Vale de Mion
O ar estava quente graças ao fogo, tornando cada respiração sufocante ao secar seus pulmões e ser rejeitada por seu corpo. O calor havia tomado o interior da casa que antes já era mais do que abafada, mas o mais torturante de toda a situação eram os gritos. Eles caiam sobre si como se objetivassem o esmagar diante do desespero crescente de não saber o que é real ou não.
— Peguei tudo o que pude encontrar. — Disse Cassie ao entrar na cozinha, duas mochilas pendiam de seus ombros enquanto ela terminava de fechar outra. — A maioria estava dentro das mochilas, mas vamos precisar separar tudo depois.
Daniel levantou o olhar para ela, suas mãos trabalhavam por vontade própria reunindo os alimentos que poderiam levar e enchendo os cantis no enorme balde de água potável que Tom fervera naquela mesma manhã. Sua mente, por outro lado, lutava contra os pedidos de socorro e o clamor de seu coração acelerado para que saísse dali e encontrasse sua família.
— Meu arco? — Ele perguntou, fechando a mochila ao guardar o último cantil e a pendurar no ombro junto com a que havia deixado no chão momentos antes.
— Aqui. — Cassie disse, fazendo flutuar para dentro o montinho de armas que haviam reunido. O arco de Daniel e sua aljava imediatamente se juntaram a ele. — O quê? — Cassie perguntou ao ver o sorrisinho de Daniel.
— Levitação? — Ele perguntou, ajudando-a com as mochilas.
Cassie apenas sorriu levemente e deu de ombros, aproximando-se dele.
— Pensei em tentar alguns feitiços diferentes. Precisava de algo para me ocupar nos últimos dias.
Daniel assentiu, fechando brevemente os olhos quando o grito de Rose passou horrivelmente nítido através das paredes.
— São os Wendigos. Ela está bem. Estou conectada a todos eles, se houver algum risco eu saberei. — Cassie o tranquilizou, mas não fez questão de esconder sua tensão.
— Eu sei.
Realmente sabia. Passara os últimos minutos recordando a si mesmo do feitiço que Cassie fizera assim que entraram na casa; ele permitia que ela se conectasse com suas mentes a distância, ainda que não pudesse ler seus pensamentos, ela sentiria o perigo iminente.
Um rugido soou próximo da casa e algo pesado bateu contra uma das paredes seguida do inconfundível som de cabeça se chocando contra uma superfície dura.
— Acho que eles estão dando conta. — Cassie se encolheu, alcançando uma de suas facas longas. — Acho que recolhemos tudo. Vamos torcer para não passarmos muito tempo vagando por esse lugar.
Ela olhou para ele, aguardando que usasse seus poderes e os transportasse para o local onde haviam deixado Rose e Tom. Esperava que Maria tivesse conseguido unir os cavalos e os levado ao ponto de encontro. Contudo, Daniel não parecia ter pressa, uma vez que observava o rosto de Cassie de forma impassível, buscando por algo.
— Você chorou. — Afirmou. — Foi por isso que perdeu o controle?
Cassie se encolheu diante da pergunta, não porque não a esperava, mas sim porque torcia para que fosse feita depois de ter inventado alguma desculpa. O que responderia? Que invejava o relacionamento dele? A chance de ele estar feliz? Como poderia ser tão egoísta? Devia estar feliz por ele, não ressentida por Rose o ter enquanto ela não poderia ter Ethan.
— Não quero falar sobre isso. — Respondeu baixinho, evitando olhar em sua direção.
Daniel, contudo, não desistiu. Ele a segurou pelos ombros e a fez o olhar, sua expressão era compreensiva e torturada, angustiada.
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Alma Negra
Fantasy"O tempo não é capaz de curar todos os ferimentos." Uma pesarosa nuvem negra paira sobre Elfee desde a coroação de sua rainha. Morte e traição, bem como surpresa em aliados inesperados, forjaram uma cicatriz que marcará para sempre a cidade das fada...