Parte 3

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— Eu preciso de roupas novas.

Emily, que estava sentada no sofá assistindo alguma coisa na televisão, me encarou como se me perguntasse porquê aquilo dizia respeito a ela.

— E preciso da sua ajuda para comprar, Emily. Eu nunca comprei roupas femininas.

— Engraçado... Você tem quase um guarda-roupa de roupas femininas que foram abandonadas no apartamento depois das suas aventuras. Além disso, trabalha na Runway que lida diretamente com moda. Pensei que entendesse o mínimo.

— Ha-ha-ha. Você é tão engraçada, Emily! Devia estar se especializando em comédia.

Ela bufou e desligou a televisão, se levantando e caminhando até o quarto. A segui e parei no batente da porta esperando que ela terminasse, mas ela me encarou da cabeça aos pés e cruzou os braços.

— Se você acha que eu vou sair com você vestida assim, está muitíssimo enganada.

Franzi as sobrancelhas e olhei para baixo encarando minhas roupas.

— O que tem de errado com as minhas roupas?

— O que tem de... — Ela bufou levando o indicador e o polegar ao rosto, apertando levemente a parte superior do nariz e fechando os olhos como se tentasse dispersar uma dor de cabeça aguda. Então ela respirou fundo, uniu as mãos frente ao corpo como se rezasse e encarou o teto. — Por favor, qualquer divindade existente, devolva logo o pênis e o senso de moda dessa pessoa diante de mim. Eu não sou tão intelectualmente desenvolvida para lidar com isso. — Em seguida, ela voltou a me olhar e se aproximou segurando meus ombros por trás e me empurrando até um grande espelho do seu quarto. — Olhe para você, Andrea. Você está descabelada, com a maquiagem borrada, vestindo um moletom e chinelos masculinos. Você acha mesmo que euzinha vou sair com você assim para qualquer lugar?

Encarei meu reflexo e constatei que ela estava certa. Depois de tudo que me aconteceu, eu passei praticamente a semana toda andando por aí de moletom e me jogando pelos cantos. Eu só me arrumava para ir trabalhar — minimamente bem, diga-se de passagem, uma vez que eu não sabia nem o básico de maquiagem e Emily não tinha tempo para se arrumar e me ajudar a me arrumar, então eu a copiava quase o tempo todo — e carregava um chinelo na bolsa para tirar os saltos quando estava na minha sala ou em qualquer ambiente que não me obrigava a usá-los. Se Emily soubesse dessa última parte, com certeza desistiria de mim.

Meus ombros caíram e dei-me por vencido. Obviamente ela havia me detonado. E, assim como ela, tudo que eu queria era o meu pênis de volta. Mijar sentado era uma das piores experiências pela qual já passei. O vaso sanitário dos banheiros femininos de qualquer lugar que frequentei são nojentos, sujos e fedem mais que os masculinos. Algumas manchas muito duvidosas e de cores estranhas surgem para todos os cantos, inclusive na parede. Há papel higiênico jogado para todo lado, algo que provavelmente é maquiagem borrando as pias e cabelos por toda parte.

Descobri nesses últimos dias que se tem uma coisa que tenho nojo, essa coisa é cabelo fora da cabeça.

— Tudo bem, Em. Você venceu. Mas o que uma mulher veste para ir ao shopping?

— Pela primeira e última vez na história eu vou abrir meu closet e te deixar escolher alguma coisa.

A encarei pelo reflexo com a cabeça levemente abaixada e a íris dos olhos quase sumindo demonstrando meu total tédio e ignorância para a função que ela queria me delegar.

Upside Down | Em revisãoOnde histórias criam vida. Descubra agora