ele soluça baixo contra o meu peito dói, dói porque eu sei que para ele isso está sendo insuportável, eu sei o quanto ele se culpa. Se fosse possível eu pegaria parte de sua dor para mim.
Enquanto acaricio seu cabelo cantarolo Before You Go, ele se aconchega melhor em mim e continua chorando baixinho. Eu sei como perder a mãe dói, eu perdi minha avó e ela era como uma segunda mãe para mim, aquilo doeu como um tiro.
Seus soluços diminuem até se tornarem uma respiração atrapalhada, ele está com o nariz enterrado em minha blusa e suas mãos suavizam o aperto, indicando que ele está começando a dormir.
-San?- o chamo e ele se remexe, está dormindo- Eu amo você, durma bem. -ele soluça mais uma vez e eu apago a luz do abajur, encarando o escuro.
Meus olhos estão ardendo e eu não sei se quero dormir, eu tenho medo dele acordar no meio da noite e eu não escutar mas o sono fala mais alto e meus olhos se fecham lentamente, me levando para um universo vazio e sem sonhos.
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Are We Still Us? [woosan] • EM REVISÃO •
FanficSan todos os dias escreve em seu bloco de notas o quão triste se sente pela falta de Wooyoung e o quão arrependido ele está por ter o deixado partir sem dizer ao menos uma única palavra que o confortasse. Mas então um dia triste e monótono como qua...