Capítulo 11

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Aviso de gatilho: menção à suicídio

Ele apertava forte em sua mão enquanto o caixão era tampando aos poucos pela terra molhada. Os pingos de chuva faziam um barulho alto contra o tecido de nylon preto do guarda-chuva. O enterro foi feito de manhã com o intuito de evitar a chuva, mas ela fez questão de achar a tristeza e fazer o dia ainda pior.

Era a manhã seguinte do dia que ele recebeu a notícia. O caminho da volta foi silencioso e agonizante. Suna não disse apenas uma palavra sobre o assunto, ele apenas saiu do carro, ficou um tempo encarando a rodovia e voltou.

— Pode dirigir?

Foi a única coisa que disse.

Você só conseguiu assentir e pular para o banco do motorista. Então ele entrou no carro e não disse mais nada, o resto do dia, até essa manhã. Você não o viu chorando, nem uma lágrima sequer, perguntou algumas vezes se estava tudo bem ou se ele precisava de alguma coisa, tudo o que ele fazia era dar um pequeno sorriso dolorido e balançar a cabeça.

Suna conheceu dor a vida toda, desde pouca idade. A falta de amor e violência constante do pai. O relacionamento abusivo que o perseguiu por anos. A negligência da mãe. O abuso de drogas e ter que lutar contra a vontade todos os dias desde o momento em que acorda. Quando ele te afastou. Suna conhecia todas as formas de dor, desde corações partidos até as mais difíceis como a rejeição de uma figura paterna. Ele estava acostumado.

Ninguém vive de verdade sem a dor, é crucial, para o aprendizado, para se tornar uma pessoa melhor, mais forte. Mas Suna era acostumado com ela.

Dores na alma não são como uma simples enxaqueca ou uma dor nas costas. Dores na alma não passam.

Mas ninguém merece viver com a alma dolorida. É lógico que seres humanos sempre carregarão dores consigo, a vida nunca vai ser cor-de-rosa, recheada de felicidade, cada pessoa existente carrega alguma mágoa consigo, mas os momentos felizes compensam. Sabem que podem estar machucados em um dia e uma semana depois poderiam já estar bem, dando risadas e fazendo mais memórias felizes.

Não Suna.

Ele tinha a felicidade dele, que era você. O único motivo verdadeiro dele conseguir aguentar todas as dores na alma. Também tinha a mãe, ela nunca foi lá a melhor de todas, sempre fechava demais os olhos e tapava os ouvidos, mas ele sabia que era amado por ela e ele também a amava.

Mas ele não conseguia se ver feliz daqui a um tempo. Ele só conseguia se ver feliz chapado. Não tinha orgulho disso, mas era a verdade, ele querendo ou não. A alma pesava tanto pelas tristezas, arrependimentos e angústias que ele não se enxergava feliz daqui uma semana, um mês ou muito menos dez anos.

Desde que se entendia por gente sabia que o próximo dia não seria melhor que o anterior e continuava com esse pensamento até hoje, nada o mudaria.

— Vamos embora? – você disse docemente, o tirando o abismo dos próprios pensamentos. Ele gostava da sua voz, era gentil, quase tão boa quanto um dos comprimidos.

Ah, merda. Ele estava pensando demais nisso. Pensamentos intrusivos que o faziam cair na tentação eram infernais, eles simplesmente apareciam ali, a qualquer momento do dia, mesmo que ele não quisesse.

— Por favor. – disse baixo, você se surpreendeu dele ter respondido em palavras.

Então você dirigiu para casa dele, havia algumas roupas suas em uma mochila e ficaria por lá alguns dias. Assim que chegaram, tomaram um banho e colocaram algumas roupas mais confortáveis, se livrando daquela roupa social preta com cheiro de funeral e cemitério.

— Você pode conversar comigo, Rin... Então fala, por favor,. – pediu cuidadosamente, se sentando ao lado dele na cama.

— Não tenho o que falar. – ele soltou um suspiro triste. – Isso fodeu com tudo. – ele te encarou, com os olhos brilhantes pelas lágrimas.

— Vai ficar tudo bem. – você sorriu de lado, limpando com o polegar a lágrima que escorreu. – Eu vou ficar aqui com você pelo tempo que precisar, ok?

— Não vai, [Nome]. – ele se sentou, encarando as próprias mãos no colo. – Ela se matou... Meu pai ia deixar ela e ela se matou... Por overdose, não é engraçado? – riu sem ânimo, balançando a cabeça. – Depois de tanto tempo tentando ficar limpo pra não acabar assim, minha mãe faz a mesma coisa. – escondeu o rosto nas palmas das mãos, você colocou a mão em suas costas a acariciando. – Fodeu com tudo.

Você o abraçou apertado. Suna escondeu o rosto na curvatura do seu pescoço, você apenas conseguia sentir sua respiração pesada na pele. Sua mão pairou sobre os fios castanhos, fazendo um carinho por eles. Vê-lo desse jeito te doía, mais ainda por saber que não tinha nada a ser feito. Suna teria que sentir cada fragmento da dor e a única coisa possível para você fazer era dar apoio.

Esperava que isso fosse o suficiente.

Ele ficou por muito tempo ali. Você até chegou a se perguntar se ele tinha dormido (suas pernas já, pelo menos), mas ele se mexia vez ou outra, se estivesse dormindo mesmo, não se mexeria, Suna dormia como pedra. Quando ele finalmente se afastou, pareceu não ter coragem de olhar nos seus olhos, só se levantou e foi ao banheiro, fechando a porta.

Um suspiro pesado saiu dos seus lábios, colocou as pernas para fora da cama com dificuldade, sentindo-as formigarem sem parar, era uma sensação desconfortável. Você ainda tentava mexer as pernas quando Suna saiu do banheiro, ele parecia cansado.

— Quer comer alguma coisa? – você perguntou, colocando um sorriso no rosto.

— Pede alguma coisa daquele restaurante chinês. – você assentiu. A voz dele estava tão cansada, parecia outra pessoa. – Pode ficar no sofá comigo? – pediu quase em um murmuro.

Você não disse nada, apenas sorriu, se levantando um pouco devagar, o formigamento já havia passado. Foi até ele, pegando gentilmente em seu braço, andando até o sofá. Você se sentou e ele se deitou no seu colo, puxando o cobertor. Ele tinha o rosto virado para TV, então você apenas conseguia ver seu rosto de lado. Traçava linhas imaginárias pela bochecha lisa, como uma forma simples de carinho.

— Você vai me perdoar por todas as coisas que eu talvez faça daqui pra frente? – ele perguntou com a voz rouca.

— O que quer dizer? – engoliu seco.

— Acho que... Deixa pra lá.

𝐀𝐋𝐖𝐀𝐘𝐒 𝐈𝐍 𝐘𝐎𝐔𝐑 𝐇𝐄𝐀𝐑𝐓, suna rintarouOnde histórias criam vida. Descubra agora