A intrusão

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Ao chegar a escola, Moira viu aquele ofuror de adolescentes na entrada lateral do prédio, vestidos com trajes vitorianos e espadas, faziam fila para o teste de elenco para a peça que seria apresentada no começo de dezembro. A cada lado da porta dupla estavam Peter e Chase com pranchetas, organizando os alunos que recitavam algumas cenas.

- Oi! - a mocinha de cabelo verde se aproximou. - Aqui tá animado.
- Você vai participar do teste? - Peter olhou na prancheta. - Ackleberg, Moira.
- Sim, mas a fila ta enorme.
- E daí?
- Não vou fazer agora, ue. Só vim bater papo.
- O teste termina...
- Cadê a Seewet? Falta de profissionalismo deixar dois bocós novatos administrando os aspirantes.
- Você sabe com quem você tá falando, doida?
- Sim, Peter Hitman, aluno do terceiro ano, amigo de Hale Doss, Gregory Dickens e o outro bocó ali, prestes a reprovar caso não tire notas boas, obrigado a estar no Teatro e mesmo assim não faz nada direito.
- É só isso que você sabe? - Peter riu.
- Sim, você não é alguém que me desperta curiosidade. - Moira riu divertida. - O papo ta bom, to vendo que você é daqueles que falam muito.
- Você que ta falando sozinha.
- Aham. Não me disse onde esta a Carol.
- Eu sei, você não deixou eu terminar de falar!
- Então fale, homem!
- Ela ta na quadra julgando os aspirantes.
- Viu, nem doeu.

Moira deu um pulinho animado e se enfiou entre o amontoado de alunos na porta dupla, pedindo licença e logo estando dentro do prédio. O corredor até a quadra estava tomado por pessoas e la no final, pedindo para que todos esperassem com calma, Gregory também com uma prancheta, mas nervoso agarrado à bombinha de asma.

- Não é todo dia que eu vejo um gatinho desses. - tentou ser galante.
- O que?
- Nada! - Moira se recompôs. - Você sabe que eu sou a Moira, vou dispensar formalidades. Oi.
- Oi... A gente pode conversar depois? Eu to ocupado agora.
- Voc-você quer conversar comigo? Eu, Moira?
- Sim...? Ou você vai fazer o teste?
- Eu vou, com toda certeza de que o céu é azul.
- O céu não é azul, tecnicamente.
- Mas quem liga? - ela deu de ombros, tentando ser engraçada. - Ahm... A Carol, você viu?
- Tá ali. - ele apontou para a baixinha carrancuda sentadas atrás de uma mesa no meio da quadra.
- Ah... - Moira se aproximou para ver melhor, ficando perto do rapaz. - É sempre um prazer te ver, Gregory Dickens.
- Sempre?
- Não dificulta. - ela piscou e correu para dentro da quadra.

A menina serelepe foi engatinhando até Carol que assistia à Lola Bellmore que tentava o papel da jovem apaixonada, não seria um dia leve já que havia pouco menos de cem pessoas do lado de fora da quadra aguardando serem chamados. Moira e Carol haviam sido muito amigas antes de Betina chegar à ALH, viviam juntas aprontando ideias absurdas na escola para o bom desenvolvimento acadêmico, porém as duas eram competitivas demais, com os outros e principalmente entre si, Carol era visionária e desogarnizada, Moira era deslumbrada e pontual, juntas poderiam fazer a Paz Mundial dar certo se fosse necessário mas não davam o braço a torcer.

- Eu ja te vi aí, Moira.
- Eu sei, não sou invisível.
- O que você quer?
- Ver.
- Vai fazer o teste? - Carol olhou na direção de Moira finalmente.
- Sim, mas não agora.
- Que porra você ta fazendo aqui então? Veio falar na minha cabeça?
- Não, eu só quero ver, já disse.
- Então fica aí. Quieta.
- Mas eu nem falo muito.
- Você fala, você fala muito. Muito...
- Tá, mas quem ta falando agora é você.
- Ai socorro...

***

A manhã parecia não querer passar pela quantidade de adolescentes esperançosos que entravam e frustrados que saíam da quadra. Num canto preparado para os possíveis escalados para o elenco, apenas 30 estavam sentados, sim 30, mas Carol ainda não havia encontrado o seu casal, aquele que fariam os olhos dos espectadores brilharem de emoção e empatia, todos os homens estavam empenhados em ser valentes e as meninas empenhadas em ser donzelas chorosas, mas ninguém mostrava paixão e atração, amor... Pela tarde, depois de algumas aulas, Betina conseguiu chegar a quadra agora mais vazia, de longe viu Hale entre os 30 alunos e não conseguiu visualizar ele estando na peça, talvez seja alucinação, pensou. Carol e Moira, agora juntas chamando os nomes e preparando-os sobre o palco improvisado, almoçavam na mesinha.

Os erros que cometemos quando éramos cegosOnde histórias criam vida. Descubra agora