Gritos da alma

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#Sete e meia da noite


O barulho da porta abrindo ecoou nos cômodos vazios, os passos de duas pessoas misturaram-se com o silêncio da casa escura. Apenas a luz da lua iluminava a mansão. Breno e Estela se dividiram na sala, o homem foi até a cozinha e depois subiu as escadas, a mulher foi direto para seu quarto no andar de cima. Breno bebeu uma doze de whisky português, lembrando então de quando o comprou. Em uma de suas viagens a Portugal, num bar de uma pousada. Veio repentinamente à lembrança de que foi a esposa quem escolheu a bebida. Daí milhões de pensamentos surgiram, momentos de felicidade, de companheirismo, afeto e amor. Tudo estava ótimo na época. Começo de casamento sempre são flores, mas depois aparecem os espinhos, e se dá bem quem machuca.

 Estér não estava em casa, Breno certificou-se ao ver um bilhete deixado em cima da escrivaninha do quarto do casal. As palavras estavam tortas, a letra tremula como se estivesse nervosa, e estava. O bilhete dizia que Estér precisou ir ao hospital, pois sua mãe havia passado mal, pediu para que estela não se preocupasse, não era nada grave, foi só uma tontura.

-Estela!! –Breno gritou suavemente.

-Oi!!! –Respondeu num tom de resposta.

-Advinha só... estamos sozinhos em casa.

-Uau, muito legal. –Respondeu entediada. –Oque tem demais nisso?

-Achei que a gente poderia curtir um pouco. –O homem mordeu os lábios, e fixou os olhos em Estela.

-Você é muito "assanhadinho", acabamos de chegar de um motel. –Ela respondeu também mordendo os lábios.

-Mas agora estamos em "nossa" casa. –Ele a laçou com o braço esquerdo, e escorregou o direito até a nuca da mulher. –Eu te amo diabinha.

Os dois iniciaram uma cena de amor incondicional, como se aquela fosse a ultima vez que se tocariam. As mãos deslizavam rapidamente nos corpos, as vezes elas paravam e apertavam a carne. Se jogaram no sofá, ficando Breno em baixo e Estela sentada na cintura dele. Eles se beijavam intensamente, pareciam se conhecer a muito tempo, mas ao mesmo tempo estavam se conhecendo.

Por um momento ela parou e falou.

-Você não acha perigoso demais?

-Claro que não, Estér vai demorar a chegar. Não deixe que ela estrague nosso momento.

-Se ela falou que não é nada grave, logo estará de volta.

-Oque que tem? Seria bom mesmo, ela veria que nós nos amamos e não poderia fazer nada. Veria nossa felicidade, e perceberia a insignificância que ela tem.

-Credo, você fala tão mal dela, até parece que nunca gostou dela. –As perguntas eram provocadoras.

-Querida, vamos esquecê-la por um minuto. Pode ser?

-Me faça esquecer!! –Estela sussurrou aos ouvidos de Breno. Aproveitando para morder sua orelha e retomar as caricias.

O momento de prazer continuou por um tempo.  Mas o clima foi cortado por um choro de bebê vindo da cozinha, que era ao lado da sala. Breno em primeiro estante lembrou-se de Estér, mas viu que Jully estava sozinha engatinhando no chão chorando sem motivo.

Minutos depois Estér chega em casa, Breno estava no quarto de Jully havia levado a menina de volta pro berço. Por pouco chegava em um péssimo momento. Parecia estranho demais JulLy ter chorado na cozinha.

Estér avisa que chegou dando um oi.

Breno desce as escadas e vai em direção à mulher.

-Nossa amor, que cara é essa? Aconteceu alguma coisa com sua mãe?

-Não. Só estou cansada.

Breno tentou beijar a mulher, mas ela tirou o rosto e saiu dali.

#

Breno estava tomando banho, Estér aproveitou para fazer uma rápida investigação. Ela pegou o paletó do marido e procurou algo nos bolsos. Encontrou um extrato de cartão de crédito, ele havia retirado duzentos e cinquenta reais naquela tarde. Encontrou também uma camisinha em um dos bolsos mais fundos. Isso não se comparava com oque veio depois. O paletó contava com um bolso "secreto" na parte de dentro. E lá estava a prova do crime. Um papel de pagamento de um motel cinco estrelas, no valor de duzentos e cinquenta reais por hora. Uma dor a partiu o coração, estava confirmado, o casamento havia acabado. Quem procura acha, ela procurou a verdade e a teve, está sendo difícil, mas é a verdade. As consequências não serão dela. Uma lagrima fria caiu dos olhos de Estér. Parecia queimar a pele. Foi uma única lágrima, o suficiente para tomar coragem e levar o papel junto a ela, fingindo que nada havia acontecido.

#

Já estava tudo apagado. Assim como Breno viu quando chegou do "trabalho". O luar sendo a única iluminação. Todos já estavam dormindo, menos Jully, que mais uma vez havia fugido do berço. Ela estava sentada em frente a um janelão, observando a rua, em sua posição de estatua, matinha uma feição de curiosidade sombria. Não olhava diretamente para a rua, ela mantinha seu foco num bebum que dormia na calçada da casa. A menina parecia irritada. Se ela pudesse falar diria que ele está atrapalhando a concentração dela. Não estava conseguindo dormir por conta do barulho dos gritos da alma dele. Após o observar por um longo período de tempo. O bebê levantou uma das mão e a esticou em direção ao homem que se contorcia de dores. O braço estava esticado com o dedo indicador cruzando o dedo médio, formando uma espécie de figa. O gesto libertou a alma do bêbado da calçada, fazendo com que a feição de dor mudasse para de quem dormia eternamente.

Tendo o trabalho considerado completo, a criança engatinhou para as sombras, sumindo na escuridão. 

Jully [COMPLETO] {Reworking}Onde histórias criam vida. Descubra agora