Encaro o papel em branco em minha frente, nele, começo a rabiscar alguns traços longos e curtos, fazendo alguns círculos logo em seguida. Não sei bem o que vai sair daqui, mas gosto de desenhar quando tento não pensar em tomar decisões.
O carvão suja os meus dedos inquietos enquanto continuo rabiscando, fazendo contornos nos trações. Afasto a folha de mim e, trancada no meu quarto, tentando fugir das decisões, dos arranhões que Hilary me causou, eu acabo de perceber que, sem ter a mínima intenção, eu desenhei seus olhos. Verdes e cativantes. A cicatriz acima de sua sobrancelha direita, que me faz percorrer meus dedos pelo papel até tocá-la, fazendo o carvão manchar as linhas.
De onde veio aquela cicatriz?
Ouço batidas na porta e, como se estivesse escondendo um corpo, eu jogo o caderno para debaixo da minha cama, ao tempo que Kailan abre a porta e coloca a cabeça a cabeça para dentro.
— Tudo certo por aqui?
— Considerando o fato que você bateu na porta e abriu-a logo em seguida sem ouvir uma permissão, fora isso, tudo certo.
Kailan afasta os fios castanhos da franja de seu rosto quando desvia o olhar, envergonhado.
— Não vai acontecer de novo, prometo. Posso entrar?
— Pedir já é um grande passo pra você, não é? — digo ironicamente, apontando um lugar à cama para ele.
Ele adentra o quarto, olhando cada centímetro do cômodo: minha escrivaninha que mal uso, o closet pequeno com algumas mudas de roupas.
— Você ainda não desfez a mala?
— Não por completo. — sento na cama enquanto o vejo fazer o mesmo.
— A senhora não vai embora, vai?
Engulo o “senhora” com horror.
— Senhora é a sua mãe. — digo, apesar do tom de xingamento. Bufo e encosto na parede. — Respondendo a sua pergunta: meu plano era ficar aqui por três meses até eu arrumar meu apartamento. Infelizmente não posso morar no meu ateliê – acredite em mim, está um caos.
— E com meus avôs?
Só a ideia de morar com Carlos Antônio me faz estremecer.
— Estou falida, não louca.
Isso faz Kailan ri e relaxar. Respiro fundo, percebendo que essa é a primeira vez que converso diretamente com ele a sós.
— Eu achei que mamãe te deixava louca.
— Dificilmente nos bicamos. — ... tirando a discussão do primeiro dia, Cristina e eu evitamos uma a outra... por Kailan.
Ele assente, mesmo que pareça distante a conversa.
— Por quê? — ele diz tão baixo que me esforço para ouvi-lo.
— Por que o quê?
Ele vira todo seu corpo para minha direção.
— Por que você e minha mãe vivem nessa rixa? Não é assim com tio Nathan. E tem meus avós também... Não consigo achar um motivo plausível para não gostarem de você.
— “Motivo plausível”? — quase dou risada para fugir. — Que tipo de adolescente fala isso?
Kailan cora e encolhe os ombros, defensivo e envergonhado. Acabo rindo e me arrasto para me levantar da cama, passando por ele, bagunço seus cabelos.
— Isso não é assunto para você, pequeno.
— Pequeno? Tenho apenas quatro centímetros a menos que você. — ele avança sobre mim, colocando seus braços em volta do meu pescoço e fingindo me estrangular por trás.
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A namorada do meu sobrinho [Enemies to lovers lésbico✓]
RomanceJúlia passou anos longe de sua família para correr atrás de seus sonhos de ser desenhista e pintora, e coincidentemente, na mesma cidade pode viver seu relacionamento com Melissa, a qual namorou a distância por muitos meses. No entanto, a vida fez...