O Templo Sensoji era o mais antigo que existia em Tokyo, mas o que me surpreendia sobre ele era o fato de não parecer ter mais de um mês desde a sua construção. Ele estava intacto, completamente intacto. Nem mesmo as madeiras que formavam o chão chegavam a ranger enquanto eu caminhava sobre elas, seguindo o segurança e o zelador que me guiavam pelos longos corredores abertos e os pátios e salões repletos de luzes douradas.
O ar fresco do verão circulava por todos os corredores e pátios abertos, sempre balançando o vestido azulado que eu usava. A questão é que do momento em que recebi a ligação de Onodera até o momento em que estava seguindo aqueles dois homens, não levou mais de uma hora e meia. Então não tive tempo de trocar de roupa para algo mais prático. Tudo que pude fazer foi esperar que Kai fosse embora pela sacada novamente, para então correr até o estacionamento e pegar o meu carro e ir até o templo imediatamente. Minha equipe não poderia largar o outro caso em que estávamos trabalhando, então ali estava eu: sozinha, prestes a ser levada até o local onde havia o cadáver de uma pessoa.
Eu estava nervosa.
Não por saber que teria que ver um cadáver. Afinal, e eu não me orgulhava de dizer isso, já vi corpos frios o suficiente para não me impressionar tanto quando visse mais um. O problema principal era o caso por trás do cadáver, o tamanho inimaginável do escândalo que viria a seguir e o nível das intrigas políticas e civis que isso traria. Não era como se estivéssemos falando do dono de um mercado que foi assassinado, o que para mim já seria ruim o suficiente, mas não era como se fosse algo tão pequeno ou relativamente simples quanto isso.
Era um monge, era um templo e o assassino era um demônio. Essa simples junção específica de elementos me levava a acreditar que tudo que poderia dar errado em relação aquele caso, certamente daria.
- A senhorita se importa de esperar aqui por um momento? - O segurança me tirou dos meus pensamentos, o olhar enrugado e perturbado ainda assim encontrando uma forma de parecer paciente enquanto aguardava uma resposta. - Preciso buscar a chave da sala.
Pisquei, brevemente olhando ao redor. Estávamos diante dos portões do pátio principal, onde era guardada a estátua de Kannon, a deusa da misericórdia. Era difícil acreditar no nível da audácia do demônio que havia matado aquele monge... Não era o suficiente que tivesse cometido um assassinato dentro de um templo, ainda precisava ser diante da maldita estátua principal que o templo guardava.
- Pode ir, não se preocupe. - Informei o segurança, que acenou brevemente antes de dar as costas, caminhando pelo corredor com passos apressados.
Dessa vez, o zelador foi quem chamou minha atenção: - Senhorita, também preciso deixar você por um momento. Preciso abrir a porta dos fundos para o outro que está vindo investigar o caso.
Assenti vagarosamente, não me dando ao trabalho de perguntar quem era, já que eu definitivamente sabia de quem se tratava. Ele deixou a sacada do meu apartamento com pressa falando que deixaria a mala em casa, encontraria Ayato e ambos viriam para cá o mais rápido e discretamente que fosse possível. E eis algo que simplesmente não fiz: ser discreta. Haviam repórteres na entrada principal, e eu não me dei ao trabalho de desviar de nenhum deles. Não me dei ao trabalho de esconder que era eu a inspetora responsável pelo caso. Eles acabariam descobrindo de uma forma ou de outra, não haveria muito o que fazer quanto a isso. E é claro que nenhum outro esquadrão assumiria um caso tão perigoso e sério quanto esse, já que esse era exatamente o tipo de trabalho que o esquadrão um precisava fazer, levando em conta que éramos os melhores.
Refleti sobre isso enquanto via o zelador se afastar, indo em direção ao corredor oposto ao que o segurança havia ido. Ser o melhor esquadrão não havia nos levado a um lugar confortável. Talvez devêssemos ter almejado menos, muito menos. Talvez eu tivesse me saído bem como inspetora do esquadrão cinco ou simplesmente um cão de caça de Yukimura. Talvez me causasse menos nervosismo que lidar diretamente com esse caso.

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Fanatismo
General FictionNo ano de 2437, em Tokyo, um acidente no armazém do Hospital Sawasaki é o estopim de uma cadeia de eventos catastróficos que faz com que todo o Japão passe a questionar a coexistência com os demônios, criaturas de origem desconhecida que residem na...