Tomioka III

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Quando ele o viu novamente, mais de dois anos haviam passado.

A noite apenas começava, as lanternas do festival, deixavam tudo envolto em um brilho dourado. Ele apreciou o sabor do doce ao deslizar mais uma das bolinhas pelo palito, seus olhos varrendo preguiçosamente os transeuntes. Kocho o intimidou a um descanso, então, Kanroji o ofereceu os cupons de hospedagem ganhos por acaso, foi com bastante relutância, insistência e cutuções que ele, enfim, aceitou.

O que primeiro tomou sua atenção, foi a notável sensação de perigo. Mesmo que estivesse ali para um suposto descanso, ele realmente nunca pode baixar a guarda, não desde que havia tornado-se um Hashira, tantos anos antes. Era como uma segunda natureza, estar sempre atento aos arredores, pronto para agir.

O doce foi esquecido, sua mão deslizando reflexivamente para a lâmina que ele mantinha parcialmente escondida sob as vestes. Não seria sensato iniciar uma luta ali, no meio de tantas pessoas, onde poderia haver tantas vítimas. Primeiro ele devia identificar o oni escondido, segui-lo e garantir que o mesmo, não tivesse a oportunidade de ferir mais ninguém.

O curioso, é que ele não estava escondido, o reconhecimento foi imediato. Tomioka nunca pôde de fato esquece-lo, o primeiro encontro, foi marcante por si só. O fato da lua zero, estar despreocupadamente conversando com um enrugado ancião na barraca de pesca, em nada lhe surpreendente, aquele ser havia provado o quão insólito podia ser. O caçador havia pensando muito sobre isso, desde o seu comportamento conflitante com relação a sua natureza, como todo aquele dia nas montanhas, e o quanto pareceu com um delírio induzido pela semi hipotermia. Se ele tinha qualquer dúvida, entretanto, agora estavam parcialmente saciadas.

Da primeira vez, ele havia sido rápido em sacar a espada e atacar, como havia aprendido, o resultado não era um dos mais gratificantes. Os ferreiros tendiam a se tornarem bastante temperamentais quando as lâminas eram quebradas, danificadas ou perdidas. Por um tempo, ele foi cuidadoso em manter-se oculto entre os aldeões, atentamente observando a interação entre o velho e o oni, pronto para defender ao primeiro sinal de um ataque.

Com toda a algazarra ao seu redor, ouvir o que se discutia, foi uma tarefa falha. Em antecipação, Tomioka apreciou o momento em que o oni acenou alegremente para o velho e se virou, deslizando habilmente entre tantos corpos, em sua retirada. Felizmente, a presença de tantas pessoas, manteria a sua própria, oculta. Ainda sim, ele não ousou se aproximar em demasia.

Quando as ruas de terra batida deram lugar a grama e lama, Tomioka ponderou sua próxima ação. Cercado por árvores e não corpos, cada vez mais distante da cidade, um confronto entre eles não se estenderia a inocentes. Por outro lado, Ubuyashiki-sama, havia sido cuidadoso em alertá-los contra confrontos solitários, frente a luas superiores. Por um instante, Tomioka buscou pelo familiar corvo, pensado em enviar um chamado, contudo, na escuridão mais palpável, ele não o localizou em parte alguma.

Eles adentraram mais na floresta, foram apenas os tantos anos de prática que o impediu de tropeçar em raízes e romper galhos, denunciando sua posição. Zero parou em frente a entrada de uma caverna, a boca como um breu. O amanhecer ainda estava distante, não faria sentido que o mesmo já buscasse um refúgio.

- Vamos lá, saia, estou ansioso por uma conversa.- O súbito romper do silêncio o deixou tenso. As palavras ditas, fez seu sangue correr mais veloz, em preparação, certo de que, enfim, sua presença havia sido conhecida.- Oh! Você não sairá? Devo me convidar a entrar, então?- Seu tom era diferente daquele usado com o próprio Tomioka antes, ele parecia mais feroz. Agora que o caçador o observava com mais atenção, mesmo de costas, havia certa tensão na postura do demônio, ele passava um quê de raiva contida e ansiedade, talvez, ele nunca havia sido o melhor em identificar emoções e sentimentos.

Pronto para deixar seu esconderijo, Tomioka se deteve, quando outra figura emergiu da caverna. Não havia sido a ele a raiva direcionada, o real receptor, se mostrou como um oni, pequeno, azul, com olhos injetados de sangue e não havia qualquer kanji ali. Não uma lua, então. Mesmo que não fosse de seu feitio, ele estava curioso, o que poderia um oni tão poderoso querer com outro tão fraco? Enquanto pudesse, ele reuniria qualquer informação útil. Em certo momento, ele lembra de ler algo sobre conhecer seu inimigo. Bem, o caçador tentaria esse novo método, por enquanto.

Lágrimas Ininterruptas (Concluída)Onde histórias criam vida. Descubra agora