capítulo 6

1.1K 75 4
                                    


NEYMAR

Estou malditamente ansioso. Não consegui me concentrar direito no treino, só fiquei pensando nesse evento. O episódio da nossa manhã, em que ela fugiu de mim, me incomodou o dia inteiro. E agora tô aqui, dentro desse terno que eu odeio, andando de um lado para o outro, assistindo Marcos reclamar que ela está atrasada, esperando Ana descer as escadas e começarmos nossa encenação.

- Até que enfim menina, porque as mulheres são assim, tão atrasadas sempre? - Marcos me desperta dos meu pensamentos, me fazendo olhar diretamente para a escada.

Não sei qual palavra definir o que vejo. Ca-ra-lho! A menina vai me matar ainda hoje. Enxergo uma Ana de cabeça baixa, descendo as escadas num tubinho vermelho que se ajusta perfeitamente as suas curvas naturais e uma sandália de salto. O cabelo solto com cachos mais definidos nas pontas caem sobre as costas e ombros. Assim que termina a descida ela me olha. A maquiagem simples da uma moldada em seu rosto bonito, e na boca um maldito batom coral. Olho novamente para seus olhos e cresce dentro do meu estômago a sensação já conhecida. O cheiro de framboesa fresca me atinge, e desconfio que seja do shampoo que lava os cabelos... Ou pode ser o cheiro dela mesmo... Gostaria de sentir mais de perto. O que? Não não posso no que eu estou pensando?

- Pois é, a fortuna que paguei a estilista valeu cada centavo - Marcos diz e me sinto estranho com sua fala... Atingido... Talvez com ciúmes?

Porca miséria. Eu tô ficando louco.


- Pois bem, vamos, casal - enfatiza o casal, nos deixando claro que é hora de ativar a farsa. - lembrem que casais de namorados seguram nas mãos pelo menos. Conversam, sorriem um para o outro dançam e etc. Por favor, as pessoas precisam realmente acreditar ok? - pede numa súplica.

Ana balança a cabeça indicando que entendeu e eu faço o mesmo.

Entramos no elevador e o cheiro dela se intensifica... Fecho os olhos e respiro fundo. Eu devo estar louco, isso não pode ser. Tento limpar a mente pensar em outra coisa mais não consigo. O que há comigo?

No estacionamento Marcos da as últimas instruções e entramos apenas nós dois no carro. Ela parece se esquivar ficando bem encolhida a porta. Está fugindo de novo. Preciso quebrar essa barreira.

- podemos conversar agora Ana? - resolvo quebrar o silêncio.

Ela fecha os olhos como se evitando algo... Uma lágrima? Os lábios se tornam uma linha fina e quando abre novamente já está me olhando. Não queria admitir, mais ela está incrivelmente linda.

- Senhor, meu horário de trabalho vai iniciar apenas quando descermos do carro. - suspira pesadamente e procura as palavras antes de falar - peço por gentileza que iniciemos a comunicação apenas após isso.

Formalmente me trata como o patrão. Me atinge. Qual é? Eu só quero conversar? Ela não vai me afastar, não pela terceira vez. Num impulso seguro seu pulso, querendo que ela me olhe. Sinto novamente o choque e a quentura, e olhando-a percebo que ela também sente, tendo em vista que ela pula no momento em que minha pele toca a dela.

- Já que quer me tratar como patrão então exijo que converse comigo, agora! - de onde tirei isso? Qual é Ney, isso nao soou tão bem quanto imaginei. Miséria.

Percebo sua postura mudar. Eu a atingi com minhas palavras. Ela fica um instante pensativa, segurando alguma coisa dentro de si. Depois se vira para mim.

- Claro senhor, em que posso ajudá-lo?

Merda, aí está, ativou o modo serviçal.
Bem, resolvo continuar assim mesmo, já que não há outro jeito de conversar.

- Ana - limpo a garganta antes de continuar - quero dizer que ontem no escritório, eu fui um tanto quanto rude, e não poderia ter te tratado daquela forma.. eu te devo..

- Não. O senhor não me deve nada - ela me interrompe. - apenas disse em voz alta o que eu sou. E não mentiu. Nem aumentou. Isso que sou e não mudará. Então por favor, sem esse tipo de dó de mim. Me deixe fazer meu trabalho e facilite isso pra mim. O fato é que não há conversa. Eu vou descer desse carro e fazer meu trabalho perfeitamente, foi pra isso que fui contratada. Longe dos holofotes não temos a necessidade de conversa. Então, peço mais uma vez por gentileza, facilite isso para mim e me deixe fazer meu trabalho. É o que as empregadas fazem.

Ela está magoada. Sim, eu exagerei muito e ela construiu uma barreira que não vai ser fácil de quebrar. Opto por ficar em silêncio. São doze meses menina... Vou descobrir como tornar essa convivência melhor e quebrar suas malditas barreiras.


...

Chegamos. Observo ela respirar fundo, e mastigar o interior da boca, ela está nervosa. Mais porque? Eu a incomodo tanto assim?

Desço primeiro do carro. Os flashs começam.. eles sempre estão em todos os lugares, são ratos. Querendo meus deslizes para publicar na internet. Contorno o carro e abro a porta. A cena diante dos meus olhos faz crescer a sensação do estômago. Ela está sorrindo pra mim. So-rrin-do. Porcaria, linda pra caralho! Estendo minha mão e ela a segura em resposta. O meu coração acelera, posso ouvir ele bater em meus ouvidos. Mais flashes são disparados e ela se põe de pé ao meu lado. Penso que seria adequado segurar sua cintura. E o faço. Estamos tão perto... Malditas framboesas frescas... Inspiro devagar curtindo o cheiro que ela tem. Em resposta ela me olha e sorri novamente. Estou fodido, bem aqui. O meu estômago não tem mais espaço de tanta sensação crescendo nele. Merda.

Caminhamos para dentro da boate iluminada. Procuro pelo camarote reservado e seguimos sem me soltar dela. Percebo uns olhares masculinos e me cresce um sentimento de possesividade... Mais o que? A menina não é minha.

A noite se passa agradavelmente estranha.. ela conversa banalidades comigo, sorri, dançamos e nos olhamos nos olhos.... O que está havendo? No carro ela não queria conversa e aqui está agindo como se... Como se quisesse estar aqui. Oh merda... O modo atriz foi ativado. Isso não é real. Ela não quer estar aqui. A constatação me deixa triste.

Olho no relógio e deu nossa hora. Hora de ir embora, hora de voltar a realidade. Caminhamos de mãos dadas até o carro e eu abro a porta a ela, oferecendo passagem. Ela me olho por uns segundo e sorri... Algo me diz que será o último sorriso da noite.

Contorno o carro e entro, e assim que Severo põe o carro em movimento me viro para ela.

- Adorei a noite Ana.

Ela fecha os olhos. Daquele jeito que quer segurar algo... E merda. Me quebra.

- que bom senhor. Pretendo executar meu serviço com presteza e perfeição.

Minha vez de fechar os olhos. O modo atriz se foi. E a barreira volta a se estabelecer.

AlwaysOnde histórias criam vida. Descubra agora