Estava fazendo sol, milagrosamente, em um dia que não deveria ter um céu tão bonito e limpo. Não havia corpo para velar, não havia cinzas para jogar ao vento, provavelmente as dele voaram no vendaval que ocorreu em Paris na madrugada anterior. O caixão era simbólico, tinha a coleção de cartões de sapos de chocolate, cachecóis, um suéter que Molly tricotou para dar a ele quando se encontrassem de novo, algumas fotos que seriam dolorosas demais de ver dali em diante, e lágrimas. Muitas lágrimas que caíram enquanto jogavam os objetos dentro do caixão.
Lavender tinha um olhar vazio, opaco, as lágrimas que escorriam pelo seu rosto eram escassas porque não sobrara quase nenhuma para despejar na terra que deslizava sozinha na cova. Toda a Ordem estava calada, ninguém conseguia manifestar alguma palavra que expressasse a dor, ou que fornecesse consolo para a recém-viúva ou para Hermione, que chorava e soluçava contra o peito de Draco, repetindo mentalmente quantas vezes insistiu que aquele idiota não tentasse resolver tudo sozinho, e foi exatamente o que ele fez.
Ron estava morto, Harry também. Estava sozinha, sem seus pais, sem sua segunda família. Tinha Draco, tinha Luna e dezenas de outras pessoas na Ordem, mas não era a mesma coisa e todos sabiam que nunca seria.
Quando a cova se fechou, Fred e George lançaram no céu fogos silenciosos que estouraram e formaram nuvens pretas que se dissolveram ao vento em segundos. Todos partiram para a casa dos Weasley, queriam ter certeza de que Molly e Arthur estavam bem, era o segundo filho perdido de maneira trágica, mais uma dolorosa sequela da guerra.
O funeral de Harry parou Londres por uma tarde inteira, um evento fúnebre como se um membro da coroa inglesa tivesse morrido, seu caixão foi enterrado vazio, nenhum de seus antigos colegas conseguiu chegar perto o bastante para colocar algo dentro. Hermione não quis participar daquele circo midiático e Draco desistiu de assistir a transmissão pela TV nos primeiros cinco minutos.
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Brown aguentou apenas mais dois dias no Reino Unido após o funeral de Ron. Foi o tempo de contar para Hermione sobre Aberforth estar enterrado no lugar do irmão, que provavelmente Albus estava vivo ou então seu cadáver seria usado para alguma coisa que Grindelwald estava planejando há sabe-se lá quanto tempo. Mesmo considerando o fato de que alguém estava vivendo na casa de Grindelwald, a possibilidade de Dumbledore estar vivo foi descartada, uma vez que o casal testemunhou a morte do diretor pela maldição da morte e não existia qualquer registro de alguém ter sobrevivido a um ataque direto do feitiço. Ressurreição, em sua forma perfeita, era o tipo de coisa que nem necromantes de renome consideravam possível.
Dormir no seu apartamento era insuportável, sentir o cheiro de Ron nos lençóis era insuportável e mesmo se lavasse parecia não tirar o cheiro. Foram duas noites sem lágrimas, mas abraçada ao suéter cafona que ele usava quando estava em casa. Duas noites esperando que ele aparecesse sorrindo naquela porta e dissesse que tudo ficaria bem.
Ela achou que suportaria, acreditou que poderia lidar com o luto e continuar lutando pela causa, que talvez, só talvez, ainda valesse a pena estar nessa guerra, correndo o risco de ser a próxima a morrer ou ver mais amigos sendo mortos. Tudo isso caiu por terra quando foi ao laboratório começar um novo dia, tentar agir normalmente, ficava tudo mais fácil quando se permitia acreditar que chegaria em casa e Ron estaria acordado, comendo e aguardando seu retorno. Quando abriu seu armário, viu uma caixa de presente minúscula com um laço rosa e um cartão preso a ele.
"14.03.2001
O dia em que percebi que era um filho da puta sortudo
Por casar com você."
Dentro da caixa tinha uma chave de um depósito qualquer onde se guarda quinquilharias, o chaveiro indicava o número. Não quis esperar o turno acabar, de alguma forma teve esperança de que o encontraria vivo, seu peito se aqueceu vendo aquele presente, os olhos por um instante voltaram a brilhar, ela tinha que ver se ele estava bem.
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Dangerous Game
FanficCansado de tantas perdas, imerso em uma profunda dor do luto pela morte de seu padrinho bem diante dos seus olhos, Harry aceitou pagar um alto preço para ser pupilo de Gellert Grindelwald e assim mudar o rumo da guerra contra Voldemort. Com o passa...