CAPÍTULO 28

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O lugar era um inferno. Romulus tentava se focar nas mentes mas todos corriam, todos clamavam por saírem livres dali, tudo ao mesmo tempo com vozes mentais estridentes. A feira era imensa, engraçado como uma outra parte continuava em suas barracas, ainda vendendo coisas.
"Rom? Já encontrou?" Salvation disse de forma calma, mas Romulus sentia a mente dele tão nervosa e receosa como o próprio Romulus. Tudo deu muito errado e agora estavam no inferno.
Romulus respirou aliviado ao sentir a mente daquela teimosa. Ele ia surrar pessoalmente o tra...
"Eu o peguei! Não tenho onde me esconder." Ela pensou diretamente na mente dele.
"Esquerda, Sal! Ela está sem cobertura." Romulus falou no intercomunicador. Daisy estava em uma área aberta fora da feira onde milhares de pessoas corriam de um lado para o outro depois de uma granada ser explodida pelos sequestradores que eles seguiam disfarçados.
Eles correram por entre as pessoas, barracas, animais, carros e caminhões, chegaram a grande área aberta, um grande aeroporto abandonado. Romulus acessou a mente da irresponsável a tempo dos olhos dela registrarem o movimento de um punho passando por seu rosto e daí os olhos arregalados do humano com o chute potente que ela lhe deu. O humano se afastou, segurando sua virilha e caiu para trás. Romulus sentiu o sorriso dela, e também que alguém a tinha na mira.
"Daisy, pro chão!" Ela se jogou no chão, um tiro ao longe foi deflagrado, Sal gritou para alguém eliminar o sniper, enquanto chegavam até onde ela e o humano estavam caídos. Romulus achou o filhote humano debaixo de uma barraca escondido por uma humana idosa. Dois soldados aprimorados estavam mais perto que ele revirando barracas.
"Sal, eu tenho o filhote, mas há dois aprimorados mais perto de onde eu estou." Ele disse voltando para a feira correndo.
"Eu te cubro!" Daisy disse, Romulus correu deixando sua mente ligada a do filhote. Ele estava totalmente apavorado. É claro que ela voltou a feira primeiro, ela corria como o vento, e logo estava atracada a um dos aprimorados. Romulus pulou no outro quando ele estava a duas barracas da barraca que o filhote estava. Romulus o socou na cabeça, mas o soldado não caiu e o abraçou pelo torso o apertando. Romulus o encarou e sorriu antes de dar uma cabeçada. O soldado o soltou e na terceira voadora, caiu. Romulus se virou para a barraca, o filhote corria desesperado, Romulus sentiu outro snyper, mas não o localizou.
"Snyper. Mirando no filhote." Ele avisou e correu até o filhote a tempo de se jogar a frente dele tomando o tiro que o filhote receberia.
Ele estava de colete, ficou protegido do primeiro tiro, mas tomou um na perna. Ardeu como o inferno. Outro dos recrutas o protegeu e a mente do snyper apagou.
"Obrigado Hope." Romulus disse no intercomunicador.
"De nada, Bonitão." Ela pensou, ele sorriu.
Ele e o outro recruta, um enorme felino mal humorado, saíram da feira, o helicóptero deles estava perto.
"Ajuda médica?" Sal perguntou, Romulus disse que aguentava.
"Estou inteira, você perdeu." Daisy pensou. Romulus teve de rir, ela não se dava por vencida.
A viagem de volta foi longa, cansativa e dolorosa. Romulus nunca tinha tomado um tiro e o primeiro tinha logo que ser das balas que ele ajudou Dean a projetar. A dor era angustiante, tanto que ele pediu para Daisy cavar sua perna e retirar a bala desgraçada. Daisy alisou a coxa dele antes de enfiar a faca na perna dele. Romulus mesmo com dor não pôde deixar de sorrir da audácia dela.
Depois de várias horas de vôo, de Daisy tentar acalmar o filhote, do felino se gabar de ter protegido Romulus e dele desmaiar e acordar com a dor, ainda mais intensa, mesmo Daisy tendo tirado a maior parte da bala da perna dele, eles chegaram em Homeland.
"Tem uma equipe te esperando, Rom." Sal o ajudou a se levantar, Rom acenou.
"Precisa de ajuda para descer?" Daisy perguntou com um sorriso.
"Na verdade, eu preciso de ajuda. Romulus não vai poder fazer o relatório dessa vez e não podemos esquecer o seu talento, afinal você tirou a maior nota de todos os tempos em sua primeira redação, lembra-se?" Salvation disse para ela, Daisy olhou para ele e assentiu em silêncio.
Romulus sorriu.
"Eu não vou demorar muito na ala hospitalar, eu farei o relatório." Romulus disse descendo do helicóptero. Quando ele colocou o pé no chão, sua perna explodiu em dor.
"Não. Eu fiz a melhor redação de todos os tempos, um relatório é fichinha pra mim." Ela disse o encarando.
Daisy não queria dever nada a ele, ele respeitou isso.
No hospital, ele foi sedado, e disseram que no fim da tarde a doutora Alli lhe daria alta.
O telefone tocou, ele ainda estava com a mente leve, mas atendeu.
"Rom?" Ele sorriu, mas sabia que não seria uma boa conversa.
"Oi, querida, ainda com o Dean?" Ele perguntou, sentindo alguém o olhar a direita. Bestial. E agora?
Ele se sentou melhor, esticando a perna e suspirando.
"Bestial está aqui." Ele disse, ela suspirou.
"Não desligue, diga que depois eu falarei com ele." Romulus indicou uma cadeira, ele continuou de pé.
"Lembra-se dos escritos de Bishop?" Ela perguntou, ele sorriu. Era uma coisa deles isso de Romulus ter memória eidética e Mônica sempre perguntar a ele ao invés de ler.
"Qual página?" Ele perguntou.
"Eu não sei. Algo sobre esterilidade ou... Compatibilidade entre as espécies matriz. Ou...
"Manipulação genética do sexo do embrião?" Ele perguntou.
"Não. Eu sei onde você quer chegar. Não é isso, eu conheci aquele filho da puta, ele me dizia que eu era estéril, tripudiava em cima disso, mas eu engravidei. Tem de haver algo mais, Rom. Você o conheceu, ele era um sádico filho da puta, adorava causar sofrimento, mas era um gênio. Qual a finalidade de me criar? Por que não me deu para Samantha? Eu fiquei os três dias em que estou aqui, sofrendo a falta de Bernie, sofrendo por..." Ela parou de falar. Bestial estava a postos, a mandíbula travada, um olho roxo, os punhos fechados. Romulus então, se lembrou de algo que Neil Bishop, o demônio disse pouco antes de morrer:
"Você é tão inútil que provavelmente não a cobriria."
"Eu acho que sei o que você está procurando. E não foi destruído. Está na biblioteca, dentro do livro de Darwin, uma página falsa, página 147.
Há algumas coisas, palavras aleatórias, leia tudo e..."
"Eu sei como ele fazia suas anotações, Rom. Mas o que diz?" Ela perguntou.
"Não fez sentido pra mim durante esses anos por que eu nunca tinha entendido uma coisa." Romulus suspirou.
"Fazendeiros usam o termo 'cobrir' para quando querem dizer que um garanhão vai cruzar com uma égua. Eu era pequeno quando ele morreu, quando ele me disse que eu era tão inútil que nunca 'cobriria' você. Eu pensava que ele queria ter dito proteger. Mas eu e você somos clones, de espécies diferentes, exatamente como..." Ele olhou para Bestial. É claro que ele lhe tomou o telefone.
"Mônica, volte para casa. Se não voltar, Romulus vai me levar e eu a trarei. Vou fazer o que os machos daqui nunca tiveram coragem, vou te trancar. Não me importa se você não puder ter filhotes, não precisa pesquisar, não precisa fazer nada, só voltar." Ele disse, os olhos desesperados dele fixaram-se em Romulus, Romulus acenou. Ele o levaria até a casa de Dean, é claro.
"Não posso. Não se for para passarmos por tudo aquilo de novo. Eu não posso mais fazer você sofrer. Eu vou voltar, eu só te peço mais um dia. Me deixe entender o que eu sou, me deixe achar uma solução para nosso problema. Me deixe lutar as minhas batalhas. Eu estou fazendo isso por nós. Se não conseguir nada, vou extrair meus ovários. Nós temos o Bernie, ele é tudo pra mim e acho que para você também, não é?" Romulus ouvia cada palavra dela através da mente dele. Bestial fechou os olhos, sua mente tentando entender, tentando absorver o que ela disse e se enchendo de alívio. Tudo o que sua mente registrava era que ela não fugiu dele. Ela estava lutando por eles. Romulus não o culpava por pensar de uma forma rasa, por achar que Mônica estava fugindo. Pessoas apaixonadas as vezes eram meio bobas, não viam tudo.
"Por que não me disse, por que saiu do jeito que saiu? Por que pediu para a cria do demônio do Simple para não me contar onde era a casa de Dean? Pode imaginar o que aconteceu?" Ele perguntou. Romulus olhou para a cara dele, para o olho roxo. Simple teria feito aquilo?
"Por causa do que você acabou de dizer. Eu amo você, mas você precisa ver além daquilo que você acredita que vê. Para você, o amor é suficiente e eu acredito que você me ama, eu amo você também. Mas aceitar uma coisa como essa, não é uma escolha pra mim. Eu ainda estou em crescimento, Bestial e a perda da nossa filhotinha dói demais em mim. Eu sei que dói em você, eu sei, você a amava." Bestial rosnou.
"Mas eu te amo mais. Temos Bernie, temos Rebbeca e Fred, temos Missy e Josh, temos até o seu irmão suspeito. Estamos bem." Ele disse, Romulus sorriu. Isaac era alguém a se ficar de olho, mas nunca tinha feito nada suspeito.
"Como posso não fazer nada, Bestial? Sabendo que ela morreu por causa do que eu sou? Que Rebbeca só procriou com Isaac que é felino como ela, saber todas essas coisas e não fazer nada, seria correr o risco de acontecer de novo, ou perder talvez uma chance de dar certo. O velho Bishop não ficaria comigo a toa. Eu vou voltar, você pode me esperar? Estou com saudade." Bestial se sentou ao lado de Romulus.
"Não sei se consigo. Eu estou com tanta saudade! Eu fico aí, você faz a pesquisa, eu só quero ficar perto de você."
"Não. Eu preciso de um dia, só mais um dia. Eu não saí daí correndo com Dean para fazer drama, eu estava me sentindo sufocada, eu não pensei direito. Mas quando eu cheguei aqui, eu entendi muita coisa que não entendia antes. Eu só preciso de mais um dia. Se não conseguir nada, eu volto. Me deixe fazer isso."
Romulus encarou Bestial e disse:
"Eu te levo lá, mas só amanhã." Ele inspirou fundo se controlando.
"E o que eu faço com a falta de você em minha cama?" Ele disse, mas Romulus viu em sua mente que era apenas uma forma de dizer que a amava. Romulus ficou feliz por eles.
"Eu prometo te compensar por horas e horas, cada noite que passei fora. Eu amo você." Ela desligou.
Bestial suspirou e entregou o telefone.
"Eu devia ter vindo direto a você." Ele disse tocando o olho roxo.
"O que aconteceu?" Ele sorriu.
"Eu fui pra cima dos trigêmeos. Simple se recusou a me dar a localização da casa de Dean, eu o peguei pelo pescoço, apertei até que ele desmaiou. Honest então veio pra cima de mim, nós lutamos, ele conseguiu me acertar o olho, Leo e Hush me tiraram de cima dele."
Romulus fez que não com a cabeça. Nunca conseguiria entender essa selvageria deles.
"Eu me surpreendi com a força dele. O soco que ele me deu quase me desmaiou." Romulus assentiu, mas achou estranho, todo mundo dizia que Candid era o mais forte entre eles.
A casa de Dean ficava muito bem escondida, sempre que iam lá, Brass pousava numa cidade diferente e terminavam de chegar lá de carro. Só alguns sabiam a localização.
"Papai não quis te dizer?" Romulus perguntou.
"Depois que eu bati nos 'Leãozinhos' dele? Na verdade, ele me disse que apostaria uma fortuna em Valiant." Ele se levantou.
"Tio Valiant desafiou você?" Ele sorriu. Parecia bem disposto a trocar socos com um dos maiores machos da Reserva.
"Tenho de voltar. Vou lutar com ele agora mesmo, para que amanhã, quando ela voltar, eu possa matar a minha saudade. Obrigado." Ele sorriu.
"Não quer saber o que eu descobri?"
Ele ergueu as sobrancelhas e ficou pensativo.
"Demoraria muito?" Romulus sorriu e fez que não.
"Bishop já tinha Mônica quando comprou embriões de Michael Marshall. Ele me criou de forma mais simples, eu sou um clone de meu pai, uma cópia física perfeita." Ele acenou, olhando os músculos que Romulus tinha desenvolvido com o treinamento dos infernos da força tarefa. Ele estava quase tão forte quanto Peter.
Romulus continuou.
"Já Mônica é algo diferente, feita para ser uma procriadora. Mas ele teve de fazer outro clone para Samantha e quando ele fez isso, ele tomou providências para que tanto Mônica, quanto Rebbeca só procriassem quando ele quisesse. Ele não as impediu de engravidar, ele fez com que elas não pudessem levar a gravidez adiante." Bestial rosnou.
"Filho da puta!"
"Você não imagina o quanto." Romulus disse.
"E nesse livro, nessas páginas..."
"Samantha pagou muito dinheiro para Dean uma vez, por fotos do material do velho. Isso pode significar que ela foi a responsável por Rebbeca ter conseguido conceber Josh, Missy e os gêmeos. Ou ela conseguiu por mérito próprio, mas quando Mônica terminar de copiar as fórmulas e desencriptar o texto, bom, vocês terão de testar, mas talvez..." Ele não achava que Mônica engravidaria como um teste. Romulus acreditava que ela só queria entender quem ela era, o que era, do que era capaz. Pessoas viviam vidas inteiras sem se importar com isso, vivendo os dias um depois do outro, mas Mônica não era assim. Ela estava em busca dela mesma, se vincular a Bestial a fazia querer ser o melhor que ela pudesse ser.
"Eu não sei se quero fazer esse teste." Ele disse.
"É seu direito. Mônica vai respeitar isso. Ela está vinculada a você, você entende o que é isso?" Bestial deu de ombros.
"Eu só quero estar com ela, eu sou um macho simples, só preciso dela." Ele disse. Romulus entendia, Bestial era um dos puros, de coração puro e alma pura. Ele faria o que fosse, aceitaria o que fosse, perdoaria, se humilharia se fosse o caso. E isso era o melhor dele.
As pessoas mais fortes eram as mais puras, elas mediam os outros por sua própria régua e eram capazes de se sacrificarem por aqueles que amavam, sem pensar duas vezes. Romulus o admirava.
"Estou dizendo que Mônica provém de uma matriz masculina, o que faz com que ela se vincule exatamente como você. E que ela é de primeira geração no fim das contas." Romulus riu. Mônica disse que era de primeira geração quando decidiu tirar seu disfarce. Depois que era de segunda geração, já que estava atrás de seu pai.
"Nada disso me importa. Eu a amo."
"É. Eu fico feliz por vocês." Romulus disse, Bestial sorriu, e antes de sair, deu um beijo em Daisy que entrava.
"Vou precisar de ajuda. O que aconteceu com a granada? Eu corri, não vi nada. E como os aprimorados souberam que estávamos os seguindo?" Ele estendeu a mão, ela ainda segurou a folha contra o peito.
"Não quero ficar devendo nada para você." Ela disse. Romulus olhou para os lábios cheios e vermelhos dela, ela os mordeu e pensou:
"Não." Ele sorriu.
"O que aconteceu com não me apaixonaria nunca por você? Eu só cobraria um beijo e não haveria dívida." Ela se afastou.
"Lunna. Ela disse que virá pra cá. E se..." Romulus a puxou e tomou a boca daquela peste. Ele chupou o lábio inferior, o gosto de chocolate explodiu na boca dele, mas ele queria o gosto dela, não de chocolate. Ele sugou até que só o gosto dela sobrou. Aí sim.
Romulus e Daisy se beijaram por um longo tempo, até a doutora Alli limpar a garganta.
"Vim te dar alta." Ela sorriu para Daisy.
"É bom que este seja o melhor relatório de todos os tempos." Ela disse e foi saindo.
"Melhor que os meus? Devia me dar um beijo melhor." Ele a provocou.
Ela lhe estendeu o dedo do meio e saiu.

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