isso é o que eu espero

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Wooyoung deve frequentar muito esse lugar, porque mal entramos e todos os funcionários começam a cumprimentá-lo como se já o conhecessem há anos. Logo depois, ele fala algo que não entendo e uma das garçonetes nos guia até uma pequena sala. Está vazia. As paredes são de um tom claro de marrom e, ao centro, há uma lareira de pedras, uma pequena mesa e duas poltronas. O chão é revestido com um carpete felpudo bege, então tiramos os sapatos antes de entrar.

— Vou pedir um chocolate quente. O que vai querer, San?

— O mesmo que você — respondo, distraído, já me aproximando da lareira e sentando no chão.

O de fios lilás vira-se para a garçonete e volta a falar em japonês. Ela sorri, então pega um bloco de papel e uma caneta para anotar o pedido. Enquanto isso, deslizo meus dedos pelo carpete, sentindo o conforto que é estar em frente à uma lareira depois de tomar um belo banho de chuva gelada. Melhor que isso, só se eu já estivesse tomando o chocolate quente e recebendo carinho. Não de Wooyoung, claro, porque isso já seria estranho. Estranho demais.

— O que achou? — pensando na peste, ele senta ao meu lado, de frente para a lareira.

— Achei que não estava com frio — resmungo. — Certo, esse lugar é maravilhoso, não sei como agradecer por isso.

— Apenas aprecie o chocolate quente, é o melhor daqui de Kyoto.

A jaqueta dele tem um cheiro muito bom. Embora eu já me sinta aquecido, não pretendo devolvê-la ainda. Quero dizer... Se ele quisesse de volta, teria pedido, não é mesmo? Não é como se eu estivesse fazendo algo de errado.

Nossos pedidos chegam. A caneca é maior do que eu pensava e tem uma camada de chantilly por cima, junto com raspas de chocolate. Ele estava certo, esse é o melhor chocolate quente que já tomei.

— Pensei que você era parte do plano — comenta, sossegadamente, antes de mais um gole.

— À essa altura, já deve ter percebido que não sou — ele afirma com a cabeça e começa a rir.

Assim que terminamos de beber tudo, deitamos lado a lado e continuamos conversando, enquanto olhamos para o teto. Sempre que ele está falando, viro o rosto em sua direção e o observo. Tento ser sutil para não parecer que sou esquisito, mas é que o moleque é bonito e eu gosto de ver suas expressões.

Às vezes, ele se empolga com o que está dizendo e balança os pés. Isso é muito fofo. Não tem problema achar isso fofo, tem? Seonghwa é meu amigo e também faz algumas coisas que me fazem pensar que ele é fofo, como quando ele espirra. O que posso fazer? Não dá pra evitar. Sério.

Quando deixamos a salinha, calçamos nossos sapatos. Wooyoung se aproveita que estou com dificuldades em amarrar meu tênis e sai na frente para pagar a conta. Estou profundamente incomodado, porque não gosto que fiquem pagando as coisas para mim. Juntei dinheiro por muito tempo e trouxe para gastar, não para deixar dentro do bolso, enquanto sou carregado por um amigo que acabei de fazer. Que droga.

Mas a criatura é teimosa e acabo parando de discutir quando ele muda de assunto e pede meu número. Não sei de cabeça, porque foi um chip que Seonghwa me emprestou para que eu conseguisse me comunicar com ele e com a minha família enquanto estivesse por aqui.

— Ainda não decorei — ele me olha com desconfiança.

— Ah... — pronto, agora ele acha que eu que não quero passar.

— Faz o seguinte, me passa o seu, aí eu te ligo e você vai poder salvar o meu também — entrego o celular na mão dele.

Ele me leva de volta até a praça na qual nos encontramos e insiste para que eu pegue um táxi. Mesmo sem ter argumentos, acaba me convencendo. Nos despedimos e agora estou no banco traseiro do veículo, com a cabeça encostada no vidro, pensando na vida. É frustrante ver como o dia passou rápido e chegou naquele momento em que não sei o que vem a seguir. Temos os números um do outro, mas e se não ligarmos? E se eu mandar uma mensagem e ele nunca mais responder?

Porque seria tão bom se continuássemos saindo. Wooyoung disse que me apresentaria os melhores lugares da cidade e, ao contrário do que pensei naquele beco quando percebi que fui enganado, ele até que é legal.

Como a ansiedade não passa, pego meu celular e começo a digitar uma mensagem. Pergunto se ele chegou bem em casa, mas me arrependo assim que o táxi para e descubro que a peste deixou minha viagem paga. Agradeço e saio do carro ainda com o celular na mão, pronto para xingar Wooyoung.

mafioso do cabelo lilás: cheguei bem, e você?

você: por que fez isso?

Quer saber? Estou mesmo achando que ele está pagando tudo pra mim por pena, porque não é possível que seja apenas agradecimento.

você: eu tinha dinheiro pra pagar 🙄

mafioso do cabelo lilás: ótimo, agora você me deve um drink
mafioso do cabelo lilásvamos à Butterfly amanhã
mafioso do cabelo liláste espero lá às oito

Sério que ele fez isso como pretexto para me ver de novo? Porque se for, não precisava. Tipo, não mesmo. Eu aceitaria até se não estivesse devendo nada, mas acontece que não faço ideia do que essa Butterfly seja, então recorro ao bom e velho Google. Aparentemente, é uma casa noturna. Isso quer dizer que Wooyoung já tem idade para beber, então não é tão novo quanto pensei.

você: ok

Acho que Seonghwa está fazendo hora extra, porque entro em casa e todas as luzes estão apagadas, então aproveito o momento pra ligar pros meus pais e atualizá-los sobre a viagem. Eles parecem preocupados, mas ao mesmo tempo felizes por eu estar me divertindo. Querem que eu vá passar uns dias lá quando voltar, já que não os vejo desde as minhas últimas férias.

Assim que desligo, volto a pensar no fato de que acabei de concordar em ir à uma boate com Wooyoung. Até aí, tudo bem, mas o problema todo é que, levando em consideração o que aconteceu no beco, ele pode facilmente estar querendo ir à Butterfly para vender drogas ilícitas.

Posso estar exagerando, mas o que aconteceu foi muito esquisito, sem contar que o garoto é cheio dos mistérios e não entra em detalhes sobre o que faz da vida. Pelos deuses, onde eu estava com a cabeça? Vou cancelar. Preciso cancelar. Não posso acompanhá-lo nesse tipo de aventura e acabar sendo preso em terras estrangeiras.

— Boa noite, San — Seonghwa chega, afastando-me desses pensamentos.

Ele está carregando um monte de sacolas, com um olhar de cansaço, porém um grande sorriso estampa seu rosto. Aproximo-me para ajudá-lo.

— Achei que estava fazendo hora extra. Por que não me chamou pra ir ao mercado contigo? — questiono.

— Achei que você chegaria mais tarde por estar com o mafioso — comenta, enquanto abre as sacolas e começa a separar o que comprou. Percebo que estou com fome. — Enfim, me ajude com a comida.

Ele sabe que não adianta dizer que não precisa, porque vou insistir. Não sou muito bom em cozinhar, mas sou bem prestativo como assistente e isso faz com que o preparo se torne mais rápido do que seria se ele fizesse tudo sozinho. Além disso, gosto de sentir que sou útil em algo.

— Ele estava sendo encurralado por um mafioso, é diferente — concluo que o apelido que demos ao Wooyoung não faz o menor sentido.

— Mas ele pode estar ligado com a máfia — justifica, mas ainda não me convence.

— Ou realmente o confundiram com outra pessoa — dou de ombros — isso é o que eu espero.

morning sun • woosanOnde histórias criam vida. Descubra agora