não quero o seu dinheiro

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O vento acaricia meu rosto, bagunçando meus cabelos e preenchendo minhas narinas com o aroma doce das flores do jardim. Estou sentado no mesmo banco de madeira em que deitei ontem. Às vezes, desvio meu olhar pra sorveteria pra verificar se o baixinho encrenqueiro de fios lilás já chegou, mas depois volto a observar as poucas pessoas que caminham pela praça. À minha esquerda, uma mãe tenta consolar o filho que chora copiosamente por conta do sorvete que caiu no chão.

De acordo com o meu celular, faltam apenas cinco minutos para o horário combinado e estou cada vez mais convencido de que Wooyoung não virá. Começo a questionar minha própria vinda. Por que fui inventar de fazer amizade com ele? Eu nem sou disso. Embora Seonghwa fique ausente por causa do trabalho, sei me virar muito bem sozinho, não preciso arrumar outra companhia. Ah, pronto. Começou o conflito interno.

Sério... Quando foi que me tornei carente de amigos ao ponto de submeter à isso? Sinceramente? Acho que vou fugir. É isto. Não quero conta com esse louco.

— Vamos pegar o sorvete logo, depois voltamos pra cá — não preciso me virar para ver quem acaba de sentar ao meu lado, porque reconheço a voz. Ele teve sorte, porque eu estava a um passo de zarpar.

— Boa tarde pra você também, Wooyoung — resmungo.

Ele não responde. Ao invés disso, ri e se levanta, me puxando pelo braço para que eu o acompanhe. Oras, quem ele pensa que é? Não pergunta nem como eu estou e quer me arrastar praça afora.

Quando chegamos na frente do quiosque, finalmente nos entreolhamos e eu noto um pequeno corte em seu lindo rosto, próximo ao queixo. Contudo, acho que não seria apropriado perguntar sobre. Ele pergunta meu sabor favorito e começa a fazer o pedido.

— Não quero o seu dinheiro — ele afasta a minha mão e eu aperto as notas entre os meus dedos para que não caiam.

— Mas ontem você pagou o meu lanche.

Estou sendo ignorado. Ótimo, perfeito. A atendente nos entrega um enorme pote de sorvete. Sem brincadeira, deve dar para dividir pra uma galera. Não é possível que essa criatura coma tanto assim. A não ser que ele tenha pego para nós dois, mas ainda assim é muita quantidade e isso seria um pouco estranho, não? Comermos no mesmo pote.

Minha suspeita é confirmada quando ele me entrega duas colheres junto aos guardanapos para que eu carregue, depois sai em direção ao banco e senta com uma perna de cada lado, acredito que na intenção de ficar virado de frente para mim, portanto faço o mesmo.

— Já se acalmou ou ainda acha que eu estava te perseguindo? — indaga, distraidamente, no mesmo momento em que toma uma das colheres da minha mão, a preenche com sorvete de chocolate e traz em direção à minha boca.

Isso é, no mínimo, esquisito. Será que faz parte da cultura local? Tudo bem se tivéssemos intimidade, mas acabamos de nos conhecer, não temos nenhum laço. Recuo ao sentir o gelado em meus lábios, mas ele avança.

— Prove — acabo cedendo.

Não foi tão ruim assim. Acho que ele está apenas sendo gentil, então talvez eu deva fazer o mesmo. Observo o pote com calma, enquanto ainda aproveito o sabor de chocolate em minha língua e pego um pouco do sorvete rosa com a colher que ainda está na minha mão, depois a solto, pego de novo, percebo que o sorvete está derretendo e tento pegar mais. Vai ser difícil olhar pros lábios dele, porque pode parecer outra coisa. Não sei se consigo, portanto desisto, porque ao erguer a cabeça, o vejo com as sobrancelhas arqueadas e um olhar de preocupação.

— Você está bem?

É que, às vezes, meus pensamentos são tão barulhentos e caóticos, que meu cérebro acaba travando e não conseguindo processar uma resposta à tempo. Em outras palavras, eu bugo.

morning sun • woosanOnde histórias criam vida. Descubra agora