Haviam se passado pelo menos alguns minutos desde o momento em que comecei a encarar o copo de vidro entre minhas mãos. Algumas gotas d'água escorriam ao redor dele graças ao gelo no café. Bati suavemente o dedo indicador na lateral molhada, o olhar fixo no gelo que se desfazia aos poucos na bebida.
- Vai perder o gosto se não beber logo. - Comentou Noah, indicando o meu café gelado com um gesto enquanto sentava diante de mim na pequena mesa redonda em um dos cantos do café. Um dos poucos cantos em que todo o sol que as enormes janelas de vidro deixavam entrar não alcançava.
Inspirei profundamente, finalmente sendo retirada da inércia na qual me coloquei enquanto esperava pela chegada dele. - E então? - Interroguei.
Ele apoiou o punho na lateral da cabeça, talvez formulando melhor o que diria. - Ela não parece do tipo que atacaria ninguém. - Respondeu ele, por fim.
- O que te faz dizer isso?
Ele prensou os lábios, o olho suavemente se estreitando. - Ela é bem... tranquila? Não sei se essa é a melhor palavra, mas... Algo nesse sentido. Talvez pacífica, simplesmente quieta ou tímida, até. Mas o tipo de menina que provocaria uma mulher sabendo que ela é um demônio e ainda por cima denunciaria o ataque simplesmente para prejudicar essa mulher? Não, isso eu realmente acho que não...
Ergui as sobrancelhas. - Olhando para você, eu jamais diria que é o melhor cão de caça em perseguição da FICJ, e ainda assim você é. Mas parece muito mais quieto e calmo que isso. Então...
Ele sorriu. - Eu entendo bem o seu ponto. Mas... Algo sobre isso não soa exatamente certo.
Me inclinei sobre a mesa, apoiando os cotovelos sem largar o copo gelado. - Estamos então apostando na nossa intuição agora?
Seu sorriso se expandiu. - Não pode negar que isso é, de certa forma, em certo nível, boa parte do nosso trabalho.
Franzi as sobrancelhas. - Não o meu trabalho. Eu jamais julgaria inocente ou culpado um demônio com base em intuição.
Ele piscou. - Você não decidiu há alguns meses que julgaria Kai inocente usando a intuição?
Pela risada que ele segurou, a minha expressão de indignação deve ter sido completamente honesta.
- Nunca julguei ele como inocente.
- Então o que ele tem feito fora da sala de vidro? O que tem feito fora de uma cela e o que te faz deixar que ele fique fora de Tokyo, fora do seu campo e do seu controle por... agora o quê? Duas semanas?
Encostei novamente contra a cadeira. - O que te faz pensar que eu posso ter algum controle sobre um homem adulto a ponto de decidir o que ele deve ou não fazer?
- O fato de você ser chefe dele? Talvez o fato de que assinaram um contrato?
Sorri suavemente. - Sei que vocês não gostam que ele esteja ausente por tanto tempo quando eu preciso de proteção ao meu redor, sei que vocês não ficam muito felizes com isso, mas ele vai voltar logo. - Era melhor que realmente voltasse antes que eu começasse a planejar uma viagem para Shizuoka para trazê-lo de volta.
- Diga isso para você mesma. Como está aguentando as pessoas te abordando na rua? A mídia na frente do prédio da FICJ todos os dias? As investigações que os jornais grandes começaram em cima de você? - Ele se aproximou um pouco mais, abaixando o tom de voz. - Você nem precisaria estar escondida nesse café enquanto eu faço a investigação do caso se não fosse por ele e todos os mil mistérios em que ele está envolvido.
Desviei o olhar das outras mesas do café para olhá-lo. - Por que quis falar sobre isso de repente?
Ele suspirou. - Foi meio inevitável. Me deixei muito confortável para dar uma opinião.

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Fanatismo
General FictionNo ano de 2437, em Tokyo, um acidente no armazém do Hospital Sawasaki é o estopim de uma cadeia de eventos catastróficos que faz com que todo o Japão passe a questionar a coexistência com os demônios, criaturas de origem desconhecida que residem na...