Capítulo 3

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  Abri os olhos algumas vezes, estava chuviscando, as árvores passavam rapidamente pela janela do ônibus, e a vista foi mudando, como se...

  — Lado oeste! Podem descer! — ouvi uma voz masculina.

  — Lado... oeste? — repeti meio sonolenta.

  Houve um estalo dentro de mim, e eu me dei conta do que estava acontecendo.

  — Ah, não. Não, não, não... mais essa agora? — me ajeitei, pegando minha bolsa do chão, e olhando freneticamente pela janela. Eu não reconhecia nada naquelas bandas, nunca tinha estado no lado oeste antes.

  E com quem o motorista estava falando? Só havia eu e meu desespero no ônibus.

• Música Tema do Seth:

  — Ah, lar doce lar! Já não aguentava mais aquela atmosfera de propaganda de refrigerante diet. — Disse uma voz grave e meio rouca. — Ambas não passam de mentiras de qualquer forma...

  Me joguei no chão atrás dos bancos, levando um susto quando alguém levantou-se de uns assentos mais à frente do meu. Era muito alto, e com longos cabelos lisos, negros como carvão, caindo nas costas.

  Era Seth D'arc.

  De repente, ouvi uma risada feminina, e uma garota de jaqueta de couro preta surgiu de uma poltrona paralela à dele. Não consegui ver seu rosto, apenas seus longos cabelos castanho escuros.

  — É só mais um ano, e então... você estará livre — ela pegou uma mochila e começou a descer do ônibus.

  — Só faço isso pelo velho Sr. K... — ele falou suspirou, encarando o nada.

  Sem querer, afundei uma mão no banco tentando observá-lo, fazendo um barulho nas molas. D'arc olhou rápido na minha direção, com os olhos azul escuros muito atentos, mas por algum motivo, que não consegui entender qual naquele momento, eu fiz questão de não ser vista por ele, ao invés de pedir ajuda.

  Por um longo minuto, ele continuou analisando o ônibus, como um caçador. Tapei a boca para controlar minha respiração, que estava acelerada.

  — Ei! O que está esperando, garoto? Eu tenho hora! — o motorista do ônibus escolar começou a acender um cigarro, impaciente.

  — Desculpe, achei ter ouvido alguma coisa. — Seth continuou desconfiado, franziu as grossas sobrancelhas, e apertou os lábios vermelhos e carnudos um contra o outro. Por fim, deu de ombros e desceu do ônibus despreocupadamente.

  Me ergui devagar para ter certeza de que não seria flagrada, mas Seth já havia partido. Agora, eu tinha um outro problema: o que fazer?

  Não podia pedir ajuda ao motorista, seria a maior confusão quando eu voltasse para a escola, iriam chamar meu avô, ou pior, minha mãe. As palavras dela sobre me botar na linha ecoaram nos meus pensamentos, ela não podia nem sonhar que matei aula. Eu precisava ligar para Carl, com certeza ele já devia ter sentido minha falta, mas não iria fazer escândalos, para me encobrir.

  De mansinho, aproveitei que o motorista estava distraído com seu cigarro, tossindo como um porco com a fumaça, e desci do ônibus em uma estrada de pequenas pedras claras, entre um escuro e nebuloso arvoredo, apenas com uma parada de ônibus meio mal cuidada do lado direito, algo que não era muito frequente em Dumanville, a cidadezinha perfeita. Ouvi o ônibus atrás de mim afastar-se dali, não havia mais volta, eu precisava encontrar um lugar para chamar Carl, estava frio como nunca.

Todos, Menos NósOnde histórias criam vida. Descubra agora