Por hoje, apenas mais

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Existe um ponto na vida de cada pessoa em que tudo muda; drasticamente, sutilmente ou até de forma imperceptível, mas esse ponto sempre chega, não porque há um caminho que tem que ser trilhado até ele ou porque se deve encará-lo como um objetivo, mas porque ele precisa chegar. Há um ponto em que se é necessário ser e fazer menos para que possa existir outros mais. Lutar menos, descansar mais. Dar menos de si por hora, para merecidamente receber mais em troca. Odiar menos, amar mais.

A vida é feita de mais e de menos, o que quase sempre vai parecer uma mentira, porque se trabalha muito durante tanto tempo e parece que é tudo em vão, coisas boas nunca chegam, muito pelo contrário, elas pioram. Tudo deixa de fazer sentido, se é que já teve algum em primeiro lugar, e a impressão deixada é que tanto suor e lágrimas derramadas foi a custo de nada.

Então tudo muda.

Do dia pra noite ou talvez lentamente, apenas não foi percebido, mas começou a mudar. Mais sorrisos passaram a surgir em seu rosto, talvez até risadas. O céu cinza sem graça parecia mais bonito agora, apesar de ser o mesmo que você via todos os dias. O mundo parecia um lugar melhor, mais convidativo para se viver. As coisas começaram a melhorar, como? O que causou isso? Quem sabe? Talvez tenha sido algo que foi feito diferente naquele dia, a menor das coisas e que provavelmente passou despercebido a seus olhos. Talvez alguém tenha aparecido e feito tudo fazer sentido de novo.

Kaiser era péssimo em fazer metáforas, tanto por não estar acostumado a criá-las quanto porque estava difícil pensar em qualquer coisa que não fosse Joui Jouki, mas inexplicavelmente se viu juntando pedaços de palavras bonitas que retratavam seus sentimentos. Tanta coisa estava acontecendo, mudando, mas tudo era tão bom que não havia sentido em parar para pensar a respeito. Pela primeira vez em sua vida, Kaiser estava simplesmente feliz, e se permitindo estar.

Enquanto ele e Joui caminhavam de mãos dadas para a base da Ordem, um sorriso insistente não saía de seu rosto. Olhava a cada minuto para o rosto do outro ao seu lado e para as mãos unidas, querendo ter certeza de que aquilo era real. Joui sorria e apertava um pouco sua mão sempre que reparava em Kaiser olhando, como se respondesse silenciosamente que ele estava ali, que entendia o que passava por sua mente, pacientemente afirmando isso a cada vez.

Segurar a mão de alguém não era algo que Kaiser fazia com frequência, mas certamente faria mais daquele dia em diante. Era pele com pele, um contato um pouco mais íntimo, acolhedor. Kaiser sentia que segurava sua felicidade na própria mão.

Ele não estava errado.

O caminho até a Ordem era razoavelmente longo, mas pareceu levar segundos para chegarem. Foram caminhando mais devagar conforme se aproximavam da entrada do bar, então uma pequena insegurança surgiu dentro de Kaiser ao olhar uma última vez para as mãos unidas, todos da Ordem veriam isso se entrassem dessa forma, talvez Joui se sentisse envergonhado em mostrar isso para eles e soltasse sua mão antes de entrarem, ou ele poderia só não querer que mais alguém os visse juntos assim, ou...

— Eu só solto se você quiser que eu solte — Joui comentou baixinho ao seu lado, como se lesse seus pensamentos.

Kaiser o olhou surpreso, perguntando-se o quão transparente ele era sobre o que pensava para ser lido fácil assim.

Ele não queria soltar, então. Kaiser também não queria.

Invés de responder, apertou um pouco a mão dele, da mesma forma que o outro fazia até então e sorriu, sendo retribuído no mesmo instante. Entraram de mãos dadas no bar, encontrando Ivete no balcão e Samuel jogando tetris na máquina ao lado. A mais velha sorriu ao vê-los, acenando.

— Até que enfim vocês chegaram! Já tava começando a achar que tinham se perdido no caminho. — Ela olhou para as mãos segurando uma a outra. — Tô vendo agora que perdidos vocês não tavam.

Meu amor me guia até vocêOnde histórias criam vida. Descubra agora