Depois da conversa com a minha mãe, Olívia e eu voltamos para o meu apartamento. Precisávamos de um banho e um bom cochilo mais do que qualquer outra coisa.
Olívia havia marcado um jantar com a Helena, já que no fim das contas a Helena realmente só queria conversar. Obviamente fiquei feliz, mas algo me parecia errado. Agora que o efeito do álcool e toda a euforia da noite passada passaram, uma angústia me queimava o peito ao ponto de perfurar a pele.
Só se passaram dois meses desde quando fui expulsa de casa, muita coisa aconteceu de uma só vez e ainda tem muito mais coisas para acontecer. Com a Olívia as coisas estão bem, mas minha amizade com Yara parece estar perto do fim; também preciso me preocupar com o vestibular que está cada vez mais próximo, sem contar que ainda não decidi qual curso pretendo fazer. Além dessas coisas, ainda tenho muita coisa mal resolvida comigo mesma e que estão começando a me sufocar. Essa angústia está aqui há muito tempo, mas eu fingi que não, por isso agora é culpa minha que ela esteja me mastigando lentamente.
- Sarah, está tudo bem?
Olívia perguntou com tanto carinho na voz que por um segundo pensei que iria chorar, mas me contive o suficiente para não preocupa-la.
- Está sim, vamos entrar logo.
Menti quando notei que ainda estava parada na porta do apartamento completamente estática. Talvez ver Helena tenha sido o gatilho para isso tudo retornar.
- Sarah... Não minta para mim, eu sei que tem algo errado.
- Não é nada de mais.
- Se não quer falar agora, vamos fazer assim, primeiro nós tomamos um banho quente para tirar a cachaça do corpo, depois eu faço duas xícaras de chá de hortelã e sentamos para conversar sobre o que está acontecendo.
Olívia não esperou por uma resposta, apenas me abraçou forte o bastante para que o que estava me apertando o peito parasse nos braços dela.
- Eu te amo tanto, Olívia.
Minha voz saiu baixa demais, quase inaudível, mas pelo sorriso dela eu sei que ela ouviu.
- Vem, eu vou te dar banho hoje.
Como se eu fosse uma peça frágil de vidro, Olívia me pegou pela mão e me levou até o banheiro, onde tirou a roupa do meu corpo para me colocar embaixo da água quente. Não demorou muito para que sua nudez tocasse a minha, porém, desta vez, de uma maneira não-sexual. Seu toque era amoroso, talvez até mais do que todas as outras vezes que me tocou. A delicadeza dos seus dedos, deslizando suaves e fazendo espuma com o sabonete lavanda, eram como pincéis de fios macios, que pintam com cores vivas e quentes a tela de algodão e fazem uma pintura tão bonita quanto o nascer do sol ou as lágrimas de um amante.
Naquele momento, era como se ela estivesse lavando a angústia e deixando tudo mais claro. A angústia ainda estava ali, ela não foi embora como a sujeira do meu corpo, no entanto, estava mais palpável, como se a Olívia houvesse moldado o misto de sentimentos ruins que me mordiam para que eu conseguisse segura-los e encara-los de frente.
- Enquanto você se veste, vou fazer o chá, tudo bem?
Concordei em silêncio, ainda enrolada na toalha e com o cabelo pingando água no chão. Agora que estou fora da água, os sentimentos ruins pareciam ter ganhado força, como se os anos sufocados e guardados no baú do meu peito houvessem alimentado eles, esperando um deslize, ou um mínimo gatilho que seja, para que chegasse a vez deles me sufocarem.
Foi preciso uma energia maior que o comum para me vestir, mas consegui fazer isso em tempo suficiente para não precisar que Olívia fizesse isso por mim também. Ela que me esperava na sacada, sentada no chão com duas xícaras fumegantes ao lado.
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Arte, Café e Menta | ⚢︎ [Em Andamento]
Teen FictionSarah Machado é uma jovem pintora lésbica, que ainda tem 17 anos e está "no armário". Ou pelo menos estava, antes de um maldito vídeo, onde ela beija e dança loucamente com outra garota, cair na internet arruinando ainda mais a sua vida, que já não...