Capítulo 4 - O que diabos ele tinha?

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Miguel

    Não tenho ideia do que passou na minha cabeça quando resolvi contar tudo para José. O que diabos ele tinha? Por que era tão simples falar com ele? Sempre pensei que o nome "Bruno" nunca mais sairia da minha boca, que era um assunto proibido até para os meus pensamentos.

    No entanto, eu disse tudo. Como se fosse a coisa mais cotidiana da minha vida, como se José fosse a pessoa da qual eu era mais íntimo e eu nem sabia nada sobre ele. Depois de despejar toda minha verdade, ele me contou algumas coisas sobre sua vida.

    Descobri que José estava escrevendo um roteiro independente para uma minissérie e que estava com dificuldades por não conhecer os lugares que o protagonista visitava. Me ofereci para ajudá-lo com a ambientação, já que já viajei muito nessa vida, mas tudo que ele me disse foi "Veremos", como quem não quer aprofundar o assunto. Entendi o recado.

    Bia começou os preparativos para nossa viagem ao Rio, ficaríamos na casa dos nossos pais e iríamos na festa na casa da tia Bel, que morava num condomínio bastante confortável. José parecia distante desde a última vez que conversamos, parecia me evitar um pouco. Será que o fato de eu ser gay o incomodava de alguma forma?

    Eram nove horas da noite quando Bia nos mandou dormir naquela sexta-feira, queria que acordássemos cedo para não nos atrasarmos para o voo na manhã seguinte. Quando eram umas dez e meia e eu já estava pronto pra dormir, José abriu a porta com delicadeza e me espiou, provavelmente para ver se eu estava dormindo. Bia devia tê-lo mandado para conferir.

    - Então ainda está acordado. – Disse ele com apenas a cabeça dentro do cômodo.

    - Estou, já estava indo dormir quando...

    - Posso entrar?

    - Claro! O escritório é seu, afinal.

    José entrou e encostou a porta bem devagar, claramente não queria acordar Bia. Achei que ele fosse pegar algum livro de sua estante ou algum papel e sair, como nos outros dias, mas ficou me encarando enquanto segurava uma espécie de agenda embaixo do braço.

    - Tá tudo bem? – Foi a única coisa que consegui pensar em perguntar, ele estava me encarando afinal de contas.

    - Sim, eu só... posso te fazer umas perguntas?

    - Por favor, à vontade! – Me encostei na parede para lhe dar um espaço para se sentar junto comigo na cama. Vendo a minha deixa, ele se sentou e abriu o que antes eu achava ser uma agenda, mas na verdade era um caderno cheio de escritos e imagens coladas.

    - Você foi para Marrocos uma vez, não é? – Perguntou.

    - Sim, faz um ano já! É um lugar lindo, uma cultura muito rica. Pretendo voltar lá algum dia.

    - Poderia me falar mais sobre lá? Suas impressões como um turista brasileiro.

    - É para o seu roteiro? – Então ele tinha pensado sobre o que comentei. Pelo visto o "Veremos" significava que de fato ele pensaria sobre o assunto.

    - Foi na parte da viagem pra Marrocos que parei de escrever, estava tudo muito confuso – ele parecia uma criança com vergonha de perguntar pra professora sobre um conteúdo que não entendeu, era fofo – Você disse que eu podia perguntar, então aqui estou eu.

    - Te ajudo com prazer, fique tranquilo. Tem algo específico que queira saber?

    - Só me conte o que mais te chamou a atenção, tenho certeza que o que você me disser será interessante.

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