A história não se apaga numa guerra

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"Agora arranje nossa casa", Seul me ordenou. Como eu não arranjaria? Com a guerra nós conseguimos riquezas, e herdamos todo o ouro e prata que o povo do mar possuía, então dividimos entre todos. O único privilégio que eu e meus irmãos tínhamos, era escolher a casa primeiro. Vigur e Volinüs escolheram as casas maiores perto da praça central, Vaanë preferiu se manter num local estratégico, num lugar elevado ao sul da praça, que dava visão privilegiada dos portões. Eu estava parada de frente a uma casa que descia a rua em direção ao mar Vaemerf, não havia casas ao redor, era uma região reservada, com um amplo jardim e uma passagem privada para a praia. A neve estava bem recuada da trilha até a entrada da casa, que se encontrava bastante conservada. Aquela tinha sido uma casa da família Vondelür, a principal. A casa de minha família ficaria com Veegan, eu tinha certeza, e era o certo a se fazer, eu nem me incomodava.

Eu sempre via essa casa no topo do morro, e nunca podia ver de perto porque havia guardas por toda a parte, e não permitiam que ninguém se aproximasse. Sempre quis ver de perto. E agora tinha a chance de finalmente fazer isso. Então Alinü saiu de dentro, e ao contrário de mim, não pareceu surpresa em me ver ali, assentindo na minha direção e parando pouco à frente da casa, sinalizando para que a seguisse.

—Eu estava começando a achar que não participou da guerra. — Comento, encontrando sangue nos seus trajes, mas nenhum ferimento grave.

—Não tive uma grande participação. — Disse sem qualquer vergonha. — Eu me defendi mais que ataquei. Não serei motivo de comemoração, sei disso.

—O que aconteceu? Nunca imaginaria que você não gostaria de batalhar.

Entramos na casa finalmente, e eu não me controlei em olhar ao redor. Havia móveis derrubados na correria que deveria ter sido durante a batalha, com sangue ainda espalhado no piso e nas paredes. Seguimos em silêncio, passando pelo grande salão principal com móveis bem feitos, com um lustre que brilhava.

—Eu não estava pronta. — Ela falou depois de muito tempo, quando virávamos para a esquerda, onde havia uma escadaria que levava ao segundo andar, que começamos a subir. — E eu não tinha motivos para lutar.

—Nem mesmo para possuir um lugar desses? — Sinalizo a casa, mas ela balança os ombros.

—Vivíamos num castelo. Depois passamos por várias casas grandes.

—Mas essa é uma casa especial. Pertenceu a família principal, aos Vondelür.

—E onde eles estão agora?

—Mortos. Então provavelmente nós assumiremos esse posto e elegeremos uma família secundária.

—Para que serve essa hierarquia de famílias? Não cria mais conflitos?

—Não. Nos respeitávamos acima de tudo. Ao menos, nunca soube de conflitos com essa motivação. — Faço uma pausa quando finalmente chegamos ao andar superior, onde havia várias portas escancaradas, quase que como um convite para explorarmos dentro, mas eu sabia que tudo tinha sido explorado em busca de riquezas escondidas. — A hierarquia servia para manter a população organizada. Para não haver guerras entre nós. A família principal dependia da segunda para manter sua influência e a paz, mas acima de tudo, para se manter. Não há primeiro lugar sem um segundo.

—Então viveríamos numa monarquia, como os cristãos. — Raciocinou, e eu movo a cabeça para concordar.

—Por que acha que não estava pronta?

—Acho que ainda tenho muito o que aprender. Eu vi a experiência dos meus tios durante a batalha, e soube que eu não estou à altura.

—Ainda. Mas é só questão de tempo. Eu manterei minha palavra. — Olho para ela, falando com firmeza.

O Destino de VönuOnde histórias criam vida. Descubra agora