19.

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- Desde sempre me sinto assim. São pesadelos, simples assim, mas são específicos. Neles eu sou uma criança de uns 5, 6 anos e estou sempre em um lugar ruim, nesse lugar hora está calor como o inferno ou frio como o polo norte. Minhas roupas estão sempre sujas e rasgadas e o cheiro é forte, parece que não é higienizado há semanas.

                     

- Todos os pesadelos você está nesse lugar? - Perguntou Rafaella, interessada em minha história.

                     

- Sim. Todos eles neste mesmo lugar com os mesmos rostos. Tem crianças da minha idade, várias e todas mal vestidas como eu, e tem um... - Eu disse limpando a garganta, sentindo dificuldade em colocar aquilo pra fora. – Um homem, alto, negro... Ele ta sempre humilhando a gente, batendo e gritando. E ele me expõe o tempo inteiro pra todo mundo ver, sente prazer em gritar comigo e ter uma plateia pra assistir. Eu não consigo controlar, Rafaella, passo mal com esses sonhos, acordo descontrolada do jeito que você infelizmente presenciou, e conversar sobre só piora as coisas, por isso prefiro me virar e voltar a dormir, com sorte esqueço tudo e posso recomeçar o dia bem.

                     

- Seus pais nunca foram em busca de um profissional? - Rafaella me perguntou.

                     

- Foram, mas todos os psicólogos que conversei pareciam paredes, eram sempre as mesmas perguntas "Como isso te fez sentir?", "O que você pensa sobre isso?". Porra... Se isso teve algum efeito foi mais negativo do que positivo. Então pedi pra não ir mais, devia ter uns 18 anos e eles concordaram.

                     

- Bianca, isso não é normal, você tem que tratar isso. - Ela disse com a voz alterada, estava ficando irritada. – Tem que saber de onde vem.

                     

- São só sonhos, Rafaella, como se trata sonhos? Não tem muito o que fazer, meus pais aceitaram isso, eu aceitei, você tem que aceitar também. - Eu disse me levantando, quem estava começando a ficar irritada era eu..

                     

- Não faz sentido, deve ter sido algum trauma, algo que você repeliu com os anos. Você é adotada, Bianca?
                     

- Uau, você é delicada como um coice de burro, Rafaella. Não, eu não sou. Não existem traumas na minha vida, você mesma viu, o que de ruim pode ter acontecido pra eu ter esses sonhos? Nada, são só sonhos, aprendi a viver com isso. - Eu disse começando a me trocar.

                     

- Tudo bem. Seu problema, suas questões. Eu não vou me meter.

                     

- Ótimo! - Disse num tom mais alto que o necessário, e fui em direção a cozinha.

                     

- Onde você pensa que vai? - Disse Rafaella já trocada.

                     

- Tomar café da manhã, oras. - Gritou da cozinha.

                     

- Nada disso. Estamos atrasadas. - Disse me puxando pelo braço, no momento em que me sentava na cadeira.

                     

- Ei, eu quero emagrecer, mas nem tanto assim. - Disse sendo arrastada até a porta.

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