José
Eu deveria ter insistido mais quando Miguel disse que ficaria no Rio de Janeiro, a viagem de volta foi tranquila, mas ao chegar em casa, tudo parecia vazio. Passava a maior parte do meu tempo escrevendo dentro do escritório, ao menos todo aquele silêncio servia para acalmar a mente.
Uma amiga de Beatriz precisava de um lugar para ficar após ter se divorciado do marido e estava chegando para passar uns dias com a gente até resolver seus assuntos, não me impliquei com nada. Não me importava de deixar que Beatriz cuidasse de tudo do jeitinho dela, contanto que não interferisse diretamente na nossa vida.
- José, você não liga de ela ficar no escritório né? Vou deixar tudo igual quando o Miguel estava aqui.
- Não, eu prefiro ficar lá.
- Como assim?
- Vocês duas dormem no nosso quarto, eu fico no meu escritório. Não quero nenhuma estranha lá.
- Miguel ficava lá.
- Miguel não conta – doeu a menção do nome dele, será que ele estava bem? Pensava nele às vezes.
- Ele também era um estranho pra você.
- O Miguel é o Miguel, simples. E tá resolvido, eu fico no escritório e vocês duas ficam no nosso quarto, vai ser até mais divertido pra vocês! Vão poder ficar fofocando até dormir.
- Tá, mas não gosto de dormir sem você – ela saiu do sofá, onde estava deitada, e se sentou no meu colo. Me abraçou e deu um beijo em minha testa. – Tem certeza que não vai ficar chateado?
- Absoluta, pode ficar tranquila. Eu já passo maior parte do meu tempo no escritório mesmo, não será nenhum sacrifício.
- Como não? Vai ficar sem mim! Não é um sacrifício? – ri da expressão no rosto de Beatriz e a abracei.
- Tenho você a vida toda pra mim, posso te dividir algumas noites – ela riu e me deu um beijo antes de se levantar para ir buscar sua amiga na rodoviária.
Mariana era o nome da moça, loira dos olhos verdes e com um sorriso que devia ser bonito, caso ela parasse de chorar e lamentar o término. A semana foi assim: Mariana chorando, Beatriz aconselhando-a e eu trancado no escritório.
Na noite de quinta-feira eu me sentia agoniado, um sentimento que eu não sabia colocar em palavras. A comida não descia e não conseguia escrever nada, então resolvi me deitar e ficar escutando música incessantemente até que viesse alguma luz para a minha mente.
A música parou de repente e vi meu celular tocando, odiava quando isso acontecia. Me levantei pra pegar o aparelho que estava na mesa e sorri ao ver que era Miguel, atendi animado para saber suas novidades, mas fui surpreendido.
- José – sua voz estava falha, pude sentir sua dor. Ele não precisava me dizer mais nada, eu iria para onde ele estivesse.
- O que aconteceu? Miguel? Onde você tá?
- Tô indo aí, vou pegar o próximo voo – que alívio, eu não precisaria pegar voo nenhum, era só ir busca-lo no aeroporto.
- Ok, eu vou te esperar. Aguente firme, vai ficar tudo bem. Só respire fundo, tá?
Eu o escutei respirando uma primeira vez, mas ele logo desligou. Após colocar uma camisa decente e calçar um tênis no pé, peguei meu celular e carteira e fui pra sala, esperaria meia hora antes de sair pra ir até São Vicente.
- Onde você vai? Por que tá arrumado? – perguntou Beatriz, que estava com uma panela de brigadeiro assistindo O Diabo Veste Prada junto de Mariana.
VOCÊ ESTÁ LENDO
Como me vejo em você
RomanceE se o sentimento mais terno que já sentiu em sua vida fosse visto como um pecado? Seria você capaz de abandonar um paraíso pela pequena chance de não cair em desgraça? José é um roteirista, Miguel é um viajante. José é caseiro, Miguel adora uma fa...