Olhar não arranca pedaço

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O relógio marcava meio dia. O almoço estava servido. A comida não era muita. Breno não almoçava em casa. Jully era apenas um bebê, Estér não comia muito. Não era pra menos, que a feira de um mês durava dois.

Sobre a mesa estavam os pratos, os copos e talheres. Era uma mesa de seis cadeiras, e todos os assentos estavam preparados para serem ocupados. Mesmo que ninguém viesse pro almoço, os lugares estavam impecáveis para qualquer que fosse a visita. Estér fazia questão de sentir-se em família. Aquela era a única forma de amenizar sua solidão. O prato dela foi preenchido por feijão ao óleo, arroz com cenoura e colorau, acompanhado de uma carne bovina grelhada. Receita está dada por Dona Isaura, falecida mãe de Estér. Que quando viva fazia os melhores pratos da região. Muitos até a acusavam de bruxa, pois o sabor de sua comida parecia enfeitiçar os homens da cidade.

A mulher terminou a refeição, parou e observou ao redor dela mesma. O livro de receitas ainda estava aberto ao lado do micro-ondas. Na pia, as panelas sujas, no chão, brinquedos espalhados, líquidos derramados. Olhando através da janela, viu o jardim, as plantas secas, as folhas das arvores espalhadas pela calçada. O mal cheiro dos três banheiros era perceptível do outro lado da rua. A tarde seria de muito trabalho.

 (#)

O som da campainha quebrou o silêncio da tarde. Estér já esperava a visita. Envergonhada pelo caos que estava a casa foi em direção a porta mesmo assim. Certificou-se através do olho mágico quem estava do outro lado da porta. Como imaginava, era Estela “dando o ar da graça”. A porá antiga ringiu ao ser aberta.

-Estér minha irmã, quanto tempo não te vejo! –Abraçou a irmã querendo parece mais formal possível.

-Oi estela. Como foi a viagem?

-Foi tranquila. Retirando a turbulência enquanto passava pelo caribe... a viagem foi maravilhosa! –falava com um sorriso no rosto. –Não vai me convidar para entrar? –Perguntou com um olhar de admiração.

-Ah... sim, claro. –Estér estava em “outro planeta”, pensando como seria os próximos dias como a irmã dentro de casa. Uma irmã conhece a outra. –Você não vai entrar? –Tentou fazer a voz parecer normal. E ajudou Estela com as malas.

As duas foram em direção ao sofá, o qual já estava viscoso. A umidade e a poeira provocaram isso no acolchoado do móvel.

-Credo Estér! –Falou admirada. –Desculpe-me a sinceridade, mas sua casa está de ponta a cabeça. Que tipo de dona de casa você é?

                Uma forte sensação de culpa preencheu Estér. A irmã estava certa, a casa estava horrível. A que ponto ela havia chegado? Aquilo talvez fosse o motivo de toda a sua solidão. A casa estava triste, por isso ela também estava angustiada.

-Ultimamente, minha preocupação está totalmente em Jully. –Ela não podia assumir assim de cara sua “irresponsabilidade”.

-Entendo perfeitamente. Por isso que às vezes paro e penso se realmente estou preparada para ter um relacionamento. E depois um bebê...

-Mas esse sempre foi seu sonho!

-Sim. E ainda é, sei que vou conseguir. Tudo é uma questão de tempo. –O tom de voz era sarcástico.

Estela tenta um relacionamento sério desde sua adolescência. Mas seu temperamento sempre estragou tudo. Recentemente descobriu que era estéreo o que diminuiu muito suas expectativas. Em seu ultimo relacionamento , o que pareceu ser o mais saudável dos namoros que já teve, foi desfeito por sua incapacidade. Porém ainda não desistiu, e luta desde então por uma adoção.

Jully [COMPLETO] {Reworking}Onde histórias criam vida. Descubra agora