Capítulo 7

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Alguns minutos mais tarde, uma batida na porta despertou Sherlock de seus pensamentos.

-Estou ocupado. - respondeu, irritado.

-Quando não estiver, poderíamos conversar? - perguntou John.

Sherlock não respondeu, e ouviu o som de passos se afastando da porta. O moreno ficou andando de um lado para o outro, e quando percebeu, já tinha saído do quarto e estava batendo na porta do hóspede. Antes que pudesse voltar correndo para seu quarto, John abriu a porta, o convidando a entrar. O moreno relutou um pouco, mas seu corpo o havia levado até ali de forma involuntária, então era melhor obedecer.

-O que você quer falar? - perguntou, fazendo questão de dizer com um tom de voz irritado.

-Eu sinto muito. E você tem razão, eu era um idiota na faculdade. E no ensino médio. Eu fui o clássico garoto do time de futebol que namorava líderes de torcida e zoava os outros. Eu me arrependo de muitas coisas na vida, e essa é uma dessas coisas.

Sherlock não disse nada, incentivando John a continuar:

-E eu deveria ter imaginado que você não gostaria da minha história. Primeiro, porque foi errado, e segundo porque... bem, não fique chateado, mas seus pais me contaram um pouco sobre você e sobre sua experiência no ensino médio.

O moreno encarou o chão. O ensino médio tinha sido horrível. Todos os dias ele sofria na mão dos outros alunos, que o machucavam e o chamavam de aberração. Por mais que dissesse que não se importasse, aquilo doía muito.

-É... não foi muito legal. - admitiu, dando de ombros.

-Eu quero que você saiba que não sou mais esse cara. Eu não sou como aqueles que te machucaram na escola. Podemos ser amigos.

Sherlock percebeu que estava mordendo o lábio. Algo nas coisas que John havia dito ainda o incomodava, mas ele não sabia o que era.

-E como eu sei que você não vai me empurrar ou jogar minhas coisas na privada, como acontecia na escola? - perguntou.

-Primeiro, porque eu cresci, tenho 28 anos já.

-Tem gente com essa idade que ainda faz isso, ou coisas ainda piores. 

-Certo, verdade. Bom... eu acho que... - gaguejou, nervoso.

Sherlock percebeu que John estava prestes a tocar em algum assunto delicado e pessoal.

-Eu fui para o Afeganistão apenas dois anos depois de me formar. Eu ainda era meio idiota, sabe? Eu não zoava mais pessoas que gostavam de robótica, mas acho que eu era um pouco mesquinho. Tinha muitas namoradas, não conseguia manter um relacionamento sério, fazia piadas idiotas quando ia para os pubs com meus amigos, até que...

John mudava constantemente o peso do corpo, nervoso.

-Até que eu fui para o Afeganistão e vi coisas... Eu repensei sobre a minha vida, meu passado, minha família. Agora eu só quero recomeçar e ser feliz. Se eu merecer, é claro.

-Todos merecem ser felizes, até idiotas como você.

John riu, e o clima pesado no quarto se desfez. Ainda havia muita tristeza nos olhos de Watson, mas havia alívio também.

-Podemos tentar ser amigos então? Ia ser muito importante para mim. - disse o loiro.

-Se meus pais contaram sobre minha experiência de ensino médio, você sabe que eu não tenho amigos.

-Posso tentar ser uma exceção? - perguntou, sorriso.

-Se você gosta de um desafio, então sim. - disse, dando de ombros.

-Bom, eu me alistei para ir no Afeganistão, então acho que posso dizer que gosto de desafios.

Os dois gargalharam, e Sherlock nunca se sentira tão pleno como naquele momento. Rir com John Watson parecia muito mais certo do que brigar com ele. Quando os dois pararam de rir, um silêncio constrangedor tomou conta do ambiente.

-Desculpa por ter ficado chateado, talvez tenha sido um pouco infantil... e eu te fiz falar sobre o passado, e sei que você não gosta... - disse Sherlock, sem graça.

-Ei, está tudo bem. Da mesa maneira que eu não preciso me desculpar por tudo, você também não precisa, combinado?

Sherlock assentiu, sorrindo.

-E sobre meu passado... as vezes as pessoas gostam de conversar sobre essas coisas com os amigos, então quem sabe? - disse, sorrindo.

Sherlock forçou um sorriso e concordou mais uma vez. O moreno se despediu e depois se trancou em seu quarto. De repente, desejava que seus pais chegassem logo em casa para que não tivesse mais que ficar sozinho com John. Muita coisa tinha acontecido, e esse era apenas o segundo dia do hóspede. O que mais poderia acontecer durante sua estadia na casa Holmes?

O jovem se jogou em sua cama e tentou colocar seus sentimentos e pensamentos em ordem. Ele não deveria ter ficado tão chateado com a história do outro. Ser detetive significava ser objetivo. Ele não deveria ser afeto pelas pessoas envolvidas no caso. Mas saber que John era como os idiotas que atormentaram sua vivência no colégio o tinha machucado.

Outra coisa que havia doído foi a constante menção do loiro a suas namoradas. Namoradas. Sempre no feminino. Sherlock se sentiu um idiota por pensar nisso. Ele havia conhecido John ontem. Nada disso deveria importar. Mas a insistência do outro em dizer que eles seriam amigos... essa palavra nunca fora tão irritante para o jovem.

O moreno, como sempre fazia quando estava perdido em um caso, pegou o computador e começou a fazer uma busca na internet, tentando descobrir o que ele estava passando. De acordo com várias páginas do Google, a resposta era que Sherlock tinha se chateado porque gostava do hóspede. De acordo com fóruns de relacionamento, descobrir fatos do passado e sobre relacionamentos antigos poderia ocasionar brigas entre namorados. E em outros fóruns, Sherlock leu sobre relatos de pessoas reclamando sobre se apaixonarem por heterossexuais e a impossibilidade de qualquer relacionamento.

O jovem riu com desdém e afastou o computador. Sherlock não gostava de pessoas, principalmente dessa maneira. Ele não tinha esse tipo de sentimento. Seu ataque de raiva tinha sido completamente irracional. Prometeu a si mesmo que iria se controlar, e a partir daquele momento, John Watson seria apenas um objeto do caso, e nada mais.

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