Meu amor me guia até você

A gente tem tempo

— Cesar-kun — Kaiser ouviu uma voz sussurrando bem pertinho de si, tirando-o de seu sono. Abriu os olhos devagar, tentado a fechá-los de novo por não ter certeza se a voz era real ou parte de um sonho do qual não conseguia se lembrar. Sentiu uma mão tocando seu ombro gentilmente. — Cesar...

O quarto estava completamente escuro, ainda era madrugada, mas havia um rosto muito perto do seu, de alguém sentado no chão ao lado de sua cama. Alguém com uma cicatriz na bochecha, um sorriso bonito e um olhar que transbordava carinho.

— Joui? — Kaiser perguntou baixinho, mesmo já sabendo que era ele. Coçou os olhos preguiçosamente, feliz pela presença dele mas também confuso, questionando-se o que o traria em seu quarto no meio da noite.

— Desculpa te acordar a essa hora. — Ele coçou a nuca, parecendo meio envergonhado. — Eu acordei e tava aqui, vim te procurar.

— Já virei muitas noites, Joui, isso não é nada — e bocejou ao terminar a fala, fazendo o outro rir baixinho. Sentou-se logo em seguida, ainda meio sonolento porém acordado o suficiente para dar a atenção que ele precisava. Joui estava sentado com as pernas cruzadas no chão, observando-o. — Há quanto tempo você tá aí?

— Um tempo, não sabia se te acordava ou não. — Ele sorriu meio tímido. Era adorável.

Claramente era o Joui que apareceu algumas vezes antes voltando a visitá-lo. Sorriu minimamente. A presença dele era confortante, de certo modo. Quase nostálgica.

— Certo, certo. Vem cá. — Kaiser deu algumas batidinhas ao seu lado. Joui se levantou do chão e sentou-se onde lhe foi indicado, deixando suas mãos em cima de seu próprio colo enquanto apertava levemente o tecido da calça que usava. — Tá tudo bem?

— Tá sim, eu só queria conversar um pouco. Você tem um minuto? — Joui falava devagar, como se escolhesse cuidadosamente suas palavras.

— Claro, pode falar — respondeu, olhando atentamente para o japonês. Ele não olhava para si.

Alguns segundos se passaram antes de ele começar a falar. Kaiser apenas aguardou.

— Eu tive um sonho com aquele lugar, Santo Berço. — Um arrepio leve percorreu a espinha de Kaiser ao ouvir o nome, como sempre. — Eu sabia que era só um sonho, mas o que aconteceu lá dentro não foi o que eu esperava que acontecesse. Foi tudo diferente... E eu só... Depois de pensar melhor nisso... — Enfim Joui subiu seu olhar, deixando aparente seus olhos marejados. — Cesar, eu sinto muito.

— Do que você tá falando? — perguntou surpreso, não era um assunto que esperava que fosse surgir e muito menos com essa reação vinda do outro.

— Foi o que você viveu, não é? O que você perdeu. O jeito que aquela história terminou. — Ele suspirou trêmulo. — Eu vi tudo aquilo, Cesar. Foi horrível. Eu sinto muito mesmo.

Dentro de sua cabeça, flashes de explosões, sorrisos de despedida e sons de choro passavam uma a uma, como cenas de um filme que Kaiser assistiu alguma vez. Nunca se permitiu realmente sentir a dor do luto de quem perdeu, ou qualquer outra dor relacionada às memórias de momentos tão terríveis, afastando-as sempre que ousavam cruzar por sua mente. Evitava o assunto ou tratava-o com uma indiferença que soava forçada até para si, desviaria o olhar daquele que o citou, fugiria. A dor era muito forte e Kaiser tinha coisas demais para fazer pra se dar ao luxo de desabar.

Mas agora, no meio da noite, sem estar enfrentando males inimagináveis e com ninguém além da pessoa que amava perto de si, sentiu a dor lentamente crescendo dentro de si. Kaiser não queria sentir isso.

— Já faz muito tempo, Joui — respondeu após um tempo em silêncio, se esforçando para não desviar o olhar dele. Mesmo essa simples ação era difícil de realizar nesses momentos. — Eu não penso muito nisso.