Capítulo 12

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Agosto de 2019

Meu punho se abre ligeiramente, apenas para libertar o primeiro punhado de terra negra, uma terra úmida e ao mesmo tempo macia. Cada resquício vai caindo lentamente até atingir com um baque surdo sobre a madeira imperial, mancando as flores e seja pintura lustrosa.

O buraco está a sete palmos abaixo dos meus pés, protegidos pelos sapatos de grife. Deixo minha mão cair assim como a única lágrima que queima por meu rosto, assim como um fio solto do meu cabelo extremamente liso caindo sobre a minha testa, assim como as flores que caem uma atrás da outra dentro do buraco escuro, tapando a madeira.

Está um dia lindo, sol, aves, ventania adequada, sombras das árvores e mesmo assim alguns levaram seus próprios guarda-chuva para cobrir seus chapéus e não deixarem marcas de queimadura. Mulheres em vestidos negros e elegantes, homens em seus ternos guardados para ocasiões importantes e aqui estão todos os que se dizem amigos.

Sinto duas mãos agarreram meu braço músculoso, ela me aperta e quando viro para esse lado vejo minha mãe em prantos. Deixo que ela chore, é preciso chorar mas o indivíduo frio e duro que existe em mim e que fora colocado por meu pai não permite que eu soluce de tanto chorar por nossa perda.

O caixão é coberto totalmente, assim como as flores e a caixa de ferro que ele prontamente pediu para levar consigo para sempre. Há apenas terra para ver agora, os coveiros jogam o restante para cobrir e então vejo as pessoas se afastando com leveza pelo gramado com milhares de lápides.

— Ele foi um grande homem — ouço a voz do meu pai do meu outro lado, ele bate nos meus ombros e só confio ver seu cabelo grisalho brilhando na luz do sol —, vou sentir tanto sua falta.

— Era mais que isso pai. Você me ouviu contar a história dele, a mesma história que eu li nas cartas — digo em entoação constante e grave — esse homem teve uma história e tanto.

— Não quero falar sobre esse passado do meu pai, sei que tudo isso conta sobre você filho e entendo mas ainda é muita informação para mim — ele diz tossindo para afastar o choro.

— E mesmo assim, ele estará sempre nos nossos corações — minha mãe diz com a voz embargada.

Ela é mais baixa que papai e se ficassem lado a lado em ordem formariamos uma escadinha. Tem cabelos negros como breu e tão lisos como seda, seu rosto é redondo e sua beleza única, mesmo tendo a idade que tem parece que ela continua com sue 25 anos.

— Vamos Vitória, temos que recepcionar o pessoal que vai seguir lá pra casa — papai diz se afastando com as mãos nos bolsos.

— Claro, você vem Wes? — ela toca em minha barba com delicadeza de uma rainha.

— Vou ficar mais um pouco até acabar e sigo pro meu apartamento — lanço um fraco sorriso para ela — Vejo vocês a noite.

— Até mais querido.

— Fica bem pai, tente mesmo considerar tudo — digo limpando a terra da palma da minha mão — ele merece ser lembrado com muito amor.

Recebo apenas um meneio de cabeça e ele segue rumo a saída do cemitério com mamãe segurando em seu braço, ela em seu mais elegante vestido negro do closet, ele parecia o mesmo como seu terno do escritório. Se não o conhecesse bem diria que ele estaria indo diretamente para a empresa trabalhar.

Papai pensou a vida inteira que seu pai, Pedro, amava sua mãe Tereza mas tudo não passava de uma pequena mentira, ele pôde mesmo ter gostado dela mas era enlouquecido de amores por Cristóvão. Lembro de seus últimos dias enquanto eu lia suas cartas na beira de sua cama com o Renan ao meu lado, ele parava minhas leituras para contar sobre sua vida naquele ano de 1956.

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