Querido Diário

Sábado - 13 de setembro. - Madrugada

Era curiosa a forma que uma mente em frangalhos poderia funcionar. De certo modo, você sofre e se torna maculado como resultado de algo que não é sua culpa. Uma vítima sofrendo por ser vítima. Seja por pressão da sociedade em querer as crianças como os novos robôs de boa conduta e exemplo, ou um adulto que depois de sofrer durante a infância colhe silenciosamente os frutos de seus traumas, lutando para que ninguém descobrisse sua fraqueza.

Porque a família Xiao era perfeita, sem nenhuma fraqueza. Fraqueza eram para os imperfeitos e indignos e o sobrenome Xiao era mais que digno.

Eram mais de uma e meia da manhã e todas essas questões rondavam profundamente a mente do homem de madeixas azuis. O sono parecia não vir, mas sentia angústia pulsando em suas veias pela preocupação com o homem no quarto a frente do seu. A porta de madeira branca estava entre aberta, assim como a do dono do apartamento, pois Yoda não decidiu com quem queria dormir então que dormisse com os dois.

Yibo usava um conjunto de bermuda e uma blusa de tecido leve. A peça inferior era relativamente nova, pois era difícil uma roupa dada de presente caber de primeira na cintura fina de Xiao Zhan, então acabavam ficando em uma gaveta do quarto de hóspedes, prontas para serem doadas ou concertadas. Já a blusa não, ela pertencia ao dono do lugar. A prova era que o cheiro do amaciante se tornou impregnado junto ao cheiro do dono, dando uma união agradável porém não suficiente para que o Wang se tomasse por satisfeito.

Imerso em pensamentos, Yibo ouviu a porta no corredor sendo aberta. Esperando que Yoda passasse por ali e viesse deitar consigo, o azulado viu Xiao Zhan saindo de seu quarto. O rostinho amassado, cabelos desordenados e um grande camisão que claramente não lhe cabiam. Ele andou a passos curtos e silenciosos em direção ao que achou ser a sala, sumindo de seu campo de visão. O veterano nem chegou a perceber que estava acordado. Não demorando muito, a figura do cão negro se fez presente seguindo o dono temporário, tropessando nas próprias patas pelos sono. Foi impossível não soltar um risinho para o animalzinho sonolento, mas mesmo assim fiel.

Yibo esperou alguns bons minutos, pensando que Zhan podia ter ido ao banheiro ou tomar algo na cozinha. Mesmo que soubesse que os quartos tinham banheiro, assim como o seu. Dez, quinze, vinte minutos e o mais velho não fez menção em voltar, deixando o Wang levemente temeroso pela demora e estado emocional alheio.

Se remexendo sobre o colchão macio e retirando de si o cobertor felpudo e negro, o estudante de educação física saiu sorrateiramente do quarto em que estava. Viu que apenas a luz da cozinha estava acesa e sentiu o cheiro de doce, assim como uma melodia bonita cantarolada pelo veterano. Andou mais um pouco até o fim do corredor, vendo o animalzinho deitado no sofá, lutando contra o sono para permanecer ali com o Xiao. Yoda abanou o rabo para si, mas não fez barulho ou se moveu muito, parecia que estava feliz porque poderia dormir sem se sentir culpado.

Zhan estava preso em uma melodia de uma música pop americana qualquer. Cantarolava para de distrair e fazer seu chocolate quente, sempre tomando cuidado para não soar alto demais e acordar seu convidado. Mexia na xícara e no líquido que esquentava sobre o fogão dentro da leiteira, com muito cuidado para não emitir sons. Talvez muitos gatos estivessem com inveja de sua capacidade de ser sorrateiro.

Se virou afim de ver Yoda em seu sofá, mas acabou dando de cara com um Yibo o encarando encostado no balcão de seu cozinha. Sabendo que não podia gritar, o mais velho fez uma careta de susto e se pôs em uma pose engraçada como defesa. Coisa que fez o Wang segurar o riso.

- Misericórdia! Você é o quê!? Uma alma penada pra chegar desse jeito?! - Xiao se apoio na pia, olhando o outro de cima abaixo, tendo de se policiar com mais intensidade para não olhar os braços levemente definidos amostra pelo tecido fino. - Aí, credo!