Nova cidade, nova escola, nova vida.
É como se tudo desandasse, por mais que mamãe ache que pode recomeçar, nós vamos sempre ser assombrados por memórias antigas.- Lembre-se de ser educada e sempre sorrir - mamãe diz enquanto dirige o carro.
- E se eu não quiser?
- Beatrice! - repreende.
- Qual o problema?
- Você não pode ser assim, eu faço de tudo pra dar uma vida boa pra você, e é assim que me retribui - aperta o volante.
- Não. Você faz tudo isso pra se beneficiar, não dá a mínima pra mim.- coloco os fones de volta - Sabe mamãe, eu não vou estragar seu romance, ou te envergonhar como você diz, mas nada nunca vai mudar o nosso passado, pode fingir, mas eu não.
Ouvir música, é o que me mantém sã durante essa mudança.
Já fomos a tantos lugares que eu me acostumei a ficar sozinha, sem amigos, sem pessoas. Não faz sentido se apegar a ninguém, no final eu sou obrigada a deixar tudo pra trás e ir pra uma casa nova.Aos poucos fomos chegando. A cidade era pequena, mas grande comparada a minha antiga. Era repleta de rios e becos escuros, sombria, não tinham cores destacadas, parecia um completo preto e branco.
- O que achou? - pergunta.
Não respondo me distraindo com as garotas na rua, elas pareciam menosprezar um criança por sua aparência.
- Você me ouviu?
- O que disse? - volto minha atenção ao carro.
Não importa aonde, as pessoas sempre agem assim. A necessidade de rebaixar outra pessoa pra se sentir melhor é uma questão que corrói minha mente, não que eu seja diferente deles, todos somos tolos ao inicio da vida, a diferença é que alguns aprendem com seus erros.
O carro para em frente a uma casa, uma grande casa. Posso chamar de mansão, mas é antiga, apagada.
- Chegamos - sorri - olha, eu sei que não gosta de tudo isso, mas tem que tentar.
- Tentar?
- Tentar. Ou talvez prefira ir para a casa de seu pai.
- Me desculpe - abro a porta saindo.
O medo. O único medo que eu sinto. Os pesadelos que me assombram. A realidade que me faz fingir ser quem eu não sou. Minha mente é o lugar pra onde eu fujo. É um escape do universo e de todas suas coisas fúteis.
Nessa história, na que eu sou a protagonista, não posso libertar minha mente, impor meus desejos ou minhas opiniões. Apenas assentir, fingir sorrir, e continuar vivendo, ou melhor, sobrevivendo.
Vocês devem me odiar, pelo menos aqueles que conhecem minha versão superficial. E é por isso que eu estou aqui, pra contar meu lado da história, no qual eu consigo expressar minha dor.
Engulo seco, e respiro fundo encarando o lugar.
Depois de alguns minutos tirando as malas, outro carro chega.
- Charlotte! - um homem sai do mesmo.
- Daniel! - se beijam.
- Sua filha? - me olha de cima a baixo.
Não respondo, apenas forço um sorriso.
- O prazer é meu mocinha - ri cínico. - Vamos entrar.
- É, vamos lá.
A vizinhança inteira é repleta de casarões antigos, estamos em um filme de terror. Essa cidade é gelada.
- Gostou da cidade? - coloca as caixas de papelão em cima da mesa.
- Eu acho que espíritos estão presos nessa casa - ajudo.
- Esse é o ar de Lincon Hills.
Deve ser por isso que estava cinco vezes mais barata do que todas as casas dessa cidade. Interessante, isso vai ocupar meu tempo, talvez eu escreva um livro sobre o massacre da Mansão Lincon.
✦
Estou em meu novo quarto, desempacotando caixas enquanto ouço Smells Like Teen Spirit. Nirvana é realmente a solução dos meus problemas.
- Abaixa esse som! - gritos vindo do andar inferior.
Ignoro e aumento ainda mais voltando a dançar.
Coloco minhas caixas em um canto e me jogo na cama enorme do quarto.
- Aqui dentro é bem mais quente - me enrolo nas cobertas.
Relaxo o corpo e fecho os olhos.
- Abre essa porta!
Resmungo baixo e abro.
- Podemos conversar?! - grita.
- O que? Não estou ouvindo.
- Triz! - desliga o rádio.
- Era a melhor música - resmungo.
- Esquece isso - puxa meu braço, se sentando na cama.
- O que você quer?
- Vá comprar roupas novas, quem sabe se enturma.
- O que tem de errado nas minhas roupas?
- Eu não fiz um pedido. Você tem que parar de ser assim, é uma nova fase de nossas vidas.
- Da sua vida, mamãe - levanto desanimada.
Desço as escadas o mais rápido possível. Eu sinto pena de minha mãe, mas sinceramente, não consigo dar o que ela quer.
As ruas são estreitas e estranhas. Gosto de pensar que estou em uma ponte caminhando para ponta onde o capitão me espera, e lá, sou jogada aos tubarões famintos.
- Cuidado! - um grito seguido de buzinas.
Eu odeio ônibus, e motoristas apressados.
Paro pra respirar em um parque próximo. Os brinquedos são enferrujados e tem poucas crianças brincando.
Sinto uma angústia em meu peito ao ver aquelas cenas, elas me traziam nostalgia, mas ao mesmo tempo me trazia um tempo doloroso de recordar. Uma infância difícil, talvez seja isso que me faça ser uma jovem reclusa e um tanto quanto rebelde, mas ao nível certo.
Me aqueço nesse casaco e volto a andar.
Não tem nada demais por aqui, apenas bares e algumas lojas pequenas. Gente correndo por aí, velhas alimentando pombos.
Encontro um lugar reconfortante debaixo de uma árvore na grama molhada. Me encosto tirando um lápis e meu diário. Escrevo sobre minha chegada.
Talvez eu fique aqui por mais algum tempo, e depois passe em uma loja qualquer.
Eu gosto da palavra "talvez", é como tudo na minha vida, nem sim, nem não, apenas talvez. Nada de garantia, mas o suficiente pra deixar a vítima com uma incerteza mortal.
É como se apontassem uma arma pra sua cabeça.
"Atiro ou não atiro?"
"Talvez".
Tinha me esquecido de como amo representações e pequenas metáforas.
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Próximo capítulo em breve.
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Dear diary, Vinnie Hacker.
FanfictionHistórias de amor nunca fizeram sentido para mim. Quando roubou meu diário, roubou parte de mim e tudo o que eu pensava. Em poucas páginas você me decifrou, e em poucos dias eu conheci seu lado inexplorado. em andamento. - Não aceito adaptações. @vi...