Capítulo Dezesseis [Você?]

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Uma vez, Van Gogh disse que o amor é eterno, que o aspecto pode mudar, mas não a essência. Encarando mais uma pintura que seus olhos me penetram com tanta intensidade, eu concordo com Van Gogh.

Estou morando no meu ateliê faz três semanas e, olhando ao redor, percebendo os quadros espalhados pelo chão e nas paredes, eu finalmente admito para mim mesma: sinto a falta dela. Sinto a maldita falta dela – do seu cheiro adocicado, do cheiro do seu café da manhã me despertando, do seu beijo e, merda, até mesmo das picuinhas, do ciúme, das intrigas infantis, e dos sermões. Faz duas semanas que tudo o que eu tenho pintado e desenhado é ela, seu rosto angelical, sua cicatriz, mas seu caráter foi tudo que eu não conseguir decifrar para expressar. Hilary é indecifrável, até mesmo para si mesma.

“Quando atingir o sol, diga a Van Gogh que ele tinha razão.”, assino o quadro na parte inferior antes de me afastar para apreciar com mais amplitude. Minha musa... que nunca chegou a ser minha.

Suspiro, frustrada. Tenho a pintado diariamente desde que fui embora, a última vez que a vi, em busca de algum sentimento de ter feito o certo por não ter aceitado toda aquela maluquice, mas não sinto nada além do peso de sua ausência. Viro-me para ver os outros quadros, vinte e uma pintura sobre ela e não parece ser o suficiente. Eu queria poder engoli-la para que a sensação de envenenamento me paralisasse, ou pelo ao menos freasse essa fome insaciável de tê-la comigo novamente. No entanto, como não posso fazer isso, contento-me em tê-la em minha cabeça e por todo meu ateliê, afogando-me nesse maldito sentimento..., enquanto esse sentimento por ela não me mata, me deixa viva o suficiente para que eu possa idolatrá-la.

Um dia eu a superarei, mas, por enquanto, quero idolatrá-la e odiá-la o máximo que eu puder.

As batidas na porta me tiram dos meus devaneios. Atravesso o mar que Hilarys e vou até a porta, rezando para que, quem quer que for, não note o meu descaso com o espelho ou até mesmo com um bom chuveiro. Para a minha não tão grande surpresa, é Nathan, a única pessoa que me visita, mas noto que dessa vez ele está acompanhado de um rapaz mediano de olhos castanhos e roupas largas. Ergo uma sobrancelha para meu irmão, que silenciosamente diz “depois eu te explico”. Dou espaço para que eles entrem e os acompanho entre a bagunça de tintas, pincéis, quadros, paletas, restos de comida enlatada e garrafas de tequila vazias. Só então percebo o quão na merda eu estou.

— Por Deus, você tá na merda.

— Obrigada por verbalizar meus pensamentos, mas não precisava.

Nathan dá de ombros e se senta no puff-pêra. O homem que o acompanha fica de pé, aparentemente notando cara centímetros de sujeira e bagunça.

— Ah, é — meu irmão revira os olhos. —, esqueci de mencionar um fato muito irritante nele: ele odeia bagunça. Qualquer tipo dela, até mesmo a bagunça interna das pessoas.

— Não é verdade — o homem rebate. —, se fosse, eu não teria me interessado por você.

Espera, o quê?

— Tadeu?

Ele se vira para mim com as sobrancelhas erguidas.

— Sim?

Olho para Nathan. Ai, caralho.

— Você é o Tadeu? Tadeu, Tadeu? Namorado do meu irmão?

O homem se olha de cima a baixo e depois de Nathan para mim, sem entender porra nenhuma.

— Sou, eu acho que sou eu sim. — pigarreia, cruzando os braços. — Ah não ser que seu irmão esteja namorando outro Tadeu, aí eu não terei certeza de que sou eu.

Nathan ri com a piada do namorado, eu ainda estou com cara de tacho. Tento desfazer essa cara idiota o mais rápido que consigo mas, porra, de todos os caras que eu achei que meu irmão se interessasse, Tadeu vai contra todos. Ele é menor que Nathan, estando na faixa dos 1,65, tem olhos castanhos, veste uma calça cargo e uma camisa larga, os seus braços tão tatuados, o seu cabelo é cacheado e tem tanto brilho nele como um todo que eu estou surpresa de não ter que pagar para olhá-lo.

A namorada do meu sobrinho [Enemies to lovers lésbico✓]Onde histórias criam vida. Descubra agora