Capítulo 02

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Vale de Mion

Existem momentos em que a seriedade é a única coisa capaz de te manter vivo; de te manter respirando e, para Daniel, a vida era cheia desses momentos. Havia se tornado comum ao Guardião da Morte, herdeiro de Sina, ver situações de perigo em qualquer lugar e em qualquer momento. Porém, ele era um jovem, a pouco deixara a adolescência, ainda que nunca tivesse tido a jovialidade infantil cultivada em sua vida. E, naquele Vale perdido no meio do limbo, ele havia esquecido de se manter sério e frio, preferindo dar chance às risadas e as brincadeiras de forma que apenas seus melhores amigos (sua família) conseguiam despertar naquela alma escurecida pelo passado.

Thomás abriu um imenso sorriso maligno ao rodeá-lo, segurando atrás de suas costas a arma mais mortal que encontrara. Daniel levantou uma sobrancelha em desafio, segurava a própria arma, pronto para retalhar.

— FOGO! — Eles ouviram a voz de Cassie, a qual estava encostada em uma árvore a uma distância segura. Tentava com todas as forças esquecer tudo o que estava acontecendo e tudo que já acontecera. Precisava do doce remédio das risadas.

Tom soltou um grito de guerra, abaixando-se e lançando primeiro. Uma enorme e grudenta bola de lama passou a centímetros do rosto de Daniel, o qual apenas não foi atingido por sua agilidade. Dan foi o próximo a atacar, aproveitando-se da excitação do amigo para abrir um sorriso maligno e lançar sua bola. O tiro foi certeiro e agora Tom estava, dramaticamente, jogado no chão com um montinho de lama na testa.

— NÃO ME RENDEREI TÃO FACILMENTE, REI SOMBRIO! — Ele gritou, praticamente voando para a poça de lama e se munindo da maior quantidade de bolas que conseguisse juntar.

— Rei Sombrio? — Eles ouviram a voz de Rose ao sair da casa ovo, acompanhada por Maria.

Dametra sumira novamente.

— Você não ouviu isso. — Daniel disse ao passar por ela, saindo correndo quando uma saraivada de bolas de lama em chamas foi lançada em sua direção. — NÃO ME VENCERÁ, REI FOGARÉU!

Daniel desapareceu em uma nuvem de sombras, reaparecendo novamente logo atrás de Tom, o qual resmungava indignado ao procurar o oponente por todos os lados, mas, ainda assim, foi surpreendido ao ser empurrado na poça de lama, mas fez questão de arrastar Daniel com ele.

— Ok, já chega. — Eles ouviram uma voz infantil soar a alguns metros. Vestia roupas de treino e uma espada balançava na bainha em sua cintura, contrastando com o tamanho diminuto da forma que assumira aquele dia. — Vocês dois, fora da minha área de treino. Rosalind, dentro.

Rose se aproximou dela como se caminhasse para o próprio túmulo, passando os olhos da espada para o rosto imaturo da Tecelã e para a espada novamente.

— Antes de começarmos o treino, quero ter uma noção do que é capaz em uma luta sem poderes.

— Por quê? — Rose cometeu o erro de perguntar.

Dametra a olhou com os olhos cerrados, sacando a espada.

— Porque não estou interessada em ter sua morte na minha consciência.

Os outros assistiam tudo a alguns metros, divididos em achar graça ou se preocuparem quando a oráculo atacou Rose, a qual se lançou ao chão e para o lado um milésimo de segundo antes de ter o pescoço cortado pela arma afiada da oponente. Em instantes Justitia estava em sua mão, produzindo faíscas todas as vezes que uma lâmina batia na outra.

Daniel e Maria provavelmente eram os únicos ali que tinham um treinamento suficientemente completo. Ambos, moradores de Elfee já há muitos anos, haviam crescido dividindo o tempo entre as horas infindáveis de treinamento e as escapadas para as cachoeiras e lagoas que os jovens de Elfee costumavam se reunir para fugir de todas as obrigações do dia a dia. Ele, que começara o treinamento no início da adolescência, já tinha uma enorme carga de assassinatos e execuções em seus jovens ombros, talvez por isso não apresentava objeções quando, ao completar mais da metade do treino, começou a ser solicitado para missões muito mais perigosas e sangrentas. Isso antes de Acácia surtar e começar a esconder segredos deles, impedindo que fossem a missões mais perigosas do que recuperar um artefato mágico de uma loja de antiguidades ou levar mensagens e pacotes importantes.

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