Calor.
Abri os olhos repentinamente, levando meu corpo a deixar o colchão, mas fui bruscamente içada sendo obrigada a ficar deitada novamente.
Me dei conta de onde estava, como estava e, o principal, com quem estava.
Um choque de realidade fez meu corpo encher-se de torpor.
O braço de Dorian pesados ao redor do meu corpo. Sua respiração era lenta e constante chocando-se no meu pescoço, estaria ele dormindo?
O mundo estava mergulhado na escuridão da madrugada, podia ver o céu escuro pela janela, ouvi as vozes dos outros hóspedes ao lado, alguma discussão em tom baixo sobre ir ou não ir a algum lugar.
Relaxei o corpo.
Sabia que ele bebeu e um lampejo fugaz de esperança passou por meu peito.
Suas mãos eram como brasas, os dedos calejados e judiados, o braço do meu captor era forte, não se moveu quando tentei tira-lo de cima de mim.
Desisti no segundo minuto, questionando-me se ele estaria de fato adormecido ou me testando para saber se iria fugir.
Se dormia ou não, eu não sei. Tudo o que sei é que estrondosamente fui arremessada da parede para o chão.
Dor explodiu em minhas costelas, latejando e me arrancando um gemido.
Observei Dorian, que saltou da cama recolhendo a espada de punho reluzente com uma destreza e velocidade animalesca no exato instante em que a porta era meticulosamente aberta usando, provavelmente, uma broca.
Os invasores não tiveram chance, um teve a garganta aberta com um golpe esperto e ágil na qual a espada pareceu mais uma parte extendida do corpo de Dorian, o outro ficou imprensado contra a parede, a espada atravessando o tórax e se fincou na madeira o deixando pendurado alguns centímetros do chão.
Ao me levantar, massageando o local do impacto, percebi, não eram humanos, a morte revelara a verdadeira face dos indivíduos, pele escamosa e oleosa, carentes de cabelos e altura, a boca finíssima revelando dentinhos enfileirados e pontiagudos.
Meu peito subia e descia, avaliando-os de longe.
— Estão vindo somente os de classe inferior — Disse o homem para si, removendo a espada de dentro do ser com extrema facilidade.
Olhei para ele, olhei para o sangue viscoso.
Pelos deuses, o que estava acontecendo?
— O que são isso?
O apreensor saiu do quarto, evitando o sangue derramado, sem olhar para mim e sem responder meu questionamento.
Fiquei com as costas contra a parede, observando ambos os corpos desfalecidos.
A mulher loira estava novamente à porta, os cabelos médios caindo em seus ombros, o olhar sonolento mas revirados de desprezo e aversão.
— Sinto muito — Disse ela para Dorian alguns passos atrás, braços cruzados e um olhar entediado.
— Qual outro número está disponível?
— 54.
Dorian não fez cerimônia, assentiu gesticulando para que eu o acompanhasse.
Continuei imóvel, passando os meus olhos dele para a mulher e para as criaturas.
— Sua amiga não parece bem — Observou a loira.
Não notei que segurava o ar até respirar aliviada ao ser pega no colo pelo meu sequestrador, assim pude esconder meu rosto e não sentir o cheiro de fumaça, neve e sal, o cheiro das criaturas.
O corpo dele ficou próximo demais do meu sobre a cama do novo quarto, que no geral era quase que a mesma coisa.
— O que eram?
— Fadas — Retrucou, colocando pressão no braço que me rodeava.
Não era ironia, podia sentir.
— Fadas não são daquele jeito.
Dorian suspirou pesadamente.
— O clã das fadas da noite, ficaram presas na floresta perdida há anos, aquela foi a única forma de sobreviverem naquele lugar — Disse, imaginei que aquelas seriam as últimas palavras que dirigiria a mim.
— Por que estavam atrás de você?
— De mim? — Agora havia ironia em sua voz.
Procurei não pensar, pensar nessas coisas seriam problemas a mais, e no momento estou com problemas até demais.
Sinto os dedos de Dorian deslizando o tecido da própria camiseta que eu trajava, para cima e para baixo em meu quadril, lentamente.
— Onde ela está?
— Não é da sua conta — Respondo, sabendo que se referiu a minha avó.
Resposta errada, de novo.
Meu corpo foi puxado e levado a ficar com o rosto para o teto, Dorian posiciona-se acima de mim, as mãos segurando firmes meus braços contra a cama.
— Não brinque comigo garota — Proferiu.
— O que quer de mim, eu não tenho nada, não sou ninguém — Digo, porém o rosto dele só faz se retesar.
O olhar do homem percorreu ambos os meus olhos, um depois o outro, rápido e frio.
— Eu já disse tudo o que precisa saber.
— Não, não disse, eu não entendo, estou tentando entender mas não entendo — Retruquei, nessa altura sem medo nenhum dos seus avisos silenciosos de perigo. — Você quer usar meu corpo, é o que quer? — Uma respiração alta e um sorriso frouxo.
— Acha que eu atravessaria o continente, mataria três feras noturnas uma delas sendo uma anormal só para foder uma boceta?
Respiro, devagar, os lábios entreabertos, a confusão em profusão dentro de mim.
Meus dedos tateiam a minha direita, discretamente.
— Outro continente, vai me levar para depois do mar? — O homem crispou os lábios.
— Vou.
— Não, eu não posso ir, eu...
Pela primeira tentei me desvencilhar de seu corpo. Remexendo-me, agitando minhas pernas.
O corpo dele era uma rocha grandemente pesada que continuou imóvel, minhas mãos continuaram presas.
Lágrimas, céus, o desespero começou a me inundar.
— Se eu me for como eles vão me encontrar? Como vão saber onde estou? Eu preciso estar lá — As palavras jorravam, não me importava, não me importava com sua carranca impassível e confusa.
— Para, para com isso — Ordenou.
Obedeci.
Olhei-o suplicante.
Eles iam voltar, eu preciso estar em um dos pontos de encontro. Pelos deuses eles iam voltar. Meu peito subia a descia, desgovernado, minhas narinas dilatando conforme transpirava.
As lágrimas deixavam uma trilha de fogo pelo meu rosto. Eu olhava para o lado, para as cortinas turquesa da janela, não podia olha-lo, eu não queria olha-lo.
— Olha pra mim — Essa foi uma ordem que não obedeci, então ele repetiu muito mais ameaçadoramente — Liana, olha pra mim — Continuei olhando as cortinas.
Seu rosto desceu até a curva do meu pescoço, encostando o nariz quente em minha pele, sorvendo o aroma de um modo guloso e selvagem.
Dor, dor irradiou da região onde a pouco o nariz do meu captor estava, puxei meus braços tentando desesperadamente me livrar. Um grito seco e oco deixou meus lábios, dando lugar a um gemido.
Sacudi minhas coxas, tentei acertar um chute, tentei virar meu corpo, senti meus pulsos sendo espremidos por suas mãos gigantes.
— Para com isso! — Clamei.
A cabeça dela continuava aninhada ali, impedindo a minha de se mover, escutava perfeitamente os sons que soltava enquanto sugava meu sangue.
Ao erguer-se novamente, os lábios melados de um vermelho profundo e brilhante, caninos projetados para fora, os olhos de lobo me olhavam.
Meus lábios estavam entreabertos, liberando ar ruidosamente.
— Se me desobedecer de novo garota, vai levar muito mais do que uma mordidinha.
"Mordidinha", pensei. Céus, o mundo estava começando a girar.
Não eu não podia perder a consciência, eu precisava lutar, precisava ficar aqui, céus não.
Os pensamentos foram se dissolvendo, meu corpo amoleceu.
Dorian deixou meus braços libertos, o máximo que pude fazer foi desferir soquinhos fracos e descordenados.
— Eles... — Sussurrei, mas sabia que meu captor vencera, de novo.
O mundo se tornou impreciso e sombrio, eu fui puxada para a escuridão, a escuridão de um sono profundo.
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Chamas De Inverno (PAUSADO)
RomanceUm momento pode mudar tudo. Liana, uma jovem caçadora solitária que vivia na floresta há muito sozinha, vê-se com o destino ligado a uma fera que se passa por homem após ser atacada por uma besta sombria. O medo passa a ser o novo aliado da jove...