- Hana! Hana!
Eu conseguia perceber alguém chamar pelo meu nome, mas eu não conseguia me mover. Não conseguia procurar a voz, não conseguia nem mesmo pensar.
- Hana! Olhe pra mim! Hana! Porra! Hana!!!
Eu pisquei, e pensei ter levado dez anos para realizar o simples ato. Senti a respiração acelerada, meu coração se lançava contra meu peito, como se procurasse uma forma de fugir de onde estava. Se ele encontrasse uma forma de ir embora, eu desejava ir com ele.
Meus olhos finalmente conseguiram deixar os cadáveres no chão. Eu o olhei. Woah... Eu lembro. Ele estava bonito naquele dia, no dia da despedida. O dia estava realmente bonito daquela forma também...? Eu já não conseguia lembrar... Tinha sol, calor, estava fresco... Algo assim?
- Hana! Chame a FICJ! Hana, por favor! - Havia desespero em seu tom de voz. Puro e avassalador desespero.
Eu pisquei novamente. Aqueles corpos estavam realmente no chão...?
Os grunhidos animalescos se tornaram mais altos. Eu quase podia sentir o som se fixar em cada centímetro do medo arrepiante e paralisia patética que me formavam, escalando meu corpo, fincando garras em minha carne e rastejando sobre minha pele até que chegasse aos meus ouvidos. Os rastros do caminho percorrido pelo som permaneceram perfeitamente entrelaçados no meu corpo. De modo que se tornaram caminhos fáceis para chegar aos meus ouvidos, tornaram mais fácil para que todos os grunhidos primitivos que viessem após aquele causassem as mesmas sensações, tocassem os mesmos lugares e despertassem os mesmos pensamentos.Ele estava dando tudo de si, segurando o demônio com todo o seu corpo e um dos braços. Quando pensou que o ser estava sob seu controle, ele usou a única mão livre para lançar seu comunicador em minha direção. Eu não parecia ter sangue ou coração quando agarrei o comunicador e o segurei nas mãos, não parecia estar viva. Acho que conseguia ouvir Misaki ao longe... Ela estava gritando, chorando ou falando...? As palavras eram desconexas. Machucando, você, ele... Aquelas palavras partiam dos lábios dela ou da minha cabeça?
Eu olhei para o pequeno objeto entre minhas mãos; ele estava manchado de sangue. Sim, sangue. E, eu lembrava perfeitamente, aquilo era o que havia me levado de volta para a realidade, o sangue sacudiu meu corpo, outrora completamente inerte pelas garras dos grunhidos fincadas em minha carne. Eu vi o sangue, senti seu cheiro. Era real e fresco, e os corpos ainda estavam quentes. O que exatamente impedia que as três únicas pessoas vivas ali se tornassem sangue fresco e corpos quentes? O que impedia...? Algo impedia?!
Eu pressionei com força o comunicador, fechando os olhos enquanto o fazia. Era uma esperança, era a única. Não podia falar, não conseguia, mas secretamente, passei a implorar. E eu estava implorando tanto...
"Inspetor Aoi Matsunaga. Esquadrão um, divisão S."
Alguém realmente atendeu?
Eu abri novamente os olhos, encarando o comunicador em completo choque. Em seguida, o ouvi falar algo; o ouvi gritar algo para o comunicador; o ouvi, talvez, explicar algo. Eu não conseguia entender, minha mente não conseguia discernir nada, nada além do sangue, dos grunhidos animalescos, os sons que Misaki fazia e a voz dele. E então também havia aquela voz no comunicador. Era um homem, ele pareceu ouvir as palavras gritadas para o comunicador.Eu não sabia quanto tempo havia levado entre a ligação e o momento em que os agentes da FICJ haviam chegado, eu só sabia que havia me perdido em algum lugar nas poças de sangue dos dois cadáveres no chão. Me perdi ao longo de todo aquele tempo, e acho que nunca realmente encontrei o caminho de volta.

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Fanatismo
General FictionNo ano de 2437, em Tokyo, um acidente no armazém do Hospital Sawasaki é o estopim de uma cadeia de eventos catastróficos que faz com que todo o Japão passe a questionar a coexistência com os demônios, criaturas de origem desconhecida que residem na...