Terça-feira - 23 de setembro. - Manhã

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⚠️⚠️⚠️AVISO: O capítulo a seguir contem certos gatilhos. Entre eles: menção a estupro, cenas e palavras de ódio, maus tratos infantis e traumas relacionados a fogo.

⚠️⚠️⚠️⚠️⚠️⚠️O perfil Kakaboom, ou seja a autora, NÃO concorda com nenhum dos temas pautados, assim como o perfil (Bichennocu_egritaria) da minha beta e repostagem NÃO concorda. Entendemos que nada aqui deva ser romantizado ou minimizado e eles não serão, mas são necessários para a construção das personagens FICTÍCIAS de XZ e dos gêmeos. ⚠️⚠️⚠️⚠️⚠️⚠️

Vou fazer o possível para abrandar tudo, afinal eu tambem tenho gatilhos nesses tipos de assunto. Mas por favor cuidado. Caso haja qualquer hate ele deve ser direcionado APENAS a mim (Lolisstymay) como autora.
Lembrem que eu amo vocês♡

~Kakaboom.

Parecia que o mundo estava acompanhando o humor de Xiao Zhan. O dia havia amanhecido cinza e frio, não havia nem sequer sinal de chuva, mas o sol tambem não fazia presença. Era tudo apenas muito monótono, muito... Morto.

Aquela visita havia sido marcada em forma de emergência, pois haviam certos avisos de seu advogado que haviam o deixado não só estressado, mas extremamente com medo. Ao que nos leva a situação atual onde Zhan esperava para ser atendido com seu psicólogo. 

A sala de espera estava praticamente vazia - talvez por ainda ser sete da manhã.  Mas tirando ele e uma menina pré-adolescente junto ao pai não havia ninguém. Seu calcanhar batia no chão em forma de demonstrar sua ansiedade e o designer mordia a ponta a cordinha de seu moletom gigantesco. Poucos segundos e viu seu nome ser chamado por uma moça na recepção. Ela sorriu de forma tranquila para si, provavelmente acostumada a ver pessoas em simulações complicadas e com uma empatia a mais para as tratar de forma doce para se sentirem acolhidas.

A sala da psicóloga cheirava a chocolate com menta, lhe lembrando vagamente de sua pasta de dente mas não era como se fosse ruim. Ela era peculiar, se assim posso dizer. Os cabelos tinham discretas mexas rosas e o rosto ficava atrás de grossas lentes quadradas, novamente isso não era ruim. Seu ar era tão despojado que era acolhedor. O mulher sorriu preocupada para si e pediu que sentasse na poltrona branca e acolchoada.

– Fiquei preocupada quando me ligou ontem a noite, esta tudo bem, querido? – A rosada era estrangeira, com um forte sotaque russo. Tatiana havia se apresentado como vinda de uma familia pobre e que era sufocante. Contou toda a sua história para o Xiao se sentir confortável em falar, mas mesmo assim ele só havia lhe contato o que Yibo sabia. Apenas a noite do desastre, o resto de sua vida ainda era um borrão. 

– Kwan está nos procurando. – Tatiana ficou surpresa e assustada. O pai dos três meninos sumia por anos e agora aparecia? Meu Deus, graças aos céus que Zhan a havia contado. – Meu advogado disse que ele ligou para a escola dos meninos. – O lábio inferior do homem estava tremendo enquanto ele segurava as lágrimas. Ele olhou para as mãos, brincando com seus anéis e esperando que o silêncio da mais velha acabasse.

– Querido, como era sua mãe? – A loira sorriu pequeno quando viu o rostinho espantado, mas percebeu que ele se acalmara um pouco ganhando um sorrisinho doce nos lábios. – Fisicamente e personalidade, por favor.

– Ahn...– Zhan pensou por alguns instantes, olhando para a parede e tentando reunir informações suficientes que recordara – Ela era alta, tinha olhos castanhos bem claros e cabelos pretos. Lembro de brincar de trança-los antes dos gêmeos nascerem. – O olhar bobo e longe deixou a mulher com um sentimento bom ao ver o paciente com lembranças boas. – Ela vivia fazendo piadas sem graça, mas que me faziam rir até chorar. Mas acho que o que mais eu lembro é a voz. Minha mãe cantava todas as manhãs e noites, tocando o piano da sala ou usando o violão. – Zhan deu uma leve gargalhada. – Eu chamava o piano de Sebastian e o violão de Gerard.  – Ambos sorriram para aquilo e aos poucos a risada deu lugar a um sorriso pequeno no Xiao. – Mamãe amava músicas francesas, lembro que pedi para ter aulas só pra poder cantar com ela e conversar também. 

– Pareciam se amar muito. – Zhan menenou a cabeça em concordância, mas logo o sorriso pequeno sumiu e um suspirar pesado saiu dos lábios bonitos. 

– Sabe, apesar de tudo fomos uma familia instável um dia. – Sobre o olhar curioso da loira o homem continuou. – Meus pais nunca se amaram, Tati, casaram por dever, mas por um tempo se respeitaram. Agiam como colegas de equipe, com o bônus de terem transado e me tido. – Um sorriso sem humor tomou a face pesarosa e o clima voltou a ficar tenso. – Ia tudo bem, até Kwan começar a beber e ficar obcecado pela boa imagem da família. Sabe, não posso culpar ele 100%. Até onde eu sei, meus avós não queriam nada menos do que a perfeição e eu nasci, eles viram a oportunidade de elevar o nome Xiao por mais uma geração. – O designer se reencostou no estofado da poltrona e pôs uma das mãos em uma posição que a psicóloga não pudesse ver seus olhos. – Eu lembro de uma briga específica, mamãe gritando alto e chorando na cozinha e eu, no balanço no quintal podia ouvir. Ela tinha descoberto a gravidez dos gêmeos, mas em momento algum se lembrava de terem transado. – O silêncio só não foi absoluto pelos soluços do mais novo, ele já nem ligava mais, chorava a plenos pulmões. Sentia o gosto amargo em sua boca com aquela lembrança e que na época era inocente demais para entender a atrocidade que ocorreu ali.

Tatiana se levantou, andando ate o bebedouro que havia ali e pôs a água em un copo plástico. Sentia as mãos tremer apenas ao imaginar tudo aquilo, Xiao Zhan era um caso mais complicado do que aparentava.

– Aqui, querido. Beba um pouco. – Ele nada disse, apenas aceitou a água e a tomou em goladas pequenas e lentas. Tomava como um passarinho em uma bica, de gota em gota. O olhar baixo e as pernas nervosas, assim como a respiração pesada faziam a mulher entender que ainda não havia acabado.

– Pouco tempo antes dos meninos nascerem eu entendi. Entendi que o "doce que fez a mamãe dormir" era algum remédio pra poder engravidar ela de novo. Eu odiei aquelas crianças antes mesmo de nascerem, odeiei por serem filhos dele assim como eu era. Depois dos gêmeos nasceram eu mal os olhava, não queria ficar nem no mesmo lugar. Foi assim até o dia do incêndio. – As lágrimas desciam sem parar pelas bochecas vermelhas, mas ele ja não parecia notar. Os olhos vermelhos e negros estavam fixos na janela, como se visse a cena se desenrolar. – Quando o fogo começou, mamãe e eu pegamos os gêmeos e saimos pela casa. Ali eu percebi que eles não só eram inocentes mas, eu tava agindo como meu pai. Eu ignorava quem eu deveria proteger. YuKang e GuoChang precisavam de mim e eu só sabia fazer birra e ser estúpido como ele. – Ele tomou mais alguns goles da água que agora estava morna. Gotinha por gotinha. – Depois de tudo aquilo, passei mais de um ano na cama. Quebrei muitos ossos e me queimei bastante, mas não o suficiente pra Kwan me deixar apenas pra me recuperar. Fiz tratamentos de pele, pus até um pino no joelho, qualquer coisa que me deixasse sem nenhuma aparência do fogo. Ele não me deixou fazer plástica porque os médicos diziam ser prejudicial a uma criança e ele não queria ficar mais mal falado do que ja estava. 

– Querido, como foi quando você e os meninos começaram a morar aqui? – A voz gentil e com soar materno fez o universitário se sentir menos incomodado. De fato Tatiana era boa no que fazia.

– Eu aluguei um apartamento pequeno na época. Tinha um emprego de garçom apenas para gastos extras, já que eu morava no dormitório da faculdade. Acho que ele tinha quatro cômodos no máximo. – Ele suspirou pesado pela vigema vez aquele dia, virando o copo d'água afim de terminá-lo. – Eu tive algum tempo pra procurar um emprego e alguns amigos ficavam de babá dos meninos. Me ajudavam a dar aulas pra eles também, já eu não tinha como pagar o colégio de duas crianças na época. Foram tempo difíceis. – O sorriso pequeno voltou ao rosto abatido, na medida em que o olhar perdido sumia as poucos. – Mas, um dos gestores fez uma recomendação a uma empresa de moda. Ela era pequena e precisava de designers para aprender o seu estilo, e eu fui o escolhido. Foi um milagre. Aprendi muito, meus chefes são ótimos e o salário era bom. Na medida em que a empresa crescia eu ganhei promoção, alguns clientes até me procuram para encomendar roupas exclusivas. 

– Ah, isso é ótimo! Não sabia que desenhava roupas também. – O sorriso voltou por completo ao Xiao, assim como as bochehcas vermelhas por embaraço. – Eu recebi uma proposta de vestido de noiva pela empresa, semana passada. A dona vai se casar e ela me pediu para fazer o vestido. Acho que chorei um pouco. – Ambos gargalhavam pela fala do adulto mais novo. – Tudo foi muito difícil, mas eu faria tudo de novo. Tenho um bom emprego, uma família estranha mas perfeita e a vontade de ter um futuro. É muito estranho, porque só comecei a ter uma vida depois dos 19.

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