piquenique de manhã

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Elas dormiram juntas a noite inteira. Os braços de Florence estavam em volta do corpo de Betty, e a garota nunca havia dormido tão pacificamente. Em seus braços, sentiu-se em casa, como nunca se sentira antes. Ela sabia que soava insano, portanto nunca expressou as sensações em voz alta. Mas era a verdade.

Betty acordou horas antes da outra garota, então a assistiu dormir e respirar. Florence parecia tão calma, como se nada de errado ocorresse no mundo. Sua vizinha queria apenas ser capaz de ler a sua mente para encontrar a fórmula de completa paz de espírito que ela aparentava ter.

Pouco sabia ela que Florence tinha uma tempestade em sua mente sentir-se tão segura, mesmo que ela estivesse a quilômetros de distância de todo o caos que a cidade e a sua família lhe davam. Mesmo com toda aquela distância, a fazenda e seus fantásticos campos de flores não eram capaz de protegê-la.

Ela tinha pesadelos todas as noites em que ela deitava no chão de um novo apartamento, em um país diferente, e deixava seu corpo apodrecer. Naqueles sonhos, ela morria completamente só. Ela não podia gritar por ajuda ou por companhia. Ela havia perdido a sua voz.

Aquela era a primeira noite em que ela tinha um sono profundo. Era como se fadas tivessem construído um escudo que a separava do mundo e tudo que ela podia ver eram cores magníficas.

Na verdade, era apenas o batimento cardíaco de alguém no mesmo ritmo do seu próprio que lhe deu tanta paz.

Quando ela acordou, Betty estava a olhando. Ela tentou olhar para outro ponto quando Florence abriu os olhos, mas a garota já havia percebido. Ela fechou os olhos e sorriu para saborear aquele momento e salvá-lo em sua memória. O rosto da menina ruiva era uma bênção para começar o dia.

- Olá, você aí. – Florence falou. Betty havia virado a sua cabeça e ficado completamente vermelha. – Dormiu bem?

- Sim, muito bem. – Betty olhava para o teto, tentando esconder o próprio sorriso. A garota ao seu lado movia as suas mãos para tocar as delas e, por isso, ela começou a suar. Ela virou o seu rosto para olhá-la. – E você?

- Tive mais paz esta noite do que tive em anos, para ser honesta.

Elas se olharam por alguns minutos, apenas admirando o rosto uma da outra. Florence tinha olhos amendoados e verdes. A cor era tão intensa que lembrava uma floresta, onde Betty adentraria sem dúvidas. A ruiva tinha olhos redondos e castanhos, que aparentavam um mistério que Florence morria para resolver.

- O que faremos hoje? – a garota da cidade perguntou.

- Acho que preciso ir para casa para que meus pais não surtem. Eu saí sem aviso ontem à noite.

- Ah sim, é verdade. Posso te levar lá.

Florence pulou da cama e colocou um dos vestidos antigos de sua avó sobre a sua camisola. Era um belo vestido leve, de cor esverdeada. Ela pegou na mão da sua vizinha e andou com ela até o pequeno chalé. Os pais dela não estavam acordados, então ela decidiu escrever um bilhete avisando-os que estava bem, com a garota da cidade que vivia na fazenda ao lado. Ela sabia que eles não ligariam.

Quando voltaram à fazenda, Florence decidiu que deviam fazer um piquenique juntas.

- Consegue imaginar? Apenas nós, alguns bolinhos, e esse grande mundo selvagem.

- Soa perfeito.

Elas seguiram a empacotar uma toalha, algumas fatias de pão, bolos, biscoitos, uma garrafa de café, geleia e algumas frutas. Quando acabaram, andaram até a floresta. Betty ainda usava sua blusa velha e suja e as calças jeans ed sua mãe, além de suas antigas botas marrons. Ela estava pronta para se meter no meio da natureza, sabendo que se suas roupas fossem arruinadas não seria trágico.

Então adentraram o bosque. Com o vestido verde e o cabelo esvoaçando, Florence parecia pronta para voar. Betty sentia que era pequena demais perto daquela alma enorme. Ela estava feliz de poder ser parte da vida dela.

Elas andaram até acharem uma árvore grande o suficiente para fazê-las sentir como seres minúsculos sob a sua sombra. Elas sentaram em suas raízes e colocaram a toalha no chão. A garota da cidade organizou a comida que levaram em belos pratos e, depois, olhou para o céu.

- É um belo dia, não acha?

- Realmente. – Betty relaxou a sua cabeça na grande árvore e suspirou. – Sinto-me tão em paz. Há apenas nós e o som da natureza à nossa volta.

- Não seria incrível viver em um pequeno recanto no meio do nada e não ter que responder a ninguém além de si próprio e a necessidade de sobreviver?

Florence abriu a garrafa de café, derramou o líquido em duas xícaras brancas que levara na mochila e deu uma delas a Betty. Comeram alguns biscoitos antes de beberem todo o café e deitarem no chão para observar o céu e suas nuvens.

um segredo de verãoOnde histórias criam vida. Descubra agora