Capítulo 13 - Eu... não consigo mais

762 77 15
                                    

- Você já fez isso antes, não? - Yaman perguntou, segurando-a gentil mas firmemente pelo pulso ao perceber seu nervosismo, impedindo que ela se afastasse. 

- S-sim... há muito tempo. Mas...

- Então não há por que ficar apreensiva. 

Realmente, da forma como ele colocava, tudo parecia simples. Mas não era... 

- É que, mesmo assim, não sei se é uma boa ideia... acho que não sou a pessoa mais apropriada para isso - Seher explicou em voz baixa, tentando ganhar tempo, ainda sentindo a carícia dele em seu pulso. Enquanto isso, manteve a outra mão atrás do corpo e cuidadosamente escondeu o papel que até então segurava sob a parte de trás da blusa, prendendo-o no cós da saia e torcendo para que o marido não estranhasse o movimento.

- Ninguém nesse momento poderia fazer isso melhor do que você - ele insistiu com aparente despretensão, mas o olhar entregava intenções ocultas. - Além disso, você é quem disse que deveríamos cortar meu cabelo...

Seher engoliu em seco. Fora pega na própria armadilha. Dias antes, numa tentativa de fugir dele, havia mencionado o corte de cabelo, mas não imaginava que ele fosse pensar nisso depois. Era só um corte de cabelo, não era? Ele devia saber que era uma desculpa...

Instantes antes, quando o viu entrar com uma tesoura, um pente e uma proposta, Seher imaginou que ele só podia estar brincando, mas depois viu que Yaman falava sério. Pelo visto não ele tinha muito apreço pela própria aparência, pensou. Só isso justificaria Yaman pedir a ela que lhe cortasse o cabelo com aquela tesoura. Percebendo que ele não desistiria fácil da ideia, Seher concordou com um aceno e estendeu uma das mãos para uma cadeira próxima. 

- Bem, nesse caso, sente-se ali... - ela pediu.

 Yaman então posicionou a cadeira diante de um espelho na parede e sentou-se para que ela pudesse alcançar sua cabeça.

Depois que ele sentou, Seher então passou os dedos por entre os cabelos dele, apreciando a maciez dos fios fartos e negros, contrastando com a pele branca do pescoço. Percebeu quando ele fechou os olhos e repetiu o gesto. Em seguida penteou com cuidado e começou a aparar os locais em que os fios se elevavam, vez e outra parando para arrumá-los com as próprias mãos, ou, em outros momentos, aproveitando para derrubar os pelos que se acumulavam em seu ombro. Enquanto isso, admirava cada traço do marido, desde os cílios negros e espessos, até a barba e o bigode marcante, que escondia parcialmente o lábio superior dele. 

Estremeceu de leve ao lembrar das sensações produzidas pelo contato dos lábios dele nos seus, o toque daqueles pelos em seu rosto, deixando rastros incandescentes por onde passavam. Provavelmente Yaman havia notado seu tremor, pois ergueu uma das mãos até ela e outra vez apertou de leve seu pulso, enquanto abria os olhos para mergulhar em seus olhos, como se pudesse ler sua alma. Logo depois, sentiu as mãos dele descendo até sua cintura e segurando-a com firmeza, o polegar se movimentando em uma carícia leve, indicando com um movimento sutil que ela continuasse a tarefa.

Se o intuito era transmitir a ela a firmeza e a confiança para que ela prosseguisse, o efeito, contudo, foi muito diferente. Não faltava muito, mas ainda assim, sua mão tremia.

- Eu... não consigo mais... - Seher disse, abandonando a tesoura.

- Consegue, querida. Eu confio em você... - disse, com a voz enrouquecida, enquanto colocava as mãos sobre as dela e as levava de volta até o local onde a tesoura repousava. - Segure com firmeza, assim... 

Seher não o encarou diretamente, mas acompanhou cada movimento através do reflexo do espelho, e se espantou com o que viu: além do reflexo dele, encarou a si mesma, sabendo exatamente o que havia por trás dos próprios olhos nesse instante. De repente, foi invadida por aquelas sensações, uma onda de calor se espalhando por todo o corpo e se concentrando em pontos muito específicos. Então sentiu o rosto corar violentamente e temeu que ele percebesse o que causava nela. Com a garganta seca e o coração retumbando, se perguntou se todas as mulheres no mundo sentiriam o mesmo.

- Não posso, desculpe...

- Seher... - ele disse puxando-a para ele até que se encarassem. Quis desviar o olhar, mas ele segurou em seu queixo e manteve-a firme no lugar.

Fechou os olhos um instante. Quando os abriu outra vez, Yaman permanecia no mesmo local, parado, mas não ficou assim por muito tempo: ergueu a mão e tocou seu queixo.  Ante o contato, Seher involuntariamente se inclinou um pouco em direção a ele e em pouco tempo os rostos se tocaram, apenas de leve. Yaman a princípio apenas roçou os narizes, mas depois distribuiu alguns beijos em sua face. Seher levou uma mão até o rosto dele, mas não a manteve ali. Deslizou-a para o queixo dele e, mais tarde, para o pescoço, onde a deixou. 

Quando os lábios dele tomarem os seus, Seher se apoiou nele completamente entregue. Só se deu conta do erro quando sentiu os braços dele envolverem sua cintura, amassando o papel preso ao cós da saia. Surpreso, Yaman olhou-a interrogativamente enquanto interrompia o beijo.

- Eh... perdão, é a lista de compras - justificou, pegando o papel e mantendo-o firme, torcendo para que ele não pegasse. Para seu alívio, ele pareceu satisfeito com a explicação, pois apenas assentiu com um gesto, então Seher aproveitou o momento para se afastar - Isso me fez lembrar que tenho algumas pendências a resolver... 

***

Seher chegou ofegante na cozinha, tanto pelo esforço da saída apressada do quarto até ali quanto pelo contato que há pouco tivera com o marido, deixando para trás um Yaman intrigado. Olhou para o papel amassado em sua mão e não conteve um sorriso discreto e ansioso, então colocou uma das mãos sobre o próprio peito para acalmar as batidas frenéticas do coração. 

Quase fora pega, mas felizmente ele não havia percebido nada. Há dois dias estava empenhada em preparar uma surpresa para ele, assim como fizera antes de toda a tormenta acontecer. Ao longo dos dois dias, em vários momentos cogitou desistir da ideia, ora assombrada pelas lembranças de como terminara sua última tentativa de surpreendê-lo, ora tomada pela expectativa e pelo medo de que se arrependesse. Não era uma pessoa boa em esconder os próprios rastros, mas desta vez tudo seria diferente.

Por trás do seu olharOnde histórias criam vida. Descubra agora