A ARMA DOS DEUSES

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Aurien tinha uma forma peculiar de lutar, já que fora ensinada pelos próprios deuses. Não favoreceu seu oponente. Seus golpes eram duros. Em dado momento, ele desviou-se de uma investida e seu cetro bateu no chão com tamanho impacto que afundou o mármore.

Aragon ficou desconcertado. Se não visse uma figura tão humana, juraria estar lutando com uma deusa. A distração foi o suficiente para ela o derrubar e desarmá-lo. Na ponta reta do cetro surgiu uma lança afiada, rodeada com quatro artes mais finas, menores e pontiagudas. Direcionou-a ao centro do peito dele; seu coração, sua fraqueza. A ponta da lança em formato de garra servia para perfurar e arrancar o coração do inimigo. Os deuses deram a ela o objeto para garantir sua segurança.

— O senhor me insulta me favorecendo nessa luta...

Desviou-se dele e encarou os homens que a olhavam com um misto de temor e respeito.

— Há alguém aqui que não esteja disposto a me insultar?! – Ela inquiriu, a ninguém em especial.

O príncipe Linus deu um passo à frente. Ela sorriu.

— Em guarda! – Disse-lhe.

Atacou-o. Em silêncio, os outros observavam o imperador se levantar. Ao mesmo tempo Linus caía. Dois golpes o incapacitaram. Porém, ele não a favoreceu.

— Alguém mais?! – Ela os questionou.

Ali, naquele momento, Lamark compreendeu que se ela houvesse reagido quando a capturara no comboio de Layus, muitos de seus soldados teriam sido aniquilados. Definitivamente, a grã-sacerdotisa não era a mulher frágil que imaginara. Era uma exímia guerreira.

Quando um general deu um passo à frente para enfrentá-la, Aragon intercedeu:

— Ainda sou seu oponente!

— Certo! Imagino que um guerreiro de sua linhagem é mais forte do que qualquer outro aqui. Mostre-me o que tens! – Pediu — Não o favorecerei! O senhor pediu essa luta! – Completou.

— É justo! – Concordou e voltando-se para os outros, ordenou: — Saiam todos!

Não fora preciso repetir. Num minuto estavam a sós.

— Em respeito à senhorita darei tudo que tenho! –:Garantiu.

Recomeçaram o embate. Os movimentos de Aurien eram suaves e poderosos. Um cisne não conseguiria ser mais gracioso que ela. No decorrer da luta seus longos cabelos se desprenderam do coque, formando belíssimas ondas.

Aragon cumpriu com sua palavra. Não hesitou. Lutou como se verdadeiramente lutasse com um inimigo. Sabia que não podia brincar com ela. Desarmou-a.

Ela parou em postura defensiva, depois se retraiu. Relaxou. Fechou os olhos e esperou. Pelo posicionamento dela, ele soube o que ela tentaria. Sorriu meio de canto de boca. Fez sua investida.

Aurien tentou com ele o mesmo que fizera às suas oponentes na disputa que a levara ao trono. Alcançou-lhe a nuca, contudo não funcionou. O que a deixou perplexa.

— Sinto muito querida! – Disse com um sorriso vitorioso.

Então fez com ela o mesmo que ela tentara lhe fazer. Não teve defesa. Ela não esperava esse tipo de investida, já que aprendera aquela técnica com os deuses. Pendeu inconsciente em seus braços. Seu cetro emitiu uma luz branda e voltou ao formato de pulseira. Ele a apanhou do chão e atou ao braço da jovem.

Sentiu-se imponente ao atravessar o corredor com ela no colo. Seus homens lhe davam passagem à medida que avançava com a preciosa carga. Levou-a aos seus aposentos. Desejava cuidá-la pessoalmente. Ela ficara diminuta em sua cama enorme. Uma estranha sensação percorreu-lhe o corpo. Ele ignorou.

Limitou-se a observá-la. Aos poucos, ela reagiu. Abriu os olhos, debilmente.

— Creio que eu tenha me excedido! – Ele disse. Ia se desculpar.

— De modo algum! Foi uma luta justa! – Ela atalhou.

— Sim! Eu a venci!

— Hum... será?

— O que está sugerindo?

— Se não me engano, Há um arranhão no seu braço provocado pelo meu cetro. Não sentes nada diferente?!

— Sim! Efeitos da luta, não?

— Na verdade, um agente nocivo à sua espécie. A arma em si foi forjada para imobilizar ou matá-los.

— Então, tu venceste!

— Não! És mais forte do que imaginei. A dosagem não foi o suficiente para derrubá-lo, mas o deixará atordoado por algumas horas.

— Pois bem! Vou cuidar em um banho enquanto ainda tenho domínio sobre minhas próprias pernas. – Falou-lhe com um estreito sorriso.

Assim que ele entrou no lavabo, ela se apressou em saltar da cama e sair do quarto. Ficar sozinha com ele a deixava tensa como uma rocha. E não era para menos. Esteve recolhida em seus aposentos por algum tempo. Um banho nas águas geladas do lago a deixara mais relaxada e diminuíra a sensação dolorida causada pela luta.

Andava de um lado para o outro como se travasse uma batalha consigo mesma. Subitamente, parou. Resolveu ir se certificar de que o soberano estava bem. Surpreendeu-se ao encontrá-lo acordado.

— Tens uma força impressionante! Eu não entendo, mesmo tendo sido só um arranhão, devias estar desacordado agora.

— As náuseas são terríveis, mas a dor é reconfortante. – Disse sarcástico.

Andou aos tropeços pelo quarto até alcançar a cama. Deitou-se. A dor que percorreu seu corpo o fez encará-la. Havia se dado conta de que o cetro não era a arma dos deuses; era ela. Estranhamente, isso o confortou.

— Sinto-o! – Disse ela se aproximando.

— Não sinta! Isto não é nada diante da dor que lhe causei!

Ela gelou da ponta do pé ao último fio de cabelo da cabeça. Não esperava que ele tocasse no assunto. Não queria que ele tocasse.

Aragon percebeu seu desconforto e mudou o tom da conversa.

— Sente-se comigo! – Pediu empilhando alguns travesseiros para ela — Não tenha medo, não estou em condições de oferecer riscos à sua integridade. – Disse, vendo-a hesitante.

— Não tenho medo! – Garantiu como se precisasse falar isso em voz alta para ela mesma se convencer.

Subiu na cama. Recostou-se aos travesseiros, pernas sobrepostas e mãos entrelaçadas sobre o ventre. Procurou manter o máximo de distância dele que podia.

— Fale-me alguma coisa! – Ele pediu.

— O que quer saber?!

— Não sei, apenas fale! Sua voz me acalma!

— Que tal sobre o tempo que passei na terra?! – Sugeriu.

— Perfeito! – Falou aninhando-se nos travesseiros.

A GRÃ- SACERDOTISAOnde histórias criam vida. Descubra agora