Capítulo 14 - Você cometeu um erro terrível, chef!

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Sentado no sofá da sala enquanto fingia se concentrar em uma pilha de contratos, Yaman observava a movimentação da esposa pela casa, atento ao ondular dos quadris cobertos pela saia fluida toda vez que ela passava por ali. Não conseguia deixar de pensar no episódio do corte de cabelo. Ou mais precisamente na tentativa, pensou enquanto um riso discreto brincava em seus lábios. Passou os dedos por entre os fios agora devidamente aparados, lembrando do estado em que ficou quando ela saiu abruptamente do quarto deixando o serviço inacabado.

A proposta de que ela cortasse seu cabelo era, inicialmente, muito mais uma provocação; não esperava que Seher fosse realmente tentar, assim como também não imaginava que ela fosse se afetar tanto com a proximidade. 

Embora soubesse que a esposa não era imune a ele, nada nesse mundo o havia preparado para a expressão no rosto dela naquela ocasião, inicialmente parecendo concentrada enquanto se movia ao seu redor, manuseando a tesoura; ou para a constatação do quanto as mãos dela tremiam no processo, ela descomposta, as bochechas em chamas e as pupilas dilatadas enquanto os dedos passeavam por seu rosto e, mais tarde, pelo pescoço, experimentando o contato com a pele dele; ou, ainda, para a forma como o corpo dela buscou o seu quando a beijou.

Lembrou-se também do papel que ela tanto se esforçara para esconder, mas que havia notado desde o momento em que entrara no quarto e vira o malabarismo dela para tentar ocultar a folha no cós da saia. Sabia que Seher estava escondendo alguma coisa e não tinha certeza do que, mas não cairia no erro que os colocara nessa situação. Se houvesse a mínima possibilidade de que por trás disso ela estivesse preparando algum tipo de surpresa, não desperdiçaria a chance de aproveitar o momento por causa da própria dificuldade em lidar com o inesperado. Mas, contra todos esses argumentos, não podia evitar também uma ponta de preocupação porque depois do ocorrido Seher parecia arredia, embora não da mesma maneira que antes.

Olhou para o relógio. Em breve Yusuf chegaria da escola e com ele viria Nedim, que havia ligado informando que precisava de sua assinatura em alguns documentos. Havia estranhado no início, pois pelo que lembrava assinara todos os documentos pendentes um dia antes, mas depois não voltou a pensar no assunto. Andava muito distraído ultimamente e agradeceu por ter um amigo atento e leal como Nedim, pois era justamente a confiança no amigo que permitia que ele pudesse estar a sós com a esposa nesse momento, ocupando a cabeça não com negócios, mas com os próximos passos na sua tentativa de reconstrução do casamento.

Uma vez que Seher havia concordado não apenas que ele tentasse recuperar sua confiança, mas que vivessem no pouco menos de três meses que lhes restava tudo o que haviam perdido, podia voltar a sonhar com ela em seus braços. E depois das mais recentes iniciativas dela, por mais tímidas que parecessem, sabia que era um avanço considerável na relação, o que o fazia ansiar mais do que nunca pelo momento em que poderia respirar aliviado no abraço dela, sabendo que era amado e desejado com a mesma intensidade que a amava e a desejava.

Em tudo isso, a questão que mais o inquietava era de que modo poderia reconquistar a confiança dela, tantas vezes quebrada. O que podia fazer para que ela se sentisse confortável em sua presença outra vez? De que maneira poderia conquistar a liberdade de tocá-la livremente, sem o receio de que as lembranças desagradáveis se transformassem em um abismo entre eles? 

Tantas vezes havia errado que temia que a qualquer momento, sem aviso prévio voltasse a falhar com ela. Além disso, depois do avanço dos últimos dias não queria nem pensar na possibilidade de que regredissem, de que voltassem a ser como estranhos na mesma casa. Precisava descobrir o motivo para o evidente desconforto dela antes que ela outra vez escapasse por entre seus dedos. Pensou por algum tempo sem conseguir chegar a nenhuma solução, então de súbito pensou na única pessoa que poderia ajudá-lo nessa empreitada. Afastou-se um pouco e discou o número, torcendo para ser atendido.

Por trás do seu olharOnde histórias criam vida. Descubra agora