Sally é uma interiorana acostumada com o cotidiano pacato e humilde. Apesar de aparentar força, sofre devido à partida de seu melhor amigo de infância, Luís Miguel, com quem costumava caçar sapos e compartilhar as cerejas que roubava do vizinho.
...
Todo mundo pensa que você é alguém que não é. Até mesmo você se convenceu disso. — Haille Steinfeld (Wrong Direction).
Ops! Esta imagem não segue nossas diretrizes de conteúdo. Para continuar a publicação, tente removê-la ou carregar outra.
Sally se lembrou das gargalhadas que dava quando criança. Em todas, reconhecia por de trás delas a risada de seu melhor amigo. Sempre estavam juntos. Em momentos felizes. Infelizes. No tédio. Nas travessuras.
Esse é Luís Miguel, o som agudo e estridente das palavras da loira repercutia incessantemente em sua cabeça, como em um surto de reconhecimento. Meu noivo.
Arthur notou Ally lacrimejar. Ele também testemunhava a incompreensão no semblante dela dar lugar a raiva. Ao ódio. A tristeza. A decepção.
Luís Miguel, de forma inconsciente e repentina, ajoelhou-se de frente à menina de sua infância, tocou-a nas mãos e depois segurou-a pela mandíbula para que pudesse encará-lo. Sally tentou virar o rosto, reprimindo as próprias lágrimas, mas a insistência e desespero do rapaz venceram.
Eles se miraram. Tão quebrados. Tão surpresos. Tão frágeis. Miguel também sentia seus olhos marejados. Talvez, mais uma vez, chorasse por perdê-la. Mal a havia encontrado e corria o risco de vê-la escapulir entre seus dedos.
Dessa vez, porém, não poderia culpar seu pai. Nem mesmo o irmão.
— Sally, eu — ele insistiu, embora doesse mirá-la naquele estado —, eu sinto muito. As coisas aconteceram muito rápido. Não era para ser assim. Eu queria te contar. — Inconformado e aflito, pressionou as próprias têmporas. — Porra, por que não notei logo que era você? A minha cereja... A garota por quem passei anos esperando. Ansiando reencontrar. Implorando para que estivesse bem e... feliz.
Todas as memórias atingiram a jovem de forma intensa, aterrando-a em seus próprios devaneios. O passado parecia ter o poder de aprisioná-la em uma versão idealizada de duas pessoas que, querendo ou não, não se conheciam mais.
Sentindo-se usada e traída, a versão real de Luís Miguel a fazia chorar. Fazia com que ela se sentisse quebrada e... insuficiente.
— Você sabia que era eu e mesmo assim não disse nada? Isso é um jogo para você, Luís Miguel? — Ela o encarou, trêmula. Sua íris, antes tão vulnerável, adquiria uma neblina repleta de fúria. Ergueu-se da mesa abruptamente, em consequência, sua cadeira caiu, ressoando em um violento estrondo. Todos se assustaram.
— Cereja... — Luís se levantou em reflexo, aproximando-se dela.
— Você não tem permissão de me chamar de cereja mais! Não tem! Você não tem o direito — sua fala foi cortada por um soluço agudo — de me machucar. O fato de eu, um dia, ter te amado mais do que tudo no mundo, não te dá passe livre para voltar a minha vida. Só... — De repente, notou a atenção das pessoas em si e, por isso, finalizou: — só me deixe em paz.