Capítulo 5

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Quando Filipe retornou à pousada nos arredores de Teldas, já era noite, viajava sob o disfarce de mascate e com isso possuía autorização para transitar pelo país sem problemas com a guarda das fronteiras.

O lugar onde estava hospedado era uma construção antiga, do tempo em que o povo tentava retornar a um modo de vida normal após as guerras. Toda em tábuas escuras, possuía dois andares, no térreo ficava o salão principal, onde era servido as refeições e ficava a cozinha. Nos fundos do terreno ficavam os aposentos dos donos do local. No segundo andar ficavam os quartos dos hóspedes e o banheiro, no fim de um longo corredor.

Filipe jogou sua mochila sobre a cadeira que havia próximo a janela e deitou-se de costas, cruzou as mãos atrás da cabeça e observou o teto do quarto. As luzes dos carros que passavam na rua projetavam sombras que desapareciam e apareciam de tempos em tempos na parede, teto e parede novamente.

Enquanto observava as mudanças nas sombras, tentava organizar suas emoções, sabia que precisava ser racional e que o ataque rebelde estava a poucos dias de ocorrer, mas queria salvar Selena, queria tirá-la do julgo de Marcus. Não entendia por que ela estava tão reticente. Será que com o passar dos anos, ela havia se apaixonado por ele? Será que sabia algo que a impedia de partir? De qualquer forma, ele precisaria convencê-la a fugir, pois se Marcus conseguisse escapar de alguma maneira, ele não a perdoaria. Afinal, era dever dela avisá-los, protegê-los contra os ataques rebeldes.

Depois de ruminar por horas as suas angústias, Filipe finalmente conseguiu dormir. Na manhã seguinte precisava viajar até a fronteira e atravessá-la para a cidade de Núbia, pois Alessandro já devia estar esperando com o carregamento e era necessário levá-lo em segurança até os arredores de Helvécia, onde o grupo de Hermínio estaria esperando.

Filipe viajava em uma motocicleta antiga, levava uma mochila nas costas e no bagageiro, algumas peças de bijuterias feitas com metal reciclado. Ao sair da cidade passou mais uma vez pelos postos de revista e seu crachá de comerciante itinerante liberou sua passagem.

__Pra onde está indo? – o guarda questionou.

__Vou a Nidara na fronteira com Núbia. – Filipe respondeu.

__Pretende vender suas tralhas por lá?

__Se Nur permitir, sim.

__Difícil imaginar aquele povo que vive parado no tempo se interessar por esse tipo de coisa! – o guarda revirou o conteúdo do bagageiro com desprezo.

__Mulher é igual em todo lugar. E graças a Nur, elas ainda gostam de se enfeitar. – com isso Filipe fechou o bagageiro e seguiu seu caminho.

As estradas até Núbia eram ladeadas por árvores de porte mediano a alto. Na grande guerra, essa região sofreu com grandes queimadas e toda a vegetação do sul do país tornou-se um vasto campo desolado, somente as árvores da cordilheira de Nidara haviam resistido. O povo voltou a plantar e tudo voltou a ficar verde. Mas na cordilheira havia imensos pinheiros renovados em magníficas cores, do verde claro ao intenso. Dizia-se que seus troncos ainda guardavam o enegrecido da queimada, mas resistiram ao cruel ataque dos inimigos de Ofir.

Assim que Filipe chegou a Núbia foi em direção ao litoral e o acampamento dos rebeldes confundia-se com os moradores da região. As barracas coloridas dos nubienses deixavam o local colorido e suas famílias, na maioria, catadores de caranguejos e pescadores, eram alegres e sempre sorridentes. Suas crianças andavam pelas ruas com brinquedos feitos de madeira e pedras coletadas nos rios que desciam das montanhas da cordilheira.

__Como foi a travessia? – Filipe perguntou a Alessandro logo que se sentou a mesa em sua barraca no coração do acampamento.

__Tranquila. Você sabe, a cordilheira possui muitas trilhas e cavernas. O Governo nem tem ideia do que passa por essas estradas. E as novidades de Teldas?

__Eu fiquei sabendo que em Teldas, no dia do ataque estará acontecendo uma festa. A filha do Governador Marcus estará completando dezesseis anos e seus pais oferecerão um grande baile na sede do governo.

__Isso é ótimo! Podemos acabar com toda a corja de uma única vez. O que acha de bombas? – Hermínio disse entusiasmado.

__Não matamos crianças, Hermínio. A festa estará cheia de adolescentes inocentes. – Filipe falou lembrando-se do que Selena dissera, ao contrário do que ela pensava, ele não havia se tornado cruel, jamais faria mal a crianças. __Nós esperaremos Marcus deixar a festa. E só então o abordaremos, não é necessário que inocentes sofram. – Hermínio se calou e ouviu a repreensão.

__Em Helvécia será mais difícil. – comentou Alessandro para quebrar a tensão __Com certeza o Governador geral...

__Acredito que ele estará em Teldas também, me parece que o filho de Marcus trabalha para o Governador Geral e além disso, são amigos; por isso tenho certeza que será convidado para a festa da menina.

__E você já alertou o comando em Lissandra? Eles sabem que o Alexander não estará na sede do governo?

__Sim. Enviei um mensageiro ontem mesmo. Mas ainda assim, seguiremos até o Prédio do Governo e dominaremos a sede e de lá convocaremos o povo.

__Acredita que Alexander abdicará do governo pacificamente?

__Me preocupo mais com Marcus, ele sim lutará com unhas e dentes. Sei que sua intenção é chegar ao Governo Geral.

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