Capítulo 18

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Gustavo tem 7 anos de idade, ele é magro e alto, seu cabelo é negro como o meu porém cacheado, seus olhos verdes são cobertos por um óculos de grau. Ele me lembra sua mãe, tanto na aparência como na esperteza e sagacidade.

Toco gentilmente no vidro da porta, meu dedo dobra para cima e para baixo num gesto de carinho em seu rosto. Sinto vontade de abraçá-lo mas me contenho para não atrapalhar sua aula de histórias com a professora.

Meus dedos deslizam pela porta até encontrar os de Renan, seguro em sua mão com um aperto e o levo dali. Ele ainda de boca semiaberta, chocado pela descoberta, seus passos lentos tentam me acompanhar até o jardim do orfanato. Há mesas com bancos de pedra dispostas no gramado impecavelmente verde.

Renan mais desaba no banco do que se senta, suas mãos unem-se sobre a lajota que cobre a mesa. Me senta na sua frente com as pernas abertas, vejo ele inclinar a cabeça minimamente para baixo, fitando os desenhos pintados na lajota.

— Como?

— É uma história complicada, Renan.

— Essa é a hora de explicá-la, então.

— Ninguém da minha família sabe para  manter sigilo e não espantá-los. Sei que minha mãe ficará feliz mas papai vai reprovar e mesmo que isso aconteça, Gustavo vai morar comigo — deixo isso claro e continuou —, não vou deixar ninguém magoar meu filho mas do que ele está triste, pode ter certeza.

— Um ato nobre da sua parte, ele é... seu filho biológico? — sua expressão curiosa me observa e quero dar tudo para saber o que passar em sua mente nesse exato momento.

De certa forma meu nervosismo foi se abrandando de acordo com as reações de Renan mas se ele recusar ficar ao meu lado com meu filho não sei como meu coração pode reagir, só sei que nao vou suportar viver apenas com um deles.

— Não, de jeito nenhum mas eu queria tanto que fosse.

— Como o conheceu?

— Conheci Luce Lady na escola, quando tinha 10 anos. Tornamo-nos amigos inseparáveis ao ponto de causar ciúmes em Lorena, Betão, Marcos e até mesmo no Saulo — viro o rosto para observar o jardineiro cuidando dos canteiros floridos — ela era uma maluquinha e era isso que eu gostava nela, foi minha paixonite escolar.

— Hum — ele sorri.

— Sério Renan, ela nunca soube dessa paixonite que eu sentia. Quando chegamos no ensino médio ela tomou outro caminho do meu, era espevitada e andava com os caras descolados da escola enquanto eu estudava sem parar e vivia preso em casa.

— Você era um chato de galocha, não é?

— Durante esse momento de estudo sim mas em festas eu me transformava — meus dedos brincam com os seus — Luce Lady começou a se envolver com um cara que era amigo de alguns traficantes, logo era ela que estava encurralada nesse mundo, as vezes me pedia ajuda e eu dava alguma grana pra ela escondido.

"Mesmo assim ela não parou de vender drogas pro namorado, ele traia ela com todas as meninas que passava em sua frente, até onde sei ele teve mais de cinco filhos antes de completar vinte anos, ela fingia que não sabia só pra ficar com ele 'Sou a exclusiva, ele pode até pegar quem quiser mas acaba voltando pra mim' ela me disse uma vez. Eu ria da cara dela e ela ficava zangada comigo mas nunca se afastou, nossa amizade era prioridade.

"Então depois de um ano e meio o Betão me disse que ela tinha vendido tudo da casa onde morava, roubou a própria mãe pra sustentar seu novo vício, ela estava louca de tanta pedra de crack que fumava. Uma vez eu fui até a favela visitar ela mas quando entrei em sua casa ela tentava esconder a bagunça e até chorou de tanta vergonha por não ter nada pra comer, eu dei uma boa quantia pra ela se alimentar mas provavelmente esse dinheiro serviu pra comprar mais droga.

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