Capítulo 1

31 4 7
                                    


Era uma noite fria de outono e um grupo de pessoas, vestidas com roupas escuras, capuzes e máscaras sobre o rosto, caminhavam na escuridão da noite. Ao longe era possível ver as curvas da cobertura de um dos armazéns do Estado, eles estavam repletos de alimentos e estavam sendo vigiados por poucos guardas. O grupo aproximou-se sorrateiro e rendeu os vigilantes. __ Vamos, levem tudo que puderem carregar! _ dizia o líder do grupo, um jovem ruivo de olhos escuros. Com voz forte incentivava seu pequeno exército de maltrapilhos. __ Vamos, vamos! Sem barulho! - Filipe, guiava seus amigos em mais uma busca por comida. Desde que o frio havia começado, não era possível cultivar nada fora das estufas e o povo ficou a mercê do Governador Geral e da Igreja. Apenas uma minoria da população ousou se rebelar, então, perseguidos pelo governo, eles refugiaram-se nas planícies quase congeladas ao norte.

Naquela mesma semana, em um lugar distante dali, Selena caminhou até a varanda de sua casa que ficava na encosta de um penhasco, rodeada por árvores e isolada da cidade. Vista tão pequena e aparentemente indefesa, a cidade de Teldas era a sede do governo do Setor cinco ou o estado de Miranda, que era governado por Marcus, o amante e dono de Selena.

Apoiando-se na grade de proteção, Selena sorveu o ar frio da noite. O vento fez seus longos cabelos loiros dançarem e sua silhueta esguia era marcada contra o tecido de seu vestido. De olhos fechados, ela sorriu, sentiu uma presença que há muito não sentia. "Quando foi a última vez?" - pensou ela- "Quase dois anos! Estou feliz por estar de volta, mas será que fiz a escolha certa?"

Sons vindos de dentro da casa a fizeram despertar de suas lembranças. Ela voltou-se para o interior da sala, fechando as portas de vidro que a separavam da varanda, porém com o cuidado de deixar uma pequena abertura.

Na sala de estar sua visita a aguardava.

__ Governador! – ela abaixou-se numa pequena reverência __O que o traz aqui hoje? Posso servi-lo de alguma forma?

__ Sim, obrigado! - Ele sentou-se em uma poltrona e recostou-se. Um homem alto, cabelos já ficando grisalho, olhar de um azul acinzentado, astutos como os de um felino. "Mesmo depois de tanto tempo, sempre as formalidades, ela nunca sentirá amor por mim" - ele pensou.

__O que vai querer? - Selena perguntou por cortesia. Sabia exatamente o que o governador Marcus gostava de beber. Nos últimos anos, sua presença constante ao seu lado lhe deu tempo para estudá-lo, seus desejos, seu modo de pensar, de agir. Por isso estava trêmula ao servir a bebida no copo.

__ Você já sabe, minha querida! - Ele cruzou as pernas e a observou. __ Está trêmula! O que a aflige?

__ É só o frio. Está mais frio a cada dia – Ela lhe entregou o copo e sentou-se a sua frente, entrelaçou os dedos das mãos e as apoiou sobre os joelhos. Temia que elas a denunciassem, estavam trêmulas. Seu rosto vermelho fazia seus olhos azuis mais brilhantes. Sentiu a presença anterior mais forte e voltou a olhar a varanda.

__ O que foi? - O Governador se levantou e olhou em direção as vidraças __ Algo errado?

__ Não! – ela respondeu muito alto e rápido demais, então mudou o tom da voz e disse __ Eu estou com frio, vou fechar a porta, ela ainda está aberta. - Selena caminhou rápido até as portas de vidro e as fechou __ Você ainda não disse o que veio fazer aqui? Ainda não se passou nem quinze dias, me disse que só voltaríamos a nos ver depois do jantar em homenagem ao Bispo Walfredo. - ela o interrogou voltando a se sentar.

__ Achei que você soubesse. Afinal, não pode prever os acontecimentos antes que eles ocorram?

__ ... - Selena não respondeu, mas realmente ela sabia o motivo.

A promessaOnde histórias criam vida. Descubra agora