Cap. 3 - Indigesto

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PEDRO

Não admito de ninguém fale comigo daquela maneira, a menos que seja um dos meus avós, porém aquela mulher falou e eu ouvi calado. Nem sei o que deu em mim. Mas ela está com a razão, não posso ser quem eu quero. O legado da família é mais importante que um desejo.

- Amadureça, Pedro! – Relembrei as palavras de minha avó, em voz alta.

Sabrina e algumas outras, estão mandando mensagem. Elas querem saber o porquê de eu ter sumido. Responsabilidades, responsabilidades e um toque de cansaço da falta de assunto delas.

- Como você consegue? – Disse Juan, quase sem fôlego ao terminar a série do treino.

Só venho a academia para encoraja-lo, pois tenho uma particular em casa e prefiro malhar sozinho.

- Consigo porque sou regrado, você só se exercita quando tem vontade. – Levantei a barra com os pesos.

- Nada disso, você é fisicamente privilegiado. Nasceu para deixar nós simples mortais no chão. – Juan abandonou o exercício. – Vamos tomar uma cerveja?

Ele não tem jeito, ainda são 8 da manhã.

- Não, além de estarmos na manhã, tenho um compromisso de trabalho. – Terminei minha série.

Sinto meus músculos se contraindo.

- Trabalho, que chatice! – Ele resmungou. – Contrate alguém para fazer isso por você.

Juan é um herdeiro que não precisa trabalhar. Ele tem um irmão mais velho para isso. Particularmente, eu não seria capaz de viver como ele. Tenho que ser útil e produzir. Andar entre plantação e acompanhar o ritmo do vinho.

***

Vim para casa tomar banho, não gosto de banheiro coletivo. Aqui tenho meu sistema impecável, com  hidro massagem vertical, além de uma agradável banheira. Que nunca dividi com ninguém, às vezes acho que tenho problemas em permitir que alguém seja íntimo. Afinal existe diferença entre intimidade e ser íntimo. Transar casualmente é uma intimidade. Deixar a pessoa entrar na minha casa, deitar-se na minha cama e dividir o dia a dia comigo é ser íntimo. E isso é difícil para mim, permitir que uma mulher se aproxime o bastante para se tornar íntima. Outra vez? Eu acho impossível, afinal quando se é queimado, aprendemos a evitar o fogo.

OLIVIA

Desde que cheguei aqui tenho pensado em algo, que meu pai disse há muito tempo. Siga os seus sonhos e realize as suas conquistas, mas não se esqueça de viver. Ele sempre bateu nessa tecla. Dizendo, de que adianta as longas horas nesses arranha céu de vidro, se não há tempo para felicidade. A alegria genuína, aquela que está muito longe dessas fortalezas espelhadas. Não sei por que tenho pensado nisso, porém é óbvio que algo nessa cidade despertou isso em mim.

Quando Rosa falou do encontro as cegas, lá fundo eu tive uma ponta de esperança. De que quem sabe, desta vez eu conhecesse alguém especial. No entanto, foi apenas mais do mesmo. O casual, o não se apegue porque meu tempo é precioso demais para gastar com sentimentos. Uma decepção, duas decepções e uma certeza de que não consigo confiar. Sou consciente o bastante para admitir que levo uma vida vazia. Não gostaria que fosse assim, contudo creio que a essa altura seja impossível mudar. Talvez apenas por milagre.

Meus assistentes ficaram no escritório, posso lidar com tour pelo Vinhedo sem grandes complicações. Esta unidade que estou visitando, em Madri, é nova. As instalações originais são na região da Andaluzia. Onde nasceu a Casa de Vinhos Rivera, há 95 anos. Fundada por Dom Alfonso Sergio Rivera, passada de geração e geração para filhos e netos.

OliviaOnde histórias criam vida. Descubra agora