27 | SOU INOCENTE PARA AQUELES QUE IMPORTAM

107 16 296
                                    


E eles irão te consumir até seu interior. Sim, até que você não consiga nem mais rastejar. — Kaleo (Way Down We Go).


Ops! Esta imagem não segue nossas diretrizes de conteúdo. Para continuar a publicação, tente removê-la ou carregar outra.


Para muitas pessoas aquele dia era perfeito. O clima estava agradável e estimulava as famílias a passearem pelos arredores da cidade, como se tudo levasse a crer que nada de ruim ou injusto pudesse acontecer. Os pássaros cantavam, alegres, e as flores pareciam ainda mais coloridas e vivas.

Mas para alguém em particular, a vida soava um pouco mais cinzenta.

Era o dia da audiência. O destino de Arthur seria selado a partir da decisão de terceiros.

— Você já está arrumado, Arthur? — Silvia perguntou pela décima vez ao neto, pois estava nervosa.

De forma exagerada, ela conferiu a gravata do ruivo e a alinhou. Era possível visualizar as mãos trêmulas da mulher e, tentando confortá-la, o ruivo as segurou, forçando-a a olhá-lo e, em seguida, com um sorriso travesso, tentou amenizar o clima:

— Será que pego prisão perpétua se a minha gravata estiver um pouco torta?

Ao escutá-lo, a executiva replicou:

— Eles eu não sei, mas eu te deixo mais machucado do que você estava se você inventar de ser preso, Sr. Arthur Ferraz! Nem pense nisso! Você não pode... não pode...

Todos os presentes no quarto se assustaram ao vê-la estremecer e seus olhos embargarem, pois a idosa sempre conseguia se controlar. Mas, daquela vez, era diferente. Quem estava em risco era o neto que ajudou a criar e deu amor. Aquele menino era como um filho.

Lembrou-se das vezes que o assistiu chorar até dormir devido aos pesadelos, ainda pequeno, e ela se deitava ao lado dele para consolá-lo, aquecendo-o sob sua proteção. Das vezes em que saiu no meio de seu trabalho, ou até mesmo de reuniões importantes, pois a diretora havia ligado para ela no intuito de avisar de brigas no colégio. Das vezes em que cuidava de seus machucados.

A memória lhe trouxe a cena de um ruivinho arteiro escondendo um gato de rua no banheiro de seu quarto, com receio de que sua avó mandasse o animal embora. Ela observava o garotinho surrupiar parte de suas refeições em sua camisa para levar ao bichano. Nessa época, porém, Silvia concordou com a adoção desde que pudessem nomeá-lo juntos. Escolheram Frajola por causa da pelagem escura, semelhante ao gato do desenho animado que assistiam nas tardes preguiçosas de sábado.

— Vó, agora que temos o Frajola... — o menininho iniciou enquanto acariciava o corpo esguio do gato. O animal estava confortável entre seu dono e a executiva, com a cabeça descansando sobre as patinhas da frente e o rabo se balançando vagarosamente. Estavam no quarto de Silvia. — Podemos adotar um passarinho e chamá-lo de Piu Piu, o que acha?

O amor que deixamos para trásOnde histórias criam vida. Descubra agora