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– Elle! – Tony me grita do meio da confusão com uma expressão de susto. Sua camisa e seu cabelo carregavam resquícios de poeira. – Está tudo bem? Eu vim assim que soube da briga.
– Ficou sabendo a um segundo atrás? – Pergunto dando uma risadinha enquanto estava sentada com as pernas junto ao corpo em uma das cadeiras dos fundos.
– Quase isso! – Um sorriso convencido surge em seu rosto. – Vamos pra casa? – Ele sugere, e eu aceno um sim.
As aulas foram suspensas durante o resto do dia, e Tony me deu uma carona de volta. Paramos na casa dele para guardar a moto, e o seu cachorro veio correndo em minha direção. Fecho o portão, ficando à salvo do lado de fora longe daquela criatura.
– Deixa de bobagem, entra logo! – Ele grita de lá de dentro.
– Não até você prender esse bicho! – Grito de volta.
Algum tempo se passa e o portão se abre.
– Não devia chamar o Boi de bicho. – Tony protesta, fechando o portão atrás dele. – Ele poderia se ofender!
– Ele já se sente ofendido com esse nome ridículo! – Rebato. – Quem dá o nome de um animal para outro animal?
– Acho que faz mais sentido do que dar o nome de uma pessoa pra um animal.
– Ah, meu Deus! Não! Não vamos entrar nessa discussão de novo. – Reviro os olhos, e ele ri.
Depois de guardar a moto Tony foi me acompanhando até a minha casa, que ficava na mesma rua que a dele.
– Ainda bem que não se machucou naquela confusão. – Disse Tony. – A coisa foi bem feia. Soube que dois alunos foram levados desacordados para o hospital.
– É... – Dou de ombros. – Sorte a minha que tenho meu super-herói favorito pra se preocupar comigo. – O cutuco e dou um sorrisinho. Vejo o seu rosto corar.
– Estou sempre à disposição para salvar as gatinhas em perigo. – Sorri, após recitar um bordão implícito dos super-heróis tradicionais nos filmes.
– Gatinha? Então quer dizer que me acha bonita? – Provoco, mas agora acho que eu é que estava corando.
Ele bufa, balançando a cabeça, com um sorriso tímido.
– Até parece que não sabe disso... – Seu tom de voz carregava nervosismo e mais alguma coisa que eu não soube decifrar.
Chegamos ao quintal da minha casa e nos aproximamos da árvore com um balanço de pneu, onde nós brincávamos quando crianças. Eu sempre gostei do clima de onde eu morava. Principalmente as tardes onde a brisa fria do vento balançava as árvores, os pássaros voavam no céu retornando para o seu ninho... Tudo parecia uma linda pintura. E a noite, um luar exuberante. Em um determinado tempo durante o ano, a lua fica exatamente de frente da minha janela, e eu podia dormir olhando para ela.
– Sabe... – Digo, pensativa. Tony se senta no balanço e eu fico em pé ao lado dele. – Eu estava pensando na ilha hoje cedo, antes do lance com o Pedro.
– Elle... – Ele tenta me interromper.
– Eu sei que todos vocês agem como se isso não fosse acontecer, mas fingir que não existe um buraco no chão não vai fazê-lo desaparecer de lá. – Tony balançava a cabeça como se tentasse expulsar dos pensamentos o que eu dizia. – E eu não consigo continuar agindo como se estivesse tudo bem, quando na verdade eu estou pensando nisso o tempo todo... É como se eu estivesse mentindo para mim mesma.
– Se o pior acontecer... – Ele fala essa ultima frase com relutância como se estivesse dizendo uma palavra proibida. – Ninguém precisa saber que você não tem habilidades. A gente pode esconder isso, dizer que sua habilidade é sentir cheiros de pessoas há quilômetros de distância ou sei lá. – Ele olha para mim. – Você não tem que ir embora.
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Os Exilados
Ciencia FicciónNo futuro pós-colonização de Marte, onde 80% das pessoas possuem habilidades sobre-humanas, ser parte da minoria pode ser fatal. Ellena é uma jovem que teme a terrível deportação para a Ilha do Sul, lar dos sem-habilidades. Mas quando alguém do pass...