Capítulo 1

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Se mudar sempre foi uma droga, e apesar de já ter feito isso umas oito vezes na minha vida, a sensação nunca muda. Mas pela primeira vez, eu tinha total certeza de que nunca mais empacotaria uma fruteira sequer, dessa vez eu vim para ficar.

E New York é definitivamente o melhor lugar para se começar uma nova vida.

O porquê de eu já ter me mudado mais do que a maioria das pessoas, se deve ao fato do meu pai ser um militar, então tivemos de nos mudar várias vezes para o local ao qual ele era designado. Lugares diferentes mas sempre em pequenas cidades, um saco.

Realmente achava que meu destino era viver para sempre no interior, até receber a melhor notícia de todos os tempos: eu estava oficialmente saindo daquele maldito fim de mundo e me mudando para uma das cidades mais importantes do planeta para cursar administração. Minha vida não poderia estar mais perfeita.

Isso até eu chegar naquela cidade imensa e perceber que não conhecia nenhuma alma viva dentre aqueles quase 9 milhões de pessoas,  e que não possuía um nada para fazer antes e depois de voltar da faculdade. Para um lugar chamado de "sonho americano", aquela cidade andava muito deprimente, pelo menos para mim.

Cheguei em New York no dia 24 de julho, mas minhas aulas começariam apenas no dia 1º de agosto, ou seja, eu teria uma semana inteira para morrer de tédio enquanto desempacotava as panelas que minha mãe insistiu que eu trouxesse, como se eu fosse usar para cozinhar algo, tendo um milhão de serviços de entregas à minha disposição, o que também fazia parte do problema, uma vez que eu possuía dinheiro suficiente para sobreviver apenas um mês.

Mal acreditei quando meu pai falou que isso tinha a ver com o fato de se ter responsabilidade, receber pelo trabalho duro e mais um monte de blá blá blá que fiz questão de apagar da minha memória. Só que em vez de preservar muito bem esse dinheiro, eu estava gastando tudo em fastfood e em um monte de porcarias. Mas quer saber? Que se dane! Se eu não tinha com quem conversar, pelo menos eu podia comer, e atender os entregadores nem que fosse para dizer um "valeu" já me fazia sentir menos um solitário.

Quando foi que eu fiquei tão na fossa? Maldito seja o dia que eu aceitei vir para essa cidade.

Finalmente o dia primeiro havia chegado, e eu fiquei tão animado com isso, que não consegui nem dormir na noite anterior. Uma mistura de ansiedade, medo, pavor e angústia haviam tomado conta de mim. Não sabia nem se era mais capaz de manter uma conversa com alguém depois de ficar sete dias dizendo apenas "valeu". Como era mesmo que se cumprimentava as pessoas?

Comer porcarias a semana inteira havia acabado com a minha capacidade de raciocínio.

Minhas aulas eram às três da tarde, ou seja, eu tinha a manhã inteira para morrer de tédio assistindo a programas infantis enquanto memorizava o trajeto do meu apartamento até a faculdade. Então, quando deu a hora, eu já havia memorizado como deveria ser meu roteiro para chegar lá: deveria pegar um metrô, andar alguns quarteirões e pronto, simples assim, mas como eu andava meio desfuncional, quase errei a parada, me perdi na contagem dos quarteirões e quase fui assaltado por uns caras estranhos.

Eu estava totalmente perdido.

Quando foi que eu me tornei tão panaca? New York faz coisas estranhas com as pessoas, ou seria apenas comigo?

Eu estava totalmente perdido olhando para aquele pequeno mapa na minha mão, enquanto as pessoas andavam de um lado para o outro, vez ou outra esbarrando em mim. Eu era só mais um naquela multidão de pessoas e se eu não encontrasse logo o maldito caminho, chegaria atrasado no meu primeiro dia. Ótimo!

E a voz do meu pai militar com suas regras estúpidas de nada de atraso ainda soavam em minha cabeça.

Por que raios isso não foi para lixeira junto com os outros arquivos denominados "chatices ignoráveis"?

Um livro, Um café e Um sorriso [Completo]Onde histórias criam vida. Descubra agora