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𝓓esajeitado, Bruno endireitou-se mais uma vez na cadeira, aguardando a continuidade da história

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𝓓esajeitado, Bruno endireitou-se mais uma vez na cadeira, aguardando a continuidade da história. O editor por vezes fazia pausas, parava para respirar, como se intencionalmente quisesse intensificar o suspense.

— Assim que sorvi mais uma vez o café, comentei com o retireiro...

"— Quem é você, afinal? Por que vem me seguindo?

"— Crê no acaso? — perguntou-me.

"Estranhei a pergunta:

"— No acaso? Por quê? Esse encontro não é casual?

"— Nada é por acaso, Sr. Ravacini.

"Assustei-me! Sabia até meu nome e entoara a frase em voz grave e rouca, simultânea a um raio que ágil cortou o céu, desferindo seu golpe a poucos metros do retiro. E como a tornar tudo mais tenebroso, seguiu-o uma estrondosa trovoada. Já ouvira na escola: a luz é mais rápida do que o som, mas talvez não mais do que o pensamento. E diante daquele misterioso homem, talvez precisasse pensar muito rápido.

"Reiterei a indagação:

"— O que quer comigo?

"O enigmático homem continuou:

"— Estive muito tempo fora, morando na Europa. — Fez uma pausa e depois seguiu: — Sabe, eu pretendia mesmo falar contigo, assim que possível, mas estava na dúvida se era o certo a se fazer.

"— Para quê?

"— Para lhe confiar um manuscrito. Sei que é escritor e jornalista e ouvi dizer que anda atrás de uma nova história. As duas coisas vieram a calhar, não acha?

"— Como sabe de tudo isso?

"— Não vem ao caso, o que importa é que sei.

"Aos poucos a figura do homem do campo, em sua personagem de retireiro, esvanecia-se. Quem era aquele sujeito? E que raio de manuscrito queria me dar?

"Naquele dia não me dei conta do inusitado da situação: à luz de um lampião, conversando com um estranho, regado a goles de um café já quase frio, travávamos uma insólita conversa."

Bruno já começava a duvidar da real ocorrência daquele interlóquio, ao menos naqueles termos, mas o que lhe interessava mesmo era outra coisa:

— Afinal, e o tal manuscrito?

Ravacini empostou a voz, buscando encenar a narrativa. Crispou as mãos na mesa:

— Ele disse...

"— Sou arqueólogo e venho escrevendo um livro, contando uma aventura real, a qual muito provavelmente não vou poder terminar.

"— E por quê?

"Diante do silêncio, segui em frente, com interesse cada vez mais desperto, pois talvez eu realmente estivesse diante da história que tanto almejava:

"— E onde está o manuscrito?

"Ele se levantou e logo voltou com uma pasta. Abriu-a e mostrou-me dois cadernos tipo brochura, capa dura, com o texto lançado em maravilhosa letra cursiva.

"— Aqui está. Muito cuidado com isso.

"— E do que se trata?

"— Já ouviu falar da 'biblioteca de Nag Hammadi'? Pois bem, tudo teve início nessa cidade, em 1945, envolvendo o lendário documento 'Q'..."

Bruno exaltou-se:

— Mas claro! Domingos Casqueira, o arqueólogo mencionado no e-mail que nos enviou!

Voilà, meu amigo. E quem mais poderia ser?

— E depois? — Bruno não escondia a ansiedade.

— Os olhos dele ficaram injetados e por um instante suas faces expressaram uma dor muito profunda. Daí ele disse, quase proferindo um soneto:

— "Há pessoas no meu encalço, mas tenho pouco tempo de vida. Assim é quase certo que eu morra, de morte matada ou morrida!

"Fixei-me nele, assustado:

"— De quem você está falando? Quem é que está atrás de você?

"Ele gargalhou. Foram segundos que me pareceram intermináveis. À luz daquele lampião, naquele retiro afastado, nada poderia ter-se configurado mais aterrador.

"— A única coisa que posso te dizer é que não conte sobre o manuscrito a ninguém, nem para seu tio, até que você consiga publicá-lo. Isso é para tua própria segurança.

"Foi então que tudo girou vertiginosamente. Imaginei que pudesse ter sido a pinga, mas três doses não teriam produzido aquele efeito, principalmente depois de vários tragos de um intragável café. Pode adivinhar o que ocorreu, Sr. Bruno?"

— O café! Havia algo nele!

— Elementar! Apaguei e não vi mais nada, ficando à mercê daquele lunático, naquele fim de mundo, naquela cabana perdida.

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