Capítulo 17

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Sherlock não soube o que responder. Sentia sua respiração acelerando. O jovem queria dizer algo para acalmar o outro, mas a palavra "assassino" ficava sendo repetida em sua mente. Sherlock era um detetive, e ele sabia que um dia resolveria um caso sério, no qual ajudaria a polícia a prender um assassino. E lá estava John Watson, a pessoa que o moreno mais gostava, dizendo ser um criminoso.

- Isso não é verdade. - disse o jovem, quase num sussurro.

Mas Watson apenas balançou a cabeça e disse, com raiva:

-Eu matei pessoas, Sherlock. Eu fiz uma promessa de proteger vidas quando me formei em medicina, mas o que eu fiz foi exatamente o oposto. Desde então, tudo mudou. Pessoas não são mais pacientes, e sim potenciais riscos. Por isso eu ataquei seu irmão. Porque eu sou uma arma, um monstro, um assassino. 

Assim que terminou de falar, John retirou suas mãos da de Sherlock e pressionou seu ombro, local onde o moreno vira uma cicatriz no primeiro dia do hóspede na casa.

- Você foi atingido, né? Por isso pode voltar para Londres. - deduziu Sherlock.

John apenas assentiu. Ele continuava pressionando seu ombro e encarava o chão, com um olhar vazio.

De repente, muitas coisas fizeram sentido na cabeça do moreno. A reação brusca dele com a entrada do Mycroft. A dificuldade do hóspede em se adaptar a vida antiga. Tudo isso estava acontecendo porque Watson não era apenas um médico militar, ele era também um soldado. E, aparentemente, não havia voltado para Londres apenas com sua bagagem, voltara também repleto de traumas e arrependimentos.

- Você não é um monstro. A culpa não foi sua. Você foi como um médico, eles não deveriam ter feito você passar por isso. - disse Sherlock, interrompendo o silêncio.

John não respondeu, apenas continuou balançando a cabeça, como se não acreditasse em nada que o outro dissesse.

-Não importa o que tenha acontecido, eu não tenho medo de você. Na verdade, é o oposto. Perto de você, eu me sinto seguro de uma maneira que nunca senti antes. Eu confio em você. Você é uma das melhores pessoas que eu já conheci.- continuou o moreno, sem tentar esconder a emoção em sua voz.

Watson o olhou, incrédulo.

- Por que? - perguntou o loiro.

-Por que o que?

-Por que você confia tanto em mim? Depois de tudo o que eu contei...

-Porque mesmo depois de conviver comigo por alguns dias, você continua me mantendo por perto. Você não se importa que eu seja um esquisito que criou a própria profissão e não tem amigos ou vida social. Mesmo sabendo tudo isso, você continuou sendo extremamente amigável comigo.

- Você não pode fazer essa comparação. Você ser antissocial não significa que eu não tenha motivos para ser amigável. Mas as coisas que eu fiz...

- Não me importo. - disse, dando de ombros.

-Mas deveria. - insistiu o loiro.

-Bom, talvez, mas eu realmente não me importo. E talvez isso seja mais uma prova que eu seja um sociopata, um esquisito ou aberração, mas eu não me importo, porque durante toda a minha vida eu sempre odiei pessoas, mas eu não odeio você. E isso incluiu o pacote completo. Eu não odeio você, da mesma maneira que não odeio seus defeitos e o seu passado.

Watson demorou a responder, apenas ficou fitando o moreno, sem acreditar nas palavras que ele disse. Mesmo conhecendo o outro há poucos dias, ele sabia que falar sobre sentimentos era algo difícil para o jovem. Por isso, sabia que aquele "eu não odeio você" poderia muito bem significar algo maior.

- Sherlock Holmes, você é um anjo. - disse John, com um sorriso triste no rosto.

Aquelas palavras atingiram o jovem em cheio. O moreno não soube o que responder, então se aproximou do outro e deu um beijo em sua bochecha, de forma amorosa. Watson deu um suspiro quando sentiu o contato quente dos lábios do outro em sua pele, mesmo que apenas por um segundo.

Eles ficaram em silêncio mais uma vez, como se esperassem que o outro tomasse uma atitude. Sherlock conseguia ouvir seu coração de tão forte que batia. Sentia medo de ter exagerado com o beijo, mas o sorriso no lábio do hóspede indicava que ele não havia nada a temer. E por mais que aquele contato tinha sido incrível, o moreno percebeu que não queria parar dessa maneira.

-Festas do pijama costumam ser tão dramáticas assim? - perguntou o jovem, sorrindo.

John riu, e o som daquela risada acalmou Sherlock. Ver seu hóspede feliz o alegrava também.

-Geralmente não. Prometo que a próxima não vai ser assim.

-Próxima? - perguntou Sherlock, com um sorriso malicioso.

-Er, bem... eu não sei quantos dias seu irmão vai ficar aqui... a não ser que você queira me expulsar do quarto... - respondeu Watson, nervoso.

-Eu não quero te expulsar. Nunca. - disse Sherlock, sorrindo.

John sorriu também ao perceber o duplo sentindo da fala do outro. Sherlock realmente não tinha medo dele, nem do seu passado. O hóspede percebeu que ele realmente era bem vindo ali, e ouvir aquilo de Sherlock tornava tudo muito melhor.

-Acho melhor irmos dormir. - disse o loiro.

Sherlock assentiu, tentando esconder sua decepção. Mas ele sabia que John havia tocado em um assunto muito pessoal, e não queria pressionar. Além disso, a relação dos dois tinha avançado naquela noite, seja lá qual tipo de relação eles tinham no momento.

John deu boa noite e deitou em seu colchão, e ficou acordado por um tempo, refletindo. Mesmo depois do que ele havia contado, Sherlock continuava ao seu lado, de forma literal e metafórica. Apesar da dor das lembranças da guerra que estavam em sua mente, o hóspede dormiu em paz pela primeira vez em muito tempo.

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